O acordo foi assinado sob o pretexto de “trazer maior lisura e transparência ao processo de contratação de serviços e aquisição de produtos na área da tecnologia da informação, inclusive na terceirização de mão-de-obra”, conforme discorre o ato.

Mas a costura do pacto implicou na extinção de uma ação civil pública que questionava a constitucionalidade da Lei 4.459/2013. A norma acabou com as funções de Analista de Tecnologia da Informação e de Técnico da Tecnologia da Informação do plano de cargos e carreiras do Estado, o que abriu espaço para terceirização do serviço. Com isso, surgiram suspeitas de favorecimento em licitações do setor, desvio de recursos públicos e corrupção.

Proposta em 2017, a ação movida pelo MPMS pedia que o governo estadual fosse condenado a se abster de celebrar novos contratos de terceirização dos serviços de TI, bem como de renovar os existentes ou aditá-los. Além disso, pleiteava a abertura de concurso público para a área e apresentação de cronograma para substituição gradativa dos empregados terceirizados por concursados.

O juiz da 1ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos de Campo Grande, Ariovaldo Nantes Corrêa, homologou o TAC no fim de abril deste ano. Consequentemente, extinguiu a ação civil pública.

O acordo ainda travou pelo menos outras três investigações similares que estavam em andamento no MPMS, instauradas em 2016 e 2019.

Publicado em junho do ano passado, o TAC determinou que o governo elaborasse um Plano Estratégico de Tecnologia da Informação dentro de 12 meses. O plano foi publicado em abril deste ano, mas não tratou sobre as licitações para a área.

O acordo entre Executivo estadual e MPMS tampouco impôs condições para reduzir a terceirização dos serviços de informática e TIC. Testemunhas ouvidas pelo MPMS na ação civil pública frustrada pelo termo chegaram a apontar que 60% da SGI (Superintendência de Gestão de Informação) era composta por funcionários das empresas contratadas do governo.

Além de Reinaldo, assinaram o TAC o procurador-geral de Justiça Alexandre, Magno de Benites Lacerda; os promotores Adriano Lobo Viana de Resende, Humberto Lapa Ferri e Marcos Alex Vera de Oliveira; o titular da (Secretaria de Estado de Fazenda), Felipe Mattos de Lima Ribeiro; o superintendente de Gestão da Informação da Sefaz, Alessandro Menezes de Souza; a titular da SAD (Secretaria de Estado de Administração e Desburocratização), Ana Carolina Araujo Nardes; o superintendente de Gestão de Compras e Materiais, Muriel Moreira; e a procuradora-geral do Estado (PGE), Fabíola Marquetti Sanches Rahim.

‘Computadores de Lama’ investigou contratos de informática do Governo de MS

As suspeitas de irregularidades em vínculos do Poder Executivo estadual com empresas de informática levaram à deflagração da Operação Computadores de Lama, sexta fase da Lama Asfáltica, em 2018.

Além de bloqueio de bens e medidas de busca e apreensão, a ofensiva cumpriu mandado de prisão contra o empresário João Roberto Baird, apontado como dono de um conglomerado de empresas do ramo de informática com contratos com o governo — Itel Informática, PSG Tecnologia Aplicada, Digitho Brasil Soluções em Software, atual Digix, e Mil Tec Tecnologia da Informação. Suposto “testa de ferro” de Baird, Antônio Celso Cortez também acabou detido na ocasião.

As atividades exercidas pelas empresas atribuídas a Baird são similares às desempenhadas hoje por grupos como o Imagetech, que, de 2015 para cá, recebeu R$ 117,9 milhões do governo Reinaldo. Geoi2 Tecnologia da Informação Ltda, Imagetech Tecnologia em Informática Ltda e Imagetech Tecnologia em Serviços Ltda – que funcionam no mesmo endereço — já tinham vínculo com o Estado antes de o tucano assumir, mas, com ele no Parque dos Poderes, a média dos ganhos anuais mais que dobrou.

Hoje, são R$ 22,2 milhões em contratos das Imagetech e da Geoi2 vigentes com Sefaz (Secretaria de Estado de Fazenda), SED (Secretaria de Estado de Educação), Funsau (Fundação Serviços de Saúde de Mato Grosso do Sul) e Detran-MS (Departamento Estadual de Trânsito) — um deles foi aditado recentemente. Os números são todos do Portal da Transparência.

Sócios também atuam nos mercados imobiliário e financeiro

Ivan Abrahão Marinho e Arthur Affonso de Barros Marinho, pai e filho, são os donos das três empresas, abertas entre 2002 e 2010, em Campo Grande. Eles também administram juntos a Lotus Comércio de Combustíveis Ltda.

O emaranhado de CNPJs é ainda mais extenso. Ivan também é sócio na Imobiliária Dimensão Ltda e tem três holdings — a IM Participações Eireli, a AM Participações Eireli e a IAM Participações Eireli Ltda. Somados, os capitais sociais das três empresas chegam a R$ 26 milhões. Arthur é sócio do pai na AM.

As empresas de informática não foram sempre de Ivan e Arthur Affonso. A entrada do pai na sociedade de Imagetech Tecnologia em Informática se deu em janeiro de 2018, por exemplo.

Já no caso da Imagetech Tecnologia em Serviços, quem figurava no quadro societário antes de Ivan Abrahão Marinho era Reinaldo de Andrade Silva. Reinaldo hoje é proprietário da Bluetrix Tecnologia Ltda, com sede em Santana do Parnaíba (SP).

No fim do ano passado, a Bluetrix fechou contrato com a (Fundação do Trabalho de Mato Grosso do Sul) para desenvolver aplicativo de vagas de emprego. Fechado em R$ 2 milhões, o vínculo já foi aditado para R$ 3,1 milhões. A contratação foi feita sem licitação e com recursos carimbados para o combate à pandemia de covid-19.

Os contratos mais recentes das Imagetech e da Geoi2 são assinados por Ricardo Souza de Andrade. Ele já figurou como sócio da Souza & Andrade Ltda, a Carimfor, empresa de Campo Grande do ramo de fabricação de artigos para escritório e gravação de carimbos.

Em nota enviada anteriormente à reportagem, o grupo Imagetech afirmou que “atua no mercado de tecnologia há mais de 18 anos, possuindo mais de 250 colaboradores, sendo referência em seu segmento, no mercado privado e público, sempre prezando pela transparência e lisura nas suas operações”.

“Os sócios também atuam no ramo de combustíveis e imobiliário há mais de 30 anos. O grupo não é e nunca foi objeto de qualquer investigação, segue as regras de compliance e os contratos em vigor com o Poder Público sempre foram fiscalizados, atestados e cumpridos fielmente, e podem ser acessados no Portal da Transparência”, completou.