A repactuação do acordo de delação premiada dos irmãos Joesley e Wesley Batista, executivos da JBS, deve complicar a defesa do governador Reinaldo Azambuja (PSDB) na ação penal que o denunciou pelos crimes de corrupção ativa e passiva, e organização criminosa (APn 980/DF). Isso porque uma das estratégias da defesa de Reinaldo era apontar que a denúncia é baseada em afirmações de delação não pactuada, a partir da qual originou-se a Operação Vostok, em 2018.

A denúncia do MPF (Ministério Público Federal) realizada em outubro incluiu os irmãos Batista no polo passivo porque, na ocasião, a PGR (Procuradoria-Geral da República) considerou que houve descumprimento de cláusulas, o que desfez o acordo de delação. Como a rescisão ainda não havia sido homologada pelo STF, a subprocuradora-geral pediu que o STJ suspendesse a tramitação da ação penal em relação aos empresários para aguardar a análise do Supremo.

No entanto, o acordo foi repactuado pela PGR (Procuradoria-Geral da República) na última segunda-feira (7) e aguarda a homologação, que deverá ser realizada pelo ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Edson Fachin.

Na prática, com a reconsideração da delação, um dos principais argumentos da defesa do governador cai por terra, já que o time de advogados de Reinaldo – Juarez Tavares, Cleber Lopes, Gustavo Passarelli, Marcel Versiani, Eduarda Camara, Murilo Marcelino e Rita Machado – insistiu que a APn 980/DF não gera prevenção, pois se sustenta em acordo de delação premiada dos irmãos Joesley e Wesley Batista.

Muito além da delação

Wesley e Joesley Batista firmaram um primeiro acordo de delação em 2017, com multa de R$ 110 milhões para cada um dos executivos, mas sem restrições de liberdade. No depoimento, os executivos afirmaram que a JBS havia repassado R$ 70 milhões a Reinaldo. Clique AQUI para conferir transcrição de trecho que cita Reinaldo.

Com base na delação, desencadearam-se as investigações da Operação Vostok, a partir de sindicância convertida em inquérito a partir de pedido do então vice procurador-geral da República José Bonifácio Borges de Andrada ao STJ. Em agosto de 2017, o ministro Félix Fischer, relator, deferiu o pedido e autorizou novo depoimento de Joesley e Wesley Batista ao delegado da Polícia Federal do Josélio Azevedo de Souza. Os depoimentos foram realizados na Polícia Federal de São Paulo, em dezembro de 2017, quando foram feitas as retificações e detalhamentos da delação premiada à Lava Jato.

 

Com delação da JBS confirmada na PGR, defesa de Reinaldo se complica no STJ
Trecho da delação premiada | Foto: Reprodução

Assim, o MPF concluiu que o governador de Mato Grosso do Sul recebeu R$ 67,7 milhões em propina do grupo JBS, entre 2014 e 2016. Em contrapartida, Reinaldo teria cedido isenções fiscais que desfalcaram os cofres estaduais em R$ 209,7 milhões.

 

Vale lembrar que a PF () levantou provas que culminaram no indiciamento, em julho deste ano, de Reinaldo Azambuja e o filho, Rodrigo Souza e Silva, além de mais 20 pessoas. Na denúncia, o MPF atestou a existência de provas, obtidas nos desdobramentos da Vostok, bem como compartilhadas da Operação Lama Asfáltica, além da delação dos irmãos Batista e quebra dos sigilos telefônico e bancário dos agora denunciados. Caso o STJ aceite, os denunciados passam à condição de réus.

Andamento

A APn 980/DF corre no STJ (Superior Tribunal de Justiça) e tem como relator o ministro Félix Fischer, que já pediu pauta na Corte Especial para julgar o processo. Entre os pedidos a serem analisados está o afastamento de Reinaldo do cargo. Atualmente, corre prazo para que os denunciados apresentem defesa.

Mas o time de advogados do governador tucano trabalha para protelar a Justiça. A manobra mais recente foram embargos de declaração contra decisão da Corte Especial do STJ que rejeitou pedido de Reinaldo para trazer o caso ao âmbito estadual. Além disso, tramita no STF um habeas corpus com pleito idêntico, negado em caráter liminar pelo ministro Edson Fachin.

“Esquema antigo'

O esquema, segundo as investigações, teria começado ainda em 2014, quando Azambuja foi eleito governador pela primeira vez. Na ocasião, o tucano teria firmado compromisso de conceder isenções fiscais ao grupo JBS em troca de doações de campanha.

Os incentivos seriam concedidos via Tares (Termos de Acordos de Regime Especial) ou aditivos a acordos já celebrados. Também denunciado pelo MPF, o ex-secretário de Estado de Fazenda e atual conselheiro do TCE-MS (Tribunal de Contas do Estado), Márcio Monteiro, foi encarregado de assinar as isenções.

A partir da vitória nas urnas, o esquema foi estendido para os próximos anos. Ao invés de doações de campanha, a JBS passou a pagar a propina por meio da compra de “bois de papel”. Notas frias era emitidas por pecuaristas e frigoríficos aliados ao já governador. No desenrolar da Vostok, o próprio Ministério da Agricultura atestou que o gado supostamente vendido ao grupo empresarial jamais havia sido movimentado.

Azambuja também receberia remessas de propina em espécie. O filho do governador, Rodrigo Souza e Silva, seria o articulador da prática. Ele também acabou denunciado pelo MPF.

Cruzados, dados bancários e registros telefônicos levantados pela Polícia Federal deram indícios de possíveis encontros para entrega dos malotes. O dinheiro era recolhido em São Paulo (SP) e no Rio de Janeiro (RJ), com suporte do pecuarista e empresário João Roberto Baird, outro denunciado.

A Polícia Federal levantou R$ 12,1 milhões em propina movimentada em espécie para Reinaldo Azambuja.