Alvo de mandados de buscas pela Polícia Federal na manhã desta terça-feira (10), a empresa J.B.A Iunes-ME, mais conhecida como “ Laboratórios”, manteve contrato com a Prefeitura de até outubro deste ano, segundo o Portal da Transparência. A empresa, que pertence a José Batista Aguilar Iunes – irmão do prefeito Marcelo Iunes (PSDB) – e foi impactada por decisão judicial de junho de 2020 para suspensão de contrato, conforme já noticiou o Jornal Midiamax.

A decisão foi assinada pelo Marcos José de Brito Rodrigues, que ordenou a suspensão do contrato considerando pagamento de R$ 982 mil feitos entre 2017 e 2019. O desembargador pontuou que, caso não houvesse a imediata suspensão contratual, os valores pagos em decorrência da contratação irregular continuariam a ser repassados à citada empresa, com risco de não serem ressarcidos ao erário público.

Na ocasião, o desembargador também determinou que a Prefeitura não pode repassar novos pagamentos à empresa e ainda, não deve recadastrá-la ou recontratá-la, por inexigibilidade de licitação, até o julgamento final do agravo, que segue em curso.

De acordo com os autos, a empresa do irmão de Iunes recebeu até março deste ano, o repasse de R$ 740 mil. Na ação popular protocolada no TJMS, é citado que a transferência ilícita de milionárias quantias aos parentes do prefeito fica mais evidente ao se observar, no portal da transparência da Prefeitura, que, embora outras 4 empresas tenham sido inicialmente cadastradas, nenhuma delas recebeu qualquer espécie de pagamento até o momento.

Laboratório alvo de buscas da PF em Corumbá teve contrato suspenso judicialmente em junho
O prefeito Marcelo Iunes (PSDB), após buscas da PF em sua residência | Foto: Reprodução

Farmacêutico de formação, Marcelo Aguilar Iunes (PSDB) – que assumiu a Prefeitura de Corumbá após o falecimento do eleito, Ruiter Cunha – tornou-se alvo de suspeitas de usar familiares como ‘laranjas’ para contratar com quase R$ 1 milhão de verbas municipais e com dispensa de licitação o laboratório do qual seria o verdadeiro dono. Mais cedo, em vídeo, Iunes confirmou a batida da PF em sua residência tinha como busca por documentos da empresa, que já foi oficialmente de sua esposa.

O vínculo de Marcelo Iunes com a ‘Citolab’ era notório em Corumbá: a empresa tinha até o nome e sobrenome do prefeito na fachada. Ao quadro societário pertencia sua esposa, Amanda Cristiane Balancieri, que Iunes nomeou como secretária especial de Cidadania e Direitos Humanos. Ela saiu da sociedade em 19 de maio de 2017 e transferiu a parte que tinha do laboratório para o irmão do prefeito, João Batista Aguillar Iunes. Amanda deixou de ser oficialmente sócia no mesmo ano em que Marcelo assumiu o cargo de Prefeito, segundo a Junta Comercial de Mato Grosso do Sul.

Além disso, a chegada de Iunes à administração municipal corumbaense também afetou o faturamento do laboratório. O total de pagamentos da Prefeitura para o negócio da família saltou de R$ 271.873,55 para R$ 442.614,63 entre 2017 e 2018, segundo dados oficiais do Portal da Transparência.

Laboratório alvo de buscas da PF em Corumbá teve contrato suspenso judicialmente em junho
Buscas também ocorreram na sede de secretaria na qual esposa de Iunes está lotada | Foto: Fala Povo | Reprodução

Citolab, ACB e JBA Iunes: mesmo CNPJ

Sob o registro oficial de JBA Iunes, a Citolab existe desde 2008 e, nos últimos dois anos, acumulou acordos que totalizam R$ 936.719 de faturamento na Prefeitura de Corumbá. Em de fevereiro do ano passado, a empresa fechou acordo de R$ 412.841,76, válido até fevereiro de 2019. O contrato está sob o registro 01/2018.

Laboratório alvo de buscas da PF em Corumbá teve contrato suspenso judicialmente em junho
Imagem de 2012 mostra nome do atual prefeito na fachada do Citolab | Foto: Reprodução | Google Maps

Dois meses depois, em 3 de abril, novo contrato foi firmado entre prefeitura e o laboratório para realização de exames laboratoriais ou de imagem, além de consultas médicas na atenção especializada para atender pacientes de Corumbá. Dessa vez, o valor fechado foi de R$ 523.877,24, valendo até abril de 2020. Todas as contratações foram feitas sem realização de licitação, pois foram consideradas legalmente enquadradas na modalidade de inexibilidade. Todavia, antes de encerrar o acordo feito com inegibilidade de licitação, o contrato foi aditado, sendo encerrado somente em outubro. Nesta modalidade, foram pagos mais R$ 261.938,62 à empresa.

JBA são as iniciais de José Batista Aguilar Iunes, irmão do prefeito. A empresa também já operou sob o nome ACB Iunes, iniciais de Amanda Cristiane Balancieri, esposa de Marcelo e atual secretária especial de Cidadania e Direitos Humanos. O CNPJ do laboratório é o 09.476.035/0001-76, segundo os registros oficiais.

Investigação

A contratação da empresa familiar Citolab foi alvo de investigação pelo (Ministério Público de Mato Grosso do Sul). O promotor Luciano Bordignon Conte, titular da Promotoria do Patrimônio Público em Corumbá, chegou a confirmar que o edital de chamamento público não obedeceu as normas legais.

Laboratório alvo de buscas da PF em Corumbá teve contrato suspenso judicialmente em junho
O prefeito de Corumbá, Marcelo Aguilar Iunes | Foto: Reprodução | Facebook

Entre os problemas flagrados na análise técnica do MPMS, foi verificada a limitação do prazo para credenciamento inferior à duração do contrato. Além disso, está o edital e os anexos da concorrência que deveria ser pública não foram sequer disponibilizados no Portal de Transparência.

O próprio promotor admitiu que a situação limita a participação de possíveis interessados, pondo em cheque o tratamento “isonômico imprescindível ao sistema de credenciamento”. Mas, ainda assim, a 5ª Promotoria de Justiça do Patrimônio Público de Corumbá fez apenas uma recomendação à prefeitura de Corumbá. O promotor recomendou, portanto, a retificação do edital de chamamento público para credenciamento de empresas para prestar serviços laboratoriais, e solução dos problemas flagrados antes no prazo de 10 dias.

Posicionamento

A reportagem solicitou posicionamento à Prefeitura de Corumbá acerca do cumprimento de mandados de busca e apreensão, que tiveram como alvos o prédio da Secretaria, a residência de Marcelo Iunes (PSDB), prefeito do município, dentre outros.

Em nota, a assessoria pontuou que a Prefeitura “não vê nenhum fato novo que motivasse a operação policial às vésperas do pleito eleitoral, mas ainda assim se coloca à disposição das autoridades para qualquer esclarecimento que seja necessário”. Confira-a na íntegra:

“Sobre a ação da Polícia Federal realizada em Corumbá nesta terça-feira, 10 de novembro, a Prefeitura de Corumbá esclarece que:

Pela imprensa, tomou conhecimento que a investigação é relacionada ao processo de credenciamento do Executivo municipal com o laboratório Citolab. O fato causou estranheza porque o mesmo objeto já foi averiguado pelo Ministério Público Estadual (MPE) e pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE-MS), sendo arquivado por ambos.

No despacho de arquivamento dos autos n° 01.2018.00006204-5, o promotor Luciano Bordignon Conte afirmou que “as imputações genéricas de que a empresa pertencia de fato à esposa do prefeito e somente estaria registrada em nome de um “laranja” não encontram respaldo em qualquer elemento fático probatório, a não ser nas elucubrações infundadas do representante”.

Já o TCE-MS assegurou que “… temos que o objetivo da Inspeção foi atingido, eis que foram examinadas a legalidade e a legitimidade dos atos sujeitos ao controle desta Corte de Contas e foi avaliado o desempenho na utilização do Credenciamento pela Secretaria de Saúde no atendimento as necessidades de serviço de exames laboratoriais em Corumbá”.

O Tribunal ainda pontuou que “…verificamos que houve o credenciamento de outras empresas (para lotes distintos), e que estas também receberam da mesma forma que a empresa JBA Iunes, ou seja, somando-se o valor do SUS com o valor da complementação aprovada pelo Conselho Municipal de Saúde, o que corresponde ao valor da Tabela Municipal”.

“Também verificamos que a questão do parentesco dos ex-sócios e do atual com o Prefeito já foi objeto de análise pelo Ministério Público, que arquivou a notícia de fato por entender que inexiste irregularidade”, completou a manifestação do TC/4280/2019.

Mesmo com as decisões do MPE e do TCE-MS, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS) suspendeu, em junho deste ano, o credenciamento da Citolab. A Prefeitura apresentou defesa e o processo está tramitando na Justiça Estadual.

Desta forma, o Executivo municipal não vê nenhum fato novo que motivasse a operação policial às vésperas do pleito eleitoral, mas ainda assim se coloca à disposição das autoridades para qualquer esclarecimento que seja necessário”.