MPE mantém punição a Saldanha que remete a ‘excesso de arquivamentos’
Promotor alegou suspeição de procurador que o alertou
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Promotor alegou suspeição de procurador que o alertou
O promotor de Justiça Alexandre Pinto Capiberibe Saldanha tentou escapar, mas continua oficialmente punido por alegar perseguição de um procurador. A decisão, tomada nesta quinta-feira (30) pelo Colégio de Procuradores do MPE-MS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul), remete ao excesso de arquivamentos em procedimentos que deveriam ter investigado denúncias contra políticos nos últimos anos.
Saldanha, à frente de Promotorias do Patrimônio Público, arquivou casos polêmicos como denúncias no Concurso da Sefaz-MS, de enriquecimento ilícito contra Edson Giroto e Osmar Jerônymo, e outras suspeitas de gastos ilícitos durante o governo de André Puccinelli (PMDB). A maioria se tornou pública com reportagens do Jornal Midiamax.
Durante a operação Lama Asfáltica, a Polícia Federal chegou a ver indícios para colocar em dúvida a postura do gabinete do Procurador-Geral de Justiça e pediu autorização ao TJMS para investigar Humberto Brittes, ex-PGJ, e Alexandre Saldanha. O pedido foi negado e nesta quinta-feira o Colégio de Procuradores discutiu o procedimento, que dependia da manifestação do decano Sérgio Morelli.
As investigações conduzidas pela CGU (Controladoria-Geral da União), MPF (Ministério Público Federal), Receita Federal e Polícia Federal acabaram forçando o desarquivamento de várias das denúncias antecipadas nas reportagens e o MPE-MS formou uma força tarefa para voltar a muitos dos temas antes arquivados.
‘Perseguido’ por arquivar
Com relação ao promotor Alexandre Saldanha, no entanto, foi à votação entre os procuradores de MS a tentativa dele de reformular a decisão de punição. Ele havia alegado suspeição do então procurador de Justiça, Marcos Antonio Martins Sottoriva, justamente ao Procurador-Geral de Justiça, Humberto Brites, na promoção de arquivamento do inquérito civil nº 29/2014, alegando que o superior seria seu “desafeto”.
Com nove votos a favor, a pena foi mantida.
Saldanha alegou ser “perseguido” por Sottorriva porque este representou contra o promotor por diversas vezes na Corregedoria-Geral de Justiça, alegando que o mesmo pedia sucessivamente arquivamentos de inquéritos civis, instaurados para investigar atos ilícitos.
O promotor segue advertido por não fundamentar a petição alegando a suspeição do procurador e por desrespeitar o órgão superior da administração, alegando que o membro do Conselho Superior estaria impedido de opinar na promoção de arquivamento em questão.
Em pauta para votação desde a reunião do mês passado, quando o encontro do Colégio durou três horas pela discussão do assunto, a decisão foi adiada devido ao pedido de vistas do decano, procurador Sérgio Luiz Morelli, que apresentou seu voto nesta quinta com provimento parcial do recurso, mantendo a advertência pela falta de fundamentação e o absolvendo pelo desrespeito.
Na ocasião, já haviam votado pela permanência da punição nove dos 32 procuradores: Gilberto Robalinho, Lucienne Reis D’Avila, Francisco Neves, Esther Sousa de Oliveira, Adhemar de Carvalho Neto, Luís Alberto Safraider, Sara Francisco Silva e Lenirce Furuya.
Todos os votos seguiram o parecer da revisora Irma Vieira de Santana e Anzoategui, que alegou que um promotor não poderia interferir no modo de votar de um procurador, superior hierárquico que cumpre função exatamente de supervisor do trabalho dos promotores.
A procuradora questiona também o fato de Saldanha ter alegado suspeição em um único inquérito sigiloso, de vários que são encaminhados corriqueiramente para o arquivamento por Saldanha. Para Irma, se a briga é motivo para suspeição, deveria ser alegada em todos os procedimentos do promotor.
‘É como o preso suspeitar do delegado’
O relator Edgar Roberto Lemes de Miranda leu o parecer, favorável a absolvição de Saldanha, durante duas horas. Na explicação do voto, o procurador destacou a suposta briga entre os membros do Ministério Público, com detalhes.
Alegou que por várias vezes Sottoriva, agora Corregedor-Geral do Ministério Público, utilizou-se de “argumentos inválidos, representações sucessivas e infundadas” contra o promotor de Justiça, que comprovariam o desafeto alegado por Saldanha no documento enviado ao Procurador-Geral. Perseguição que “representaria tanto esmero e tanto tempo” do procurador por uma “querela pessoal”.
Para defender sua tese, Edgar citou uma a uma das representações do procurador contra Saldanha e o conteúdo das mesmas, alegando que todas elas foram arquivadas e lendo todas as decisões.
No voto-vista, Morelli defende que alegar suspeição de Sottoriva apenas porque ele representou contra o promotor na Corregedoria é “o mesmo que admitir suspeição de um delegado porque o preso em flagrante já foi detido outras vezes pelo mesmo delegado. Ou a suspeição a um juiz que analisa o seu caso porque ele já o condenou outras vezes”.
O decano defendeu que o procurador representou contra Saldanha agindo de acordo com a sua função, que é a de fiscalizar o trabalho do promotor de Justiça “e tanto faz o procedimento ou não das representações”.
Votaram com Morelli os procuradores Hudson Kinashi, Silvio Maluf, Evaldo Borges, Belmires Ribeiro e Helton Bernardes.
Sigilo no MPE-MS
A leitura do voto do relator demorou uma hora para acontecer porque os procuradores discutiram, antes, a questão do sigilo dentro do Colégio. Como punição de membro do Ministério tem caráter reservado, o Procurador-Geral de Justiça Paulo Cezar Passos interrompeu o rito para discutir a presença da equipe de reportagem do Jornal Midiamax.
“Só um segundo, que tem uma jornalista do Midiamax aqui. Tenho uma posição de que o Conselho Nacional do Ministério Público abre as sessões, mas entendo que a nossa lei fala de caráter reservado e como o senhor já está lendo, tenho que submeter ao Colegiado”, disse o PGJ ao relator.
Gilberto Robalinho defendeu que a lei fala em sigilo, não em caso ‘reservado’. “Nas hipóteses de sigilo o Colegiado tem que deliberar. Mas caráter reservado é o mesmo que sigiloso? Eu entendo que não”, ressaltou.
O procurador Helton Bernardes também opinou a favor da divulgação do caso. “A interpretação constitucional é, na verdade, invertida. O interesse público se sobrepõe a todo e qualquer interesse privado. Isso é regra em qualquer estado democrático, se duvidar até na Coreia do Norte. Essa é a interpretação. Servidores públicos têm que entender que temos sim que ser fiscalizados. Não podemos ficar nessa esfera da obscuridade que cerca o servidor público. A população tem interesse, tem o direito de acompanhar sim todos os atos públicos que acontecem neste país”.
Apesar de discursar amplamente a favor da postura do CNMP na abertura da sessão e quando a questão começou a ser discutida, o Procurador-Geral de Justiça Paulo Passos acolheu, no voto, o pedido de análise sigilosa do procedimento. Passos, recém-eleito para chefiar o Ministério Público do Estado, defendeu enquanto candidato mais transparência nas ações do órgão.
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