A oposição considerou nesta quarta-feira “propaganda enganosa” a decisão do governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz (PT), de abrir seu sigilo bancário, fiscal e telefônico à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) mista do Cachoeira. O argumento é que as informações sigilosas já haviam sido quebradas pela Justiça em procedimentos investigatórios em curso – dados que os membros do colegiado poderiam ter acesso de qualquer maneira.

“Vamos ser objetivos: O que o senhor está fazendo aqui? Autorizando o sigilo que já foi quebrado? O que é isso?”, perguntou o deputado Domingos Sávio (PSDB-MG), que questionou “a novidade” do fato. Em depoimento à comissão, o petista assinou autorização para abrir seus sigilos, atitude que levou o governador goiano, Marconi Perillo (PSDB), a também disponibilizar seus dados à investigação. Na terça-feira, o tucano foi à CPI, mas alegou não ver motivos para abrir as informações.

Para Carlos Sampaio (PSDB-SP), a nobreza do gesto do governador é questionável, já que, se o sigilo havia sido quebrado anteriormente, os dados poderiam ser conseguidos pela comissão. “A CPI poderia perfeitamente pedir o compartilhamento das provas no inquérito em que Vossa Excelência teve o sigilo quebrado”, afirmou ao governador.

Em novembro do ano passado, o ministro Asfor Rocha, do Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou a quebra do sigilo bancário e fiscal de Agnelo no período entre 2005 e 2010, após denúncias de desvios de verbas do Ministério do Esporte, pasta da qual Agnelo foi ministro. O caso das supostas irregularidades no programa Segundo Tempo levou à demissão do então ministro do Esporte, Orlando Silva, no ano passado.

Senadores dizem que CPI desvia foco com governadores

Na avaliação do senador Pedro Taques (PDT-MT), a quebra do sigilo de Agnelo e de Perillo terá pouco efeito prático. Para ele, provavelmente não serão encontrados vestígios de atividades irregulares, mesmo que elas tenham acontecido. “Imagine, você acha que o cidadão que possa cometer corrupção vai colocar dinheiro na própria conta?”, afirmou.

Ele também considerou os dois depoimentos praticamente “nulos”. Na opinião do senador, os membros da CPI precisam se dedicar a analisar os documentos da Operação Monte Carlo, da Polícia Federal, bem como os sigilos de outras pessoas relacionadas à investigação que já foram quebrados pela CPI. “Os depoimentos não contribuem em nada na minha avaliação. Nós temos que nos ater aos documentos.”

Para o senador Cássio Cunha Lima (PSDB-PB), os parlamentares da CPI atravessaram uma “linha perigosa” ao decidir pela quebra de sigilo dos dois governadores. “Um governador de Estado não pode ser investigado pelo Senado”, disse.

Na opinião de Cunha Lima, o debate em torno do sigilo dos governadores é um “embate político” que desvia o foco da CPI, que é o de investigar as relações de Cachoeira com agentes públicos e privados.

Para o senador paraibano, agora é inevitável aprovar a convocação do dono da Construtora Delta, Fernando Cavendish, e de outros envolvidos que, até o momento, estavam fora das investigações da CPI. “Chamaram dois governadores de Estado e não vão chamar o dono da principal empresa suspeita? Não há como.”

A próxima reunião administrativa da CPI foi marcada para quinta-feira, quando os membros da comissão deverão votar requerimentos e definir novas datas para depoimentos.

Carlinhos Cachoeira

Acusado de comandar a exploração do jogo ilegal em Goiás, Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, foi preso na Operação Monte Carlo, da Polícia Federal, em 29 de fevereiro de 2012, oito anos após a divulgação de um vídeo em que Waldomiro Diniz, assessor do então ministro da Casa Civil, José Dirceu, lhe pedia propina. O escândalo culminou na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Bingos e na revelação do suposto esquema de pagamento de parlamentares que ficou conhecido como mensalão.

Escutas telefônicas realizadas durante a investigação da PF apontaram contatos entre Cachoeira e o senador democrata Demóstenes Torres (GO). Ele reagiu dizendo que a violação do seu sigilo telefônico não havia obedecido a critérios legais.

Nos dias seguintes, reportagens dos jornais Folha de S.Paulo e O Globo afirmaram, respectivamente, que o grupo de Cachoeira forneceu telefones antigrampos para políticos, entre eles Demóstenes, e que o senador pediu ao empresário que lhe emprestasse R$ 3 mil em despesas com táxi-aéreo. Na conversa, o democrata ainda vazou informações sobre reuniões reservadas que manteve com representantes dos três Poderes.

Pressionado, Demóstenes pediu afastamento da liderança do DEM no Senado em 27 de março. No dia seguinte, o Psol representou contra o parlamentar no Conselho de Ética e, um dia depois, em 29 de março, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski autorizou a quebra de seu sigilo bancário.

O presidente do DEM, senador José Agripino Maia (RN), anunciou em 2 de abril que o partido havia decidido abrir um processo que poderia resultar na expulsão de Demóstenes, que, no dia seguinte, pediu a desfiliação da legenda, encerrando a investigação interna. Mas as denúncias só aumentaram e começaram a atingir outros políticos, agentes públicos e empresas.

Após a publicação de suspeitas de que a construtora Delta, maior recebedora de recursos do governo federal nos últimos três anos, faça parte do esquema de Cachoeira, a empresa anunciou a demissão de um funcionário e uma auditoria. O vazamento das conversas apontam encontros de Cachoeira também com os governadores Agnelo Queiroz (PT), do Distrito Federal, e Marconi Perillo (PSDB), de Goiás. Em 19 de abril, o Congresso criou a CPI mista do Cachoeira.