Contrato de R$ 59 milhões do Governo de Mato Grosso do Sul com a Compnet Tecnologia Eireli é alvo de ação movida pelo MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul), por ver indícios de fraude na licitação e superfaturamento. A maioria dos estados do país mantém contratos com valores bem menores para o mesmo serviço, sendo que alguns desenvolveram o próprio sistema e outros utilizam um sistema disponibilizado gratuitamente pelo Ministério da Justiça. Assim, MS paga até 42 vezes mais para utilizar o SIGO (Sistema Integrado de Gestão Operacional).

As cifras volumosas chamaram atenção do Promotor de Justiça, Adriano Lobo Viana de Resende, que solicitou formalmente posição de outros estados para compor a petição inicial do processo.

A diferença de valores para o mesmo período, de um ano, chega a ser 4253% no comparativo com o estado do Ceará, que gasta R$ 685,6 mil no período, enquanto Mato Grosso do Sul gasta R$ 29.842.386,65 – o contrato é de R$ 59 milhões para 24 meses.

Um exemplo que demonstra o quão caro o contrato com a Compnet sai para o Estado é a comparação com o Estado do Rio de Janeiro, que tem 13,3 milhões de habitantes a mais que MS. Nem por isso, o estado carioca paga tão caro por um sistema.

Por lá, a secretaria de segurança mantém contrato de R$ 11,8 milhões com a empresa Sisgraph (que atuava em MS antes da Compnet), cujo objetivo é prestar serviço semelhante ao oferecido pela Compnet: “prestação de serviços de implantação e operação assistida das novas licenças e ainda a prestação de serviços de suporte e assistência técnica, incluindo manutenções preventiva, corretiva e evolutiva, suporte técnico (24×7) e treinamento do Sistema de Gestão de Ocorrências Emergenciais (I/CAD)”.

Para se ter uma ideia do volume de ocorrências a mais que o RJ tem em relação a MS, somente em 2023, o estado carioca registrou 3.388 assassinatos, enquanto por aqui foram 446 homicídios no mesmo período.

Outros estados pagam ainda menos por contratos com sistemas de gerenciamento para as forças de segurança: Santa Catarina (R$ 2,9 milhões), Acre (R$ 1,4 milhão), Paraná (R$ 3,9 milhões), Mato Grosso (R$ 7,5 milhões) e Minas Gerais (R$ 2,3 milhões).

Há ainda casos de estados que utilizaram a própria estrutura de tecnologia da informação para desenvolver um sistema totalmente integrado e com custos baixos, uma vez que a manutenção e melhorias do sistema não ficam a cargo de uma empresa contratada, mas sim nas mãos do próprio estado. É o caso do Distrito Federal, Rio Grande do Norte, Goiás e Rio Grande do Sul.

Controladoria multa Compnet em R$ 11,3 milhões

No dia 29 de julho, a CGE-MS (Controladoria-Geral do Estado de Mato Grosso do Sul) aplicou multa de R$ 11.382.146,67 à Compnet Tecnologia Ltda. (CNPJ 14.164.094/0001-49) após detectar fraudes no contrato.

Conforme apurado pelo Jornal Midiamax, a CGE-MS teria identificado irregularidades na composição dos preços pagos pelo Estado em relação aos serviços prestados pela Compnet.

Assim, a empresa tinha 15 dias para entrar com recurso. A multa deve ser paga até 30 dias após o trânsito em julgado – quando não couber mais recursos.

O processo administrativo foi aberto após o MPMS (Ministério Público de MS) enviar denúncia à CGE-MS. O contrato da Compnet com o governo de MS é alvo de ação de improbidade administrativa na Justiça.

Alagoas pagou 8 vezes mais barato para usar o SIGO da Compnet

Diferente do contrato celebrado entre a Sejusp-MS e a Compnet, o estado de Alagoas adquiriu o sistema SIGO da Compnet, permitindo que contrate futuramente uma outra empresa apenas para manutenção e melhoria do sistema.

Enquanto isso, em Mato Grosso do Sul, o governo não tem autorização para utilizar o código-fonte do SIGO. O tema foi alvo de ação judicial a qual deu causa favorável à Compnet para manter o sigilo do sistema.

Dessa forma, o Estado fica ‘refém’ da Compnet, impedindo que outra empresa possa apenas fazer a manutenção e melhoria do sistema, como no caso do estado nordestino. Assim, a Sejusp-MS teria que adquirir outro sistema, o que resultaria em custos maiores, além de fazer toda a adaptação e integração ao banco de dados já existente.

SGI já foi alvo de investigações

Superintendência responsável por elaborar as condições da contratação da Compnet, bem como por atestar ser essencial que o sistema SIGO CADG fosse adquirido, a SGI já esteve em meio a investigação. Ação de 2015 investigava “terceirização irrestrita” do serviço de tecnologia da informação do Governo de Mato Grosso do Sul, por meio de contratos milionários com empresas de informática.

No entanto, em 2020, um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) foi firmado entre o MPMS e o governo de Mato Grosso do Sul com novas regras para celebrar novos contratos. Lembrando que o primeiro contrato com a Compnet foi firmado em 2016.

Segundo detalhado no TAC, as medidas abrangem a celebração de contratos com empresas para terceirização do serviço, que também foi apurada no processo.

Entre os pontos acordados, quando for contratar empresas de informática, o Governo de MS terá de descrever o objeto, “com especificações precisas”, detalhar composição de preço, critério utilizado, usando base de informações de várias fontes, como contratações de outros órgãos.

O acordo foi assinado sob o pretexto de “trazer maior lisura e transparência ao processo de contratação de serviços e aquisição de produtos na área da tecnologia da informação, inclusive na terceirização de mão-de-obra”, conforme discorre o ato.

Contrato do SIGO: R$ 59 milhões e licitação sem concorrência

Mensalmente, saem dos cofres públicos de Mato Grosso do Sul R$ 1.530.313,82 pelo contrato 32/2021/Sejusp, assinado em 22/06/2021, com valor inicial de R$ 58,4 milhões. De lá para cá, o contrato foi aditivado uma vez. Assim, o valor atual já é de R$ 59,5 milhões.

Ação do MPMS questiona a inexigibilidade de licitação para contratação milionária da Compnet. Para isso, pede a suspensão do contrato de R$ 59,5 milhões e o impedimento de a Compnet contratar com o Governo de MS.

“Dolosamente dispensaram a licitação (trata-se de caso que inegavelmente exige licitação); adotaram procedimentos ilegais, em ofensa à Lei de Licitações; e pior: dobraram aquilo que já era absurdamente superfaturado, retirando valiosos recurso da Segurança Pública em benefício de uma única empresa privada, que já recebera milhões do próprio Estado justamente para desenvolver o mesmo sistema”, aponta o MPMS na petição inicial.

Isso porque, segundo o Promotor Adriano Lobo Viana de Resende, outros sistemas no mercado atenderiam a Sejusp. Inclusive, o Estado utilizava outro antes.

No decorrer dos autos, vários contratos de outros estados para sistemas com as mesmas funcionalidades ou até mesmo superior foram anexados. Alguns, acenaram que utilizam até mesmo sistema próprio.