Proibidos de falar português, presos no Japão recorrem às cartas

O brasileiro Diógenes, de 32 anos, está preso há seis anos numa casa de detenção na província de Shizuoka, no Japão. Ele é um dos 476 brasileiros que cumprem penas no país, segundo um levantamento do Itamaraty.  “O grande problema para os estrangeiros presos aqui é o idioma. Quem não sabe nada acaba sendo discriminado”, […]

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O brasileiro Diógenes, de 32 anos, está preso há seis anos numa casa de detenção na província de Shizuoka, no Japão. Ele é um dos 476 brasileiros que cumprem penas no país, segundo um levantamento do Itamaraty. 

“O grande problema para os estrangeiros presos aqui é o idioma. Quem não sabe nada acaba sendo discriminado”, disse. O crime que cometeu ele não contou. Mas afirmou que ainda tem mais dois anos de pena pela frente. “Vou sair da prisão com 34 anos e o que mais me dói é saber que não fui o primeiro e nem serei o último”. 
Diógenes falou com a reportagem da BBC Brasil por meio de carta, único meio de comunicação que os presos têm com o mundo exterior – além das visitas que podem receber de parentes e amigos. Ele conta que, no começo, sofreu muito por não saber direito a língua japonesa. “Fui castigado e fiquei na solitária mais de seis vezes. 
Todas por não ter entendido as regras do lugar. Cheguei a cortar meu pulso num ato de desespero”, afirmou. “Aqui nesse lugar vou ter de ser forte se quiser sair saudável. Vi dois conterrâneos serem transferidos por terem ficado loucos”, disse. Governo brasileiro. 
A maioria dos presos no país, segundo a ministra Luiza Lopes da Silva, do Itamaraty, são jovens envolvidos em furtos e roubos de pequeno valor. “Muitos deles ficaram sem empregos e acabaram se envolvendo com gangues”, afirmou. 
Mas também há casos de homicídio e lesões corporais. Os três consulados brasileiros no arquipélago dão assistência a esses brasileiros presos. Segundo o vice-cônsul do Consulado-Geral do Brasil em Tóquio, Ademir Arruda, não há muitas reclamações por parte dos presos. 
O diplomata afirmou que, no Japão, o detento fica numa cela com no máximo oito pessoas. “Cada um tem sua cama (acolchoado no estilo japonês), seu armário, sua mesinha para refeições e estudos”, afirmou. 
Os detentos são obrigados a trabalhar na maioria dos presídios e recebem um salário mensal. “Eles também aprendem novos ofícios”, afirmou Arruda. Uma das diferenças com o sistema carcerário brasileiro é que, no Japão, não são permitidas as chamadas visitas íntimas. “Não acontece o contato físico entre preso e visitante.” 
Os consulados brasileiros também enviam aos presos livros didáticos e de leitura, revistas e jornais brasileiros. Todo ano, em alguns estabelecimentos prisionais, é aplicado ainda o Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos, conhecido como exame supletivo.
Cartas 
Em muitos presídios do Japão, os detentos estrangeiros são obrigados a frequentar diariamente aulas de japonês. Eles são proibidos de se comunicar no idioma materno e, em alguns lugares, também não podem falar com outros conterrâneos presos. 
Por isto, muitos usam o benefício de escrever cartas para desabafar. Contudo, muitos não têm para quem escrever, seja por terem brigado com parentes ou perdido contato com os amigos. Eles acabam enviando as correspondências para revistas editadas no Japão pela comunidade brasileira que circulam nos presídios.
Para auxiliar os presos solitários, a comunidade brasileira organizou grupos de voluntários para visitar os estabelecimentos prisionais. Um destes grupos é a Comunhão Espírita Cristã Francisco Cândido Xavier, que responde cartas de presos. São cerca de 100 brasileiros condenados que se correspondem com o grupo. 
“Além de desabafar, muitos pedem roupas, material de higiene pessoal, livros e até dinheiro”, afirmou a voluntária Márcia Schmitt, de 45 anos. A brasileira disse que há também casos em que os presos pedem para os voluntários entrarem em contato com os familiares no Brasil. 
“Semana passada ligamos para uma mãe de um jovem preso. Ela ficou muito emocionada, pois já fazia um tempo que não tinha notícias do filho”, disse Schmitt. Ex-viciado André Williams Fujita dos Santos, de 33 anos, já passou por muitos apuros no Japão e hoje usa essa experiência ruim para alertar jovens brasileiros das consequências que o consumo de drogas pode causar. 
Ele foi ao Japão pela primeira vez com 16 anos. Já era viciado em drogas no Brasil e optou por ir morar com a mãe, separada do pai, do outro lado do mundo para fugir das ameaças de morte por causa de dívidas. 
“O crime organizado no Japão facilita o acesso para os usuários, você acaba consumindo drogas cada vez mais pesadas”, disse à BBC Brasil. O dinheiro que ganhava no trabalho de fábrica já não era suficiente para sustentar o vício. 
Começou a furtar moedas das máquinas de refrigerante e também objetos de valor de carros para comprar as drogas. Foi preso. Como era menor de idade, foi parar num reformatório, mas logo foi deportado. “Fiquei três meses preso ainda na Imigração, aguardando o embarque para o Brasil.” De volta à São José dos Campos, em São Paulo, Fujita não deixou o vício. 
Passados dois anos, resolveu que queria largar as drogas e conseguiu voltar ao Japão, onde conheceu sua atual esposa. “Encontrei apoio em uma igreja e, com a ajuda de várias pessoas, consegui largar as drogas”, disse. Livre do vício há doze anos, o brasileiro, hoje pai de três filhos, começou então um trabalho de prevenção com jovens. 
“A comunidade brasileira que mora no Japão não sabe lidar com o problema das drogas. Aqui a maioria das pessoas não sabe o que fazer quando um parente ou um amigo é tragado pelo vício”, afirmou.

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