Será que é? Acredite, mesmo depois do fenômeno da novela “Pantanal” e das guampas de tereré aparecerem com frequência no remake produzido pela TV Globo, a emissora pode ter cometido uma gafe irreparável, considerada até mesmo blasfêmia por defensores da cultura sul-mato-grossense.

Isso porque em “Mar do Sertão”, atual novela das seis do canal (que estreou em agosto de 2022, quando “Pantanal” ainda estava no ar no horário nobre), a cenografia do folhetim colocou o que parece uma guampa de tereré na mesa do escritório do Coronel Tertúlio (José de Abreu).

No entanto, o uso do objeto tipicamente pantaneiro não foi para a tradicional bebida: em “Mar do Sertão”, a possível guampa de tereré está sendo usada como um porta-canetas.

Veja a guampa usada como porta-canetas em "Mar do Sertão" - (Foto: TV Globo/Reprodução)
Veja a guampa usada como porta-canetas em “Mar do Sertão” – (Foto: TV Globo/Reprodução)

Como assim?

É isso mesmo. A novela ambientada no Nordeste, região da qual o tereré não faz parte da cultura, adotou um utensílio muito parecido com o usado em “Pantanal”, que representou Mato Grosso do Sul para o Brasil e o mundo. O problema é que, além de ficar descontextualizada no contexto “sertão nordestino”, onde ninguém toma tereré, a possível guampa se tornou um objeto de escritório meramente decorativo.

“Mar do Sertão” estreou depois que o remake de “Pantanal” destacou tereré para todo o Brasil

Mas qual a encrenca? É que para sul-mato-grossenses ferrenhos à cultura local, usar o apetrecho dessa maneira é uma espécie de blasfêmia. Segundo o dicionário, blasfêmia é uma palavra, expressão ou afirmação que insulta ou ofende o que é considerado digno de respeito ou reverência.

“Pessoalmente, eu acho que tava sobrando do cenário da novela ‘Pantanal’, aí meteram nessa outra e segue o baile. Mas, culturalmente falando, eu acho um absurdo um objeto sagrado da nossa cultura sendo usado de maneira errada”, declara ao Jornal Midiamax o campo-grandense Higor Alexandre, de 29 anos.

"É como comer sushi usando garfo e faca e não com hashi", compara tererézeiro sobre guampa em "Mar do Sertão" - (Foto: TV Globo/Reprodução)
“É como comer sushi usando garfo e faca e não com hashi”, compara tererézeiro sobre guampa em “Mar do Sertão” – (Foto: TV Globo/Reprodução)

Problema com tereré na Bahia

Além de ser tererézeiro raiz e propagador da tradição pantaneira, o morador do bairro Nova Lima passou recentemente por uma experiência desagradável, justamente no Nordeste do Brasil. Em viagem com a família no mês de dezembro, Higor foi impedido de tomar tereré em uma praia da Bahia. Ele precisou explicar a história da bebida para receber autorização.

Desse modo, o sul-mato-grossense comenta o uso da guampa em “Mar do Sertão”. “Está com audiência ruim e resolveram pegar amuletos sagrados da novela Pantanal pra ver ser rende. Até alguns autores tentaram aproveitar para ‘hypar’, mas fracassaram. Os únicos que podem usar a guampa de maneira diferente no MS são os que foram traídos”, pontua.

Mais revolta com guampa em “Mar do Sertão”

Outro tererézeiro raiz e apreciador da cultura pantaneira, Marcos Ermínio, de 35 anos, opina sobre a utilização do típico copo de tereré na novela das seis.

“Usar uma guampa como porta-caneta é blasfêmia. Não vejo essa como uma cultura que não existe no nordeste, já que lá tem até lojas que vendem ervas e utensílios de tereré. Pode não ser habitual, até porque o mundo está globalizado, e o uso da guampa atravessa fronteiras”, pondera o fotógrafo.

“É um utensílio usado para tomar uma bebida considerada Patrimônio Imaterial da Humanidade, e a Globo talvez teve um descuido e não zelou pela cultura e a importância que tem a guampa. No Paraguai, que é o berço do tereré, na Argentina, Uruguai e parte da Bolívia, acredito que todos teriam a mesma opinião de que a guampa é algo sagrado para uma bebida tão cultural”, reflete Ermínio.

Por fim, ele destaca a relevância do assunto. “É necessário falar desse ato, mesmo que possa parecer besteira, até porque até a Unesco reconhece, e as culturas devem ser respeitadas. É como se em uma cena o povo tivesse comento sushi de faca e garfo e não com o hashi. Nem o Google apresenta a guampa com outra forma de uso”, finaliza.

Guampa de “Mar do Sertão”

A cena que evidenciou uma possível guampa de tereré sendo usada como porta-canetas na novela global com temática nordestina foi ao ar na terça-feira (3), em um dos capítulos mais importantes do folhetim assinado por Mário Teixeira.

Tudo começou quando a protagonista Candoca (Isadora Cruz) entrou no escritório do Coronel Tertúlio (José de Abreu) para conversar com ele após o mesmo revelar a Zé Paulino (Sérgio Guizé) e Tertulinho (Renato Góes) que eles são irmãos.

Na sua opinião, guampa como porta-canetas é uma ofensa? - (Foto: TV Globo/Reprodução)
Na sua opinião, guampa como porta-canetas é uma ofensa? – (Foto: TV Globo/Reprodução)

Na mesa do cenário do escritório, a guampa se destacou no enquadramento. Só que esta não foi a primeira vez que o utensílio apareceu dessa maneira em “Mar do Sertão”. Antes disso, nas primeiras semanas, quando “Pantanal” ainda estava super em alta na programação da Globo, a novela exibiu a suposta guampa na mesa de Tertúlio, mas sem tantas canetas.

Em defesa, um leitor pernambucano entrou em contato com o Jornal Midiamax e explicou que no Nordeste é comum o uso de chifres de boi. Não como guampa, mas como porta-coisas, por exemplo. No entanto, até pela profundidade, o objeto mostrado em “Mar do Sertão” realmente parece uma guampa.

Teria sido o utensílio pantaneiro reaproveitado da novela “Pantanal” para a cenografia da atual novela das seis? Na sua opinião, se realmente for uma guampa, usá-la como porta-canetas é um desrespeito à cultura sul-mato-grossense?

Você que conhece a região nordestina, saberia explicar ao certo que objeto é esse na mesa do coronel Tertúlio?

*Matéria editada às 14h57 para acréscimo de informação

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