De MS a São Paulo, moda para corpos gordos ainda é desafio para quem deseja se ‘vestir bem’
Para especialistas, moda para corpos gordos que atende às necessidades do mercado ainda é um obstáculo ao redor do Brasil
Nathália Rabelo –
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Como é o seu processo de compra de uma roupa? Para muitas pessoas, basta entrar no provador, experimentar a peça desejada e levar embora sem muitas dores de cabeça. No entanto, para outra parcela da sociedade, o que deveria ser simples acaba se tornando um grande desafio. Que o termo Plus Size tem crescido na indústria da moda nos últimos anos, isso todo mundo sabe. Mas até que ponto essa moda dita ‘inclusiva’ é, de fato, abrangente para o público que ela se propõe a atender? Segundo especialistas, o mercado de moda para corpos gordos ainda tem muito a aprender.
Para abordar o assunto, o MidiaMAIS foi atrás de profissionais e especialistas que vivem na pele a excludência do mundo fashion por serem pessoas gordas. Foi unânime: para todos os entrevistados, sejam eles de Campo Grande ou São Paulo (polo comercial de moda), encontrar roupas que acompanham as necessidades do mercado ainda é um obstáculo.
Por que falar sobre moda para corpos gordos?
Segundo pesquisa realizada pela Vigitel (Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico), 55,4% da população brasileira está com excesso de peso, ou seja, quando IMC é igual ou maior do que 25. Enquanto isso, 19,8% dos brasileiros estão obesos (IMC igual ou maior que 30). Portanto, visto que uma parcela significativa da sociedade veste manequim acima de 44, significa, então, que a indústria da moda está pronta para atendê-la, certo? Errado.
Segundo consumidores, ainda existe uma grande dificuldade em encontrar roupas que sejam fiéis ao tamanho proposto na etiqueta, que sejam confortáveis e até mesmo bonitas iguais às peças menores. Para eles, entrar numa loja e comprar ‘o que tem’, ao invés do que gostou, é algo comum na rotina de uma pessoa gorda.
Foi justamente isso que motivou o empresário Alex Araújo da Rosa, de 40 anos, a montar uma loja especializada em Plus Size em Campo Grande. Atualmente, ele conta com duas unidades: uma para o público feminino, aberta há sete anos, e outra voltada aos homens. A última abriu há cerca de três meses.
Conforme o empreendedor, as lojas vendem do tamanho G1 ao G6. Desde a criação de ambos os empreendimentos, a procura é constante.
“Tem bastante procura e as pessoas falam ser difícil achar roupa grande. Na maioria das lojas vai até o GG, é um Plus Size que não é Plus Size. Eu tenho clientes fiéis”, disse Alex.
Mercado Plus Size
A Abravest (Associação Brasileira do Vestuário) afirma que o mercado Plus Size cresce 6% anualmente e movimenta cerca de R$ 5 bilhões. Esse percentual corresponde a cerca de 300 lojas físicas e cerca de 60 virtuais. A expectativa, segundo a associação, é de um crescimento de pelo menos 10% ao ano.
Mesmo assim, o designer Breno Donadio Filho afirma que a indústria da moda exclui pessoas gordas. À frente de marca de roupas homônimo especializada em tamanhos grandes, ele afirma ser uma realidade que se expande por todo o Brasil, até mesmo em São Paulo, cidade considerada maior polo comercial de moda do país.
Ele contou ao MidiaMAIS que criou sua empresa a partir de uma reclamação das irmãs.
“Eu sentia de perto essa dor do corpo gordo, não só delas como o meu também. Em ver peças em alguém e não encontrar para o nosso tamanho, querer estar bem-vestido e não conseguir comprar uma peça e sim comprar aquilo que cabia na gente. Então, isso tudo foi o que aconteceu para que eu chegasse a criar a marca Breno Donadio”, recorda.
A sua marca ‘slow fashion’ propõe roupas atemporais, confortáveis, bonitas e modernas no corpo gordo. Peças estruturadas dessa forma possibilitam que um novo público seja incluso na moda, respeitando cada história e curvatura. Para Donadio, essa é uma qualidade que faz falta nas prateleiras.
“O mercado da moda realmente é excludente e isso nós sabemos. Infelizmente ainda não conseguiu entender essas necessidades do corpo gordo. Acham apenas que graduar um modelo, que um corpo magro ‘normal’ usa, e a realidade é outra. Acaba caindo no mesmo erro sempre. O mercado não atende hoje mais do que 5% da demanda. Pensam que fabricar legging e cropped tamanho grande atende essa demanda. Continuam se fazendo peças feias, que não se adéquam ao corpo”, explica.
Moda Plus Size: nada de roupas sóbrias e ‘estampas de vovó’
Apesar de serem a maioria das opções disponíveis no mercado Plus Size, não é isso que os compradores desejam. Segundo Flávia Durante, idealizadora do Pop Plus — maior feira de moda e cultura Plus Size da América Latina — a mulher gorda quer uma moda para diferentes necessidades e estilos.
“Se posicionar é muito importante para nós mostrarmos que é um mercado, uma fatia do público que consome, deseja informação de moda, tendência, qualidade e variedade. E dentro desse próprio mercado, agora nós estamos em busca de uma diversidade maior”, explica a comunicadora ao MidiaMAIS.
Entre terminologias e mudança de pensamentos, muito vem sendo discutido, também, sobre o uso do termo ‘Plus Size’. No entanto, ainda é uma nomenclatura necessária na opinião de Flávia. Adotada há cerca de 12 anos no Brasil, ‘Plus Size’ surgiu para facilitar o acesso de moda para corpos gordos, seja na Internet ou em lojas físicas.
“O Plus Size é um tempo mercadológico do qual eu sou a favor para gente se posicionar como um mercado existente, com uma demanda reprimida. Não é um nicho. É uma população que quase 60% do país está acima do peso, é gorda. E só 25% do varejo atinge ele. Então é uma demanda reprimida, não um nicho”, relata Durante.
Mas afinal, como mudar essa realidade? Como transformar a demanda reprimida em um nicho de mercado? De que forma colocar em pauta a moda para corpos gordos? Para os especialistas, uma das medidas é conscientizar as universidades que propõem o ensino de moda e formam, todos os anos, novos profissionais.
Ensino de moda nas universidades
Para Donadio, muitas universidades não estão preparadas para produzir roupas destinadas a corpos diferentes, que fogem do padrão ‘magro’. Ainda existe muita padronização nos modelos estruturais das coleções e, normalmente, a moda para corpos gordos não está inclusa nessa movimentação mercadológica.
“O universo gordo é uma ideia plural. Os corpos são diversos e temos que nos adequar a essa realidade corpórea, com moldes que atendam essa diversidade que temos no Brasil. Com certeza os cursos de moda precisam acabar com essa romantização de que moda é para corpos ditos corretos. Existe um mercado real aqui fora”, informa o designer.
Flávia Durante concorda e complementa que a moda ainda é uma indústria gordofóbica. Segundo a comunicadora, o ensino ainda está muito concretizado na ideia de que corpo gordo não pertence à moda. Mas ela é otimista e acredita ser uma realidade em constante mudança.
“A gente trabalha muito para que no futuro isso não precise mais acontecer, para que todas as marcas tenham desde o PP até o extra XG. Isso vai ser um longo processo que precisa mudar toda a gordofobia estrutural da moda, no ensino de moda, na indústria”, conclui a especialista.
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