Com Delinha embaixadora, é preciso discutir situação dos artistas da ‘velha guarda’

Muitos permanecem sem aposentadoria ou recursos

Ouvir Notícia Pausar Notícia
Compartilhar

Muitos permanecem sem aposentadoria ou recursos

 

As mãos ficam um pouco trêmulas, mas a voz continua firme e ecoando como sempre. Nesta segunda-feira (14), a cantora Delinha foi empossada oficialmente como “Embaixadora da Cultura” em evento realizado pela Prefeitura de Campo Grande e Fundac (Fundação Municipal de Cultura), no Buffet Murano. Dentro do projeto de lei dos vereadores Eduardo Romero e Vanderley Cabeludo, aprovado na íntegra este ano, está prevista uma remuneração, ainda não definida, para a cantora. 

Nada mais justo por seus serviços prestados em divulgar a cultura do Estado e por seu legado musical. Mas a situação é pontual, já que outros artistas da “Velha Guarda” permanecem sem aposentadoria nem sem um local adequado caso passem necessidades. Helena Meirelles era a “guitar player” do Pantanal, mas faleceu sem previdência. Jorapimo, artista plástico de Corumbá, representou nossa vida em linhas suaves e sua obra é apreciada até hoje, e também ficou sem a segurança no fim da vida. Porém, a questão esbarra do fato de que a contribuição previdenciária para o artista é facultativa, já que ele é um prestador de serviços. 

“O que a Fundac pode fazer é contratar e fomentar as atividades dos artistas para que eles possam ter espaço para trabalhar, mas realmente, não há nenhum projeto ou programa na velhice, devido a uma falha de nível nacional”, explica o diretor-presidente da Fundac Wilton Edgar. Porém, hoje, não existem programas de incentivo à contribuição ou que frisem a importância da mesma, nem um recanto para artistas idosos ou programas assistenciais para o segmento. Se o artista não puder mais tocar e não tiver recolhido seu INSS ao longo da vida, ele ficará à míngua.  

Helena Meirelles foi um dos ícones da nossa cultura que terminou a vida sem previdência ou assistência do poder público / Foto: Divulgação

 

Contribuição é facultativa

A questão vai além da esfera do artista como detentor de sua obra baseada em seu talento e habilidades, e alcança a esfera trabalhista. Segundo o presidente do Simatec-MS (Sindicato dos Músicos, Autores e Técnicos de Mato Grosso do Sul), Béko Santanegra, a questão da aposentadoria tem a ver também com qualidade de vida. “O artista para se aposentar precisa ter um plano de INSS e o Sindicato é justamente para isso. Temos feito palestras, campanhas educativas, mas ninguém se aposenta sem se inscrever em um plano. A Delinha mesmo não tem plano de aposentadoria”, pontua. 

Durante vários anos, Béko tem sido um dos músicos que se mobiliza para colaborar o blueseiro Zé Pretim, que tem necessitado de ajuda ao longo dos anos. “Artista não vive só de aplauso. Precisa pagar conta de água, luz, telefone, precisa de transporte. O que acho que falta é o poder público se importar mais com a saúde dos artistas, porque não cria um plano de saúde para o segmento?”, questiona. 

Segundo o músico João Paulo, filho de Delinha, é preciso dar atenção aos músicos idosos. “O artista, chega uma época, que até fisicamente não aguenta mais se apresentar. A Delinha ainda está bem e cantando, mas os artistas da velha guarda, que tanto fizeram pelo nosso Estado, precisam de um apoio”, enfatiza. Para ele, o projeto dado a Delinha abre um precedente para esse apoio. “É o primeiro passo para evidenciar esse artista mais antigo”, reflete. 

Recanto para os artistas

No início do ano, o deputado estadual Lidio Lopes (PEN) apresentou na Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul, projeto de Lei para conceder pensão especial de quatro salários mínimos à Delinha. O beneficio seria pago pela Ageprev (Agência de Previdência Social de Mato Grosso do Sul), porém o projeto não passou adiante. Segundo o vereador Eduardo Romero, que propôs o projeto que contemplou Delinha como embaixadora, a questão esbarra no modo de recolhimento de aposentadoria e do artista como um prestador de serviço.

O que o poder público pode fazer, para ele, é tentar colaborar de outras formas. “O município pode até criar algo como um recanto para os artistas antigos, que podem ter moradia, alimentação, mas a questão previdenciária ultrapassa isso. Acredito que ela precise mudar, mas o artista também precisa entender que ele é um microempreendedor. Estamos pedindo ao prefeito que pense com a Fundac um espaço físico para esses artistas que estão em condições de idade avançada”, explica.

Para o presidente da Fundac, essa contribuição poderia ser realizada, mas precisaria de uma mobilização da sociedade em conjunto com os próprios artistas. “Vejo isso como uma ação importante e não temos nenhuma atividade nesse sentido. A fundação é para isso, para dar também proteção ao artistas, mas precisaríamos criar fonte de recursos contando com ação dos órgãos legislativos e executivos”, enfatiza Wilton. 

Conteúdos relacionados

sexta feira 13
cidade do natal familia de renas