Maria Bethânia comemora carreira com muito trabalho e sem arrependimentos

Maria Bethânia completa 50 anos de carreira com shows em SP

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Maria Bethânia completa 50 anos de carreira com shows em SP

“Tem que ser mulher! Dá trabalho fazer 50 anos”, bradou Maria Bethânia ao ser ovacionada no final da primeira apresentação de “Abraçar e Agradecer” que fez em São Paulo, na noite de sábado (14), no HSBC Brasil. A cantora, que comemora com a turnê (iniciada no Rio em 11 de janeiro e, em seguida com show em Brasília, no dia 06 de março) cinco décadas na estrada, presenteou seu público com um show tão espontâneo quanto bem planejado.

“Agradeço aos amigos que gostam de mim. Apesar de mim”, declamou ela logo de início. Acompanhada da banda formada por Jorge Helder (regência e contrabaixo), Túlio Mourão (piano e acordeom), Paulo Dafilim (violas e violão), Pedro Franco (violão, bandolim e guitarra), Marcio Mallard (cello). Pantico Rocha (bateria) e Marcelo Costa (percussão), Bethânia mostrou vigor e se movimentou com força e delicadeza por um repertório que variou do ‘universo exterior’, no primeiro ato, ao ‘universo interior’, no segundo.

Uma viagem pelas canções que escreveram sua carreira, iniciada oficialmente em 13 de fevereiro de 1965, quando substituiu Nara Leão no espetáculo Opinião, no Rio, com direção de Augusto Boal. Desde então, e de sua interpretação lendária de“Carcará“, que a tornou famosa em todo o País, muitos foram os espetáculos. Nesta história, que ela relembra, abraça e agradece, não há espaço para saudosismo. Ela revisita seu passado, mas finca os pés descalços no presente e mira o futuro.

Vestindo dourado no primeiro ato de um show milimetricamente dirigido por Bia Lessa (direção e cenografia) e por Guto Graça Mello (direção musical), ela abriu com “Eterno em Mim” (Caetano Veloso, 1996) e seguiu com “Dona do Dom” (Chico César, 2001) para, então, cantar pela primeira vez “Gitâ” (Raul Seixas e Paulo Coelho, 1974) em versão integral.  Como se ouvíssemos uma biografia musical, cada canção que sucede a outra conta um pouco da vida, dos trabalhos, dos amores, paixões, acertos, desvios, retornos, deuses e orixás desta mulher que “tem mais coragem do que homem” e que completa 70 anos em junho.

No roteiro do show idealizado pela própria Bethânia, praticamente não há pausa entre uma música e outra; e os acordes mudam também com a mesma rapidez. Vez ou outra, como já é tradição, ela declama textos de Clarice Lispector, Waly Salomão, Fernando Pessoa, e até mesmo de sua autoria. Estes, assim como as canções, dizem muito sobre ela.

Enquanto alternava clássicos como “Tatuagem” (Chico Buarque, 1973) e “Dindi” (Tom Jobim Aolysio de Oliveira, 1959) com composições novas, como “Vóoz de Mágoa” (Dori Caymmi e Paulo César Pinheiro, 2015) e “Silêncio” (Flávia Wenceslau, 2015), sobre cada um dos músicos havia apenas uma luminária de acrílico. Sobre Bethânia e o palco, feixes de luz ora coloridos ora brancos, criavam tanto uma noção espacial quanto uma atmosfera propícia a cada música.

Chão de LED e de estrelas
Além da iluminação de Binho Schaefer, outro recurso cenográfico acertado foram os telões  de LED sob o palco, em que imagens de águas claras, cenas bucólicas, entre outras, criavam um imaginário para as canções. Para os que viram o show do alto, as imagens  dos telões também eram exibidas sob os pés de Bethânia, criando, no chão de LED, ora um tapete de rosas, ora um mar agitado, um céu cheio de nuvens ou de estrelas. Era este universo de Bethânia que se completava com o figurino criado por Gilda Midani (que também a vestiu em outras turnês e no show que fez em Santo Amaro da Purificação, em fevereiro). 

A propósito, a saia, a blusa e o colete dourados que ela vestiu no primeiro ato evocam as cores de Oxum, que cantou em “Oração de Mãe Menininha” (Dorival Caymmi, 1972), no início do segundo ato. Para a segunda metade de um show longo, com 37 canções, voltou ao palco de dourado e vermelho, a cor de Iansã, a quem ela homenageou em “Vento de lá” (Roque Ferreira, 2007).

Depois de seu passeio pelo interior, foi com “Motriz” (Caetano Veloso, 1983) que ela celebrou sua força e entoou as palavras de Clarice Lispector: “Faça com que eu saiba ficar com o nada e mesmo assim me sentir como se estivesse plena de tudo.”

Por fim, depois da inédita “Eu te Desejo Amor” (versão de Nelson Motta para “Que reste-t-il de nos amours”, de Charles  Trene”t), admite, entoando Fernando Pessoa: “Sou eu, eu mesmo. Quanto fui, quanto não fui, tudo isso sou.”  E encerra, sem arrependimentos, entoando “Non, Je ne Regrette Rien” (Charles Dumont e Michael Vaucair, 1935) e, em seguida, pede “Silêncio”, “pra me lembrar de tanta coisa que sonhei”. E sob os acordes da vinheta de “Carcará”, um presente dos músicos para ela, gesticulou: “Pega, mata e come!”

Esfuziante, a plateia pediu bis, mas Bethânia disse que não havia preparado nada. E emendou os primeiros versos de “O Que é, o Que é?” (Gonzaguinha). “Esta música eu vou cantar em minha vida, enquanto eu cantar, eu vou cantá-la. Gonzaguinha!  Viver… Cantar e cantar a beleza de ser um eterno aprendiz”, arrancando arrepios até dos mais céticos da plateia. “É a vida. É bonita.”

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