24 horas em Pedro Juan Caballero: o relato de quem jamais esteve na fronteira
A descoberta de um novo mundo atrás do Shopping China
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A descoberta de um novo mundo atrás do Shopping China
Nascido e criado no nordeste do Brasil, a única fronteira com a qual convivi foi o oceano atlântico, digamos assim. Tudo que se relaciona a limites, divisas e fronteiras muito me interessa. No entanto, por mais incrível que pareça, moro em Campo Grande há oito anos e nunca me ocorrera de viajar ao Paraguai, mais precisamente a Pedro Juan Caballero, cidade distante cerca de 340 km da Capital – fronteira seca com Ponta Porã. Cheguei a consumir bastante os produtos importados vindos diretamente de lá, sob encomenda: celulares, perfumes, roupas, eletrônicos em geral. Mas, nunca imaginei que atravessar uma simples rodovia fosse o suficiente para adentrar em um novo mundo. Foi a minha grande descoberta.
Esta é a primeira matéria de uma pequena série especial sobre uma breve visita a Pedro Juan Caballero, que ocorreu no fim de novembro deste ano. Ao todo, a viagem durou pouco mais de 24h, se contar o tempo que estive, também, em Ponta Porã. Se sou ‘estrangeiro’ em Campo Grande, imagine só no Paraguai, onde deparei-me com um mundo de diferenças, das quais apenas ouvia falar – algo do tipo ‘Paraguai, paraíso dos importados e dos fugitivos da lei’. Claro, não é bem assim. Mas, algumas impressões ficaram, para bem ou para mal.
É certo que em 24h muito pouco se aprende sobre uma localidade. Mas os campo-grandenses, em geral, passam menos tempo que isso na cidade e limitam-se apenas às lojas de importados – o turismo brasileiro em Pedro Juan Caballero está limitado às compras e até as hospedagens costumam ser no Brasil. Logo, pouco conhecem sobre lá, talvez nem mesmo o básico. Nas minhas andanças, a ideia era cumprir o desafio de fazer uma espécie de etnografia, uma leitura do que está oculto por trás do Shopping China e dos outros varejistas com grande procura.
Saindo de Campo Grande
Cerca de 6h da manhã de uma quinta-feira, a van partiu de Campo Grande rumo à fronteira. No caminho, uma parada em Sidrolândia para tomar café. Mais três horas de estrada, em qualidade razoável, e estava frente a frente ao muro imaginário que separa o Brasil do Paraguai. De longe, avistei na enorme avenida a flâmula paraguaia tremulando, ao lado da brasileira. O contraste é bonito e o que me veio à cabeça no momento foi sobre o que fazer para deixar metade do corpo no Brasil e a outra no Paraguai. Quem nunca pensou nisso?
A primeira parada foi o Shopping China, a meca do consumo de importados, que dispensa apresentações. Enorme, gigante, suntuoso. Ao entrar, uma recepcionista paraguaia, muito bonita e maquiada, pedia para lacrar sacolas. E uma vez dentro da loja, o que restava era explorar as centenas (milhares?) de gôndolas com produtos dos quatro cantos do mundo e de repente encontrar algo que ‘coubesse’ na minha carteira.
Diziam-me que a loja causava frisson e esta é a mais pura verdade. O mundo inteiro (ou o que a cota internacional permitir) a seu dispor a menos de 400 km. Porém, a loja estava vazia, tal qual um supermercado que abre de madrugada. Os caixas praticamente não tinham filas e os clientes trocaram os carrinhos pelas cestas de mão. “O dólar está alto, mas isso aqui vivia cheio”, explicou-me a paraguaia Rosa Martinez, expositora, em português excelente.
Praticamente todos os funcionários da loja são paraguaios e falam muito bem o idioma português, assim como a esmagadora maioria dos pedrojuaninos. Por outro lado, são raros os brasileiros de Ponta Porã que falam o espanhol ou o guarani, as línguas oficiais do país vizinho. Resolvem-se no portunhol ou no português, mesmo.
O preço das mercadorias importadas, mesmo com o dólar na casa dos quatro reais, ainda me pareceu atrativo, levando em conta que as taxas de importação no Brasil são absurdas. Mesmo assim, a loja tinha poucos brasileiros, menos de cem, arrisco dizer. A alta do dólar afugentou os clientes e tanto Pedro Juan como Ponta Porã saem prejudicadas com a sazonalidade da moeda americana.
A propósito, saí do Shopping China com duas cuecas Calvin Klein a U$ 15, cerca de R$ 60, cada, e uma barra de chocolate belga a U$ 6, cerca de R$ 24. Achei excelente negócio.
Turismo reinventado
Superar a barreira do dólar sazonal é uma meta das cidades fronteiriças que atualmente lucram do turismo de compras, como em Foz do Iguaçu, no Paraná, também fronteira com o Paraguai. É preciso explorar as potencialidades e propor uma nova visão sobre a localidade, mas, no caso de Ponta Porã e Pedro Juan Caballero, há muito trabalho a se fazer. É preciso desconstruir o clima de insegurança e impunidade retratado nos jornais brasileiros, que inibem, por exemplo, que brasileiros adentrem a cidade.
“Você acha que um traficante que é preso pela Polícia Federal saindo de Ponta Porã é um grande traficante?”, indaga-me Walkíria Capusso, ex-coordenadora da Câmara Empresarial de Turismo de Mato Grosso do Sul. “É claro que não. O traficante explora a pessoa em vulnerabilidade. Então, para transformar esta realidade, precisamos proporcionar oportunidades para brasileiros e paraguaios, desenvolver a região, gerar emprego e renda, para além do turismo de compras”, responde.
Walkíria refere-se ao PTin (Parque Tecnológico Internacional) de Ponta Porã, idealizado em 2011 e implantado efetivamente em maio deste ano. A ideia do projeto é justamente proporcionar o desenvolvimento econômico, social e cultural da região da faixa de fronteira, por meio de pesquisas e da tecnologia. Walkíria, que também preside a entidade, explica as ações a serem feitas. “Com a parceria das entidades, como a Fecomércio-MS (Federação do Comércio de MS), da Fiems (Federação da Indústria de MS), Sebrae, das universidades e de outros órgãos, vamos desenvolver projetos que gerem emprego e renda na região, inclusive no setor hoteleiro, mas de forma que a região não permaneça refém das compras. Aqui há muito a se explorar”, destaca.
De fato, por mais que o passaporte não saia carimbado, estar em Pedro Juan Caballero é inegavelmente estar em outro país, é a oportunidade de experimentar outra cultura – o ingrediente que mais atrai viajantes mundo a fora. Nas horas seguintes, descobri um pouco mais da cidade, conheci a simpatia e a gentileza do povo paraguaio, vivi um pouco da noite pedrojuanina e deparei-me até com um paraíso do ecoturismo a poucos quilômetros do centro da cidade – surpresas a cada piscar de olhos.
Confira nesta sexta-feira a segunda parte da série.
O repórter viajou a convite da Fecomércio-MS
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