‘Venci a doença’, diz paciente que tatuou os mamilos após mastectomia
Quando o assunto é câncer de mama, muito se fala sobre a importância do diagnóstico precoce, do autoexame e acompanhamento ginecológico regular. No entanto, pouco se discute sobre como as mulheres se reconstroem e superam o trauma após o fim do tratamento. Além das sessões de quimioterapia que enfraquecem o corpo, a retirada das mamas […]
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Quando o assunto é câncer de mama, muito se fala sobre a importância do diagnóstico precoce, do autoexame e acompanhamento ginecológico regular. No entanto, pouco se discute sobre como as mulheres se reconstroem e superam o trauma após o fim do tratamento.
Além das sessões de quimioterapia que enfraquecem o corpo, a retirada das mamas e as sucessivas cirurgias para a reconstrução dos seios são um fator devastador para o psicológico da grande maioria das pacientes. “A mama é o símbolo da mulher, e essa situação provoca uma depressão razoável”, afirma o cirurgião Dr. Wanderberg Barbosa, especialista também em oncoplástica mamária.
Segundo dados do Instituto Nacional de Câncer (INCA), 57.130 novos pacientes serão diagnosticados com câncer de mama em 2014 no Brasil, o que significa que, a cada 100 mil mulheres, 56 poderão enfrentar a doença, a maioria delas na região Sudeste.
Há quase cinco anos, a empresária Claudia Maia foi incluída nesta estatística. Aos 32 anos e mãe de Rafael, que tinha 1 ano e 4 meses na época, ela descobriu a doença em exames de rotina e iniciou o tratamento: passou por oito meses de quimioterapia, sessões de radioterapia, além de quatro cirurgias, entre elas uma mastectomia dupla, até completar a reconstrução dos seios. “Todo esse processo é muito forte, é muito baque, é muita perda o tempo inteiro: perda da mama, da feminilidade, do cabelo, da disposição. Você se sente muito frágil”, disse.
Apesar de ter reconstruído quase a totalidade das mamas, ainda não se sentia curada: “me olhava no espelho e sentia falta de algo”. A forma encontrada para recuperar a autoestima e a feminilidade foi sugerida pelo médico: fazer uma tatuagem no lugar dos mamilos e aréolas. “Para mim, a tatuagem foi uma forma de completar esse processo, era a última etapa para eu falar ‘me reconstruí, estou forte de novo’”.
A busca pelo tatuador
A prática ainda é pouco conhecida, realizada por alguns tatuadores no mundo e quase nada difundida entre profissionais da saúde. Claudia já tinha ouvido falar do assunto nos corredores de hospitais, mas sem nenhuma referência: foi na internet que ela encontrou Paulão. Artista há 30 anos, um dos primeiros tatuadores do País, ele aprimorou sua técnica em vários lugares do mundo e tem entre seus clientes uma vasta lista de pesonalidades como o vice-presidente Michel Temer, Dudu Braga (o filho cego do cantor Roberto Carlos) e a mãe de Chiquinho Scarpa. Apesar disso, ele se orgulha mesmo de ter tatuado os lábios de uma menina de 15 anos, que veio de Mato Grosso após nascer sem o desenho por uma doença.
Claudia marcou um horário para fazer a tatuagem, mesmo sem informação de como ficaria o resultado. “Eu sempre fui meio nerdzinha, tinha medo, insegurança e achei que quando chegasse aqui iriam me olhar de jeito diferente, mas o atendimento foi ótimo e me deu segurança”.
Paulão fez a primeira tatuagem deste tipo há 10 anos, depois de ser procurado por médicos. Ele explica que chama o procedimento de reparador porque os médicos reconstroem os seios e só um tatuador com a habilidade de combinar pigmentos é capaz de desenhar a aréola e o mamilo da cor mais adequada e com efeito 3D.
Em um ambiente organizado composto por loja e café, além de uma sala grande de tatuagens que conta com assepsia cirúrgica, ele atende pessoalmente todos os clientes. É direto, de voz segura e firme, bem-humorado. Principalmente, é preparado para ouvir as histórias dos clientes e lidar da melhor maneira com elas. “Toda tatuagem tem uma história. Eu trato estas mulheres como uma cliente normal, vejo como um tipo de tatuagem, estou ali fazendo a reparação de um dano”, explica o tatuador. Apesar de estas tatuagens reparadoras – que também são usadas para cobrir cicatrizes e redesenhar sobrancelhas – serem a “parte mais gratificante” do trabalho, ele encara como um processo do uso da técnica para atingir um objetivo.
Tirando o constrangimento
No entanto, para quem está do outro lado, o momento é de uma revolução psicológica. É uma mudança drástica da forma de encarar a vida e a doença.
Claudia, que fez a tatuagem em 2011 acompanhada da mãe, compara o resultado a um dos momentos mais importantes que já viveu. “Dá pra eu comparar a quando meu filho nasceu: foi um daqueles momentos muito significativos da vida, em que me lembro de detalhes, de cheiros, da importância de tudo”, emociona-se.
A vontade de sair dali “curada” era tão grande e as esperanças depositadas tão intensas que, mesmo com a pele mais sensível por causa das sessões de radioterapia, Claudia não se lembra muito de como tudo aconteceu. “Muita gente me pergunta se doeu, mas eu não sei, eu não estava lá. Eu estava em outro lugar e, quando terminou, eu me olhei no espelho e desabei a chorar”. O tatuador explica que não doeu mesmo, pois o processo, que durou cerca de uma hora, é feito com agulhas muito modernas e funciona quase como uma esfoliação.
Segundo Paulão, o choro é a reação mais comum entre as clientes, que chegam geralmente sem medo, mas ansiosas e preparadas para saírem dali de uma forma muito diferente daquela que entraram: elas não ficam envergonhadas de mostrar os seios a quase um desconhecido. “Na verdade, constrangida é a última coisa que elas ficam aqui. Este é um momento em que você está tirando o constrangimento delas, porque elas já estão constrangidas faz tempo, isso”.
Foi o constrangimento dos anos da doença que Claudia deixou para trás com a tatuagem. Casada há mais de 10 anos, ela não se sentia à vontade com o marido, não por ele, mas por si mesma. A intimidade que se perdeu com o tempo foi recuperada com o desenho. “Meu marido foi maravilhoso, mas eu não me sentia à vontade de me mostrar para ele. Na hora de namorar, era sempre camiseta, um topzinho. Quando fiz a tatuagem, falei ‘vem cá’. Voltou a intimidade”.
Reconstruir para curar
O processo de reconstrução da mama é tão importante no tratamento do câncer desta área que alguns médicos, baseados em observações clínicas, afirmam que o bem-estar psicológico que traz é grande parte responsável pela recuperação total das pacientes. Se para algumas delas, como Claudia, a reconstrução foi feita por etapas, em outros casos, em que é possível começar a reconstrução logo na cirurgia de retirada, a melhora é significativa.
“As pacientes tiravam a mama e ficavam mutiladas por um, dois anos porque diziam que a doença podia reincidir, mas observamos que quando a paciente reconstrói imediatamente ela passa a raciocinar como se tivesse feito plástica: ela continua a radioterapia e todo o tratamento, mas com outra cabeça”, explica o Dr. Wanderberg. Diante destas possibilidades, os médicos observam os casos separadamente e indicam sempre a melhor opção para a paciente, já que não existe uma regra.
A tatuagem trabalha tão profundamente o lado psicológico das pacientes que nem sequer é considerada como um desenho grudado para sempre no corpo. “Quando me perguntam se tenho tatuagem, digo que tenho minha borboleta com nome do marido e do filho nas costas. O mamilo não é tatuagem, é ele reconstruído, é parte de mim”, conta Claudia.
Muitos médicos têm ressalvas quanto à tatuagem de mamilo, mas, segundo o Dr. Wanderberg, com todas as exigências sanitárias e com um profissional adequado e de confiança, é mais uma ótima possibilidade de melhorar a qualidade de vida destas mulheres. “Muitos médicos desconhecem a técnica e estão acostumados a fazer sempre algum outro tipo”. Ele explica que é possível fazer a reconstrução de aréolas e mamilos em cirurgia com enxerto de pele retirada da virilha ou de mucosas. No entanto, o grande obstáculo é garantir a pigmentação adequada, parte muito difícil em um consultório.
“A tatuagem é um desenho e acabou, mas é um desenho que psicologicamente me transformou, foi o ponto final do meu fortalecimento, é uma medalha. Hoje, se ele me falasse que custa um milhão de dólares, eu ia atrás e tentava fazer porque é uma mudança de vida”, diz Claudia, que ainda não teve alta médica, mas continua tomando medicamentos para controlar a doença.
Os preços da tatuagem variam muito, dependendo de qual parte exatamente precisa ser pigmentada, mas, em média, custa entre R$ 500 e R$ 1 mil.
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