Produtores reclamam de abandono do assentamento São Gabriel
Um assentamento que tinha tudo para ser modelo na gestão da reforma agrária em Mato Grosso do Sul enfrenta hoje – quase uma década após a decisão de sua implantação – sérios problemas estruturais que inviabilizam a procurar uma situação que lhes garanta condição melhor de vida. As terras classificadas como “filé mignon” pelo Incra […]
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Um assentamento que tinha tudo para ser modelo na gestão da reforma agrária em Mato Grosso do Sul enfrenta hoje – quase uma década após a decisão de sua implantação – sérios problemas estruturais que inviabilizam a procurar uma situação que lhes garanta condição melhor de vida.
As terras classificadas como “filé mignon” pelo Incra em 2005 – quando audiência pública definiu pela compra da Fazenda São Gabriel – pouco produzem porque não há como irrigá-las. A água não chega aos lotes dos parceleiros. As benfeitorias existentes na propriedade, à época da compra pelo Governo Federal, estão se deteriorando gradativamente. A infraestrutura da sede, uma das justificativas para o preço de aquisição na faixa dos R$ 20 milhões, está abandonada.
A antiga Fazenda São Gabriel, que era de propriedade do pecuarista José Carlos Bumlai, fica em “uma faixa enxuta, em que o solo é fértil, com vocação tanto para pecuária quanto para agricultura, apta para abrigar um assentamento”, destacou o órgão em 2006, quando realizava a demarcação da área de 4.683 hectares na região do Maciço do Urucum.
As instalações onde funcionaram um escritório do Incra, uma escola e o refeitório dentro da sede – logo no começo da ocupação legal da área pelas famílias assentadas -, hoje estão abandonadas. No local, onde o Incra manteve uma representação, só restou a plaquinha na porta. Numa outra dependência, somente dois quadros negros e algumas letras pregadas na parede lembram que o espaço algum dia foi usado para ensinar os filhos dos parceleiros. Para muitos assentados a sede é o retrato do próprio assentamento.
Representantes da Associação de Produtores e Produtoras Rainha do Lar Assentamento São Gabriel, cobraram maior presença do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). “Gostaríamos que o superintendente viesse aqui, se reunisse com a comunidade. Queremos o Incra aqui, foram eles que colocaram a gente na terra e são responsáveis por nós. Precisam ter um pouco de atenção conosco, fazer uma reunião com a gente. O Incra tem que vir e nos apoiar”, disse Vera Batista, presidente da Associação.
Numa possível visita do superintendente regional do Incra, as famílias vão propor que o órgão estabeleça convênios para permitir que a sede volte a ser usada. “Pedimos para o Incra fazer uma parceria com a Prefeitura para passar documento da área da sede ao município para fazer escola e posto de saúde. Nossas crianças saem daqui para estudar no Urucum; em Albuquerque ou no Mato Grande [que também são assentamentos rurais]”, sugeriu Vera. A presidente da Associação cede a casa para que médico e dentista atendam os moradores.
“O posto de saúde no ano passado foi queimado. Coloquei minha casa à disposição para o atendimento, temos dentista e médico que vem quarta-feira. Mas não é um local adequado, precisamos de posto de saúde. O posto depende de passar o documento para a Prefeitura poder fazer. É só quem comanda o Incra pensar um pouco na nossa situação”, completou a líder da Associação Rainha do Lar.
Famílias enfrentam cotidiano sofrido
A vida das quase 300 famílias do assentamento São Gabriel não é nada fácil. A água que chega aos lotes é salobra; um caminhão-pipa cobra para levar água potável aos reservatórios; o solo não tem como irrigar, o que barra a produção. A alternativa para sobreviver é buscar outra forma de sustento. No que se refere a água, um poço bombeia o liquido para um reservatório localizado às margens da BR-262. De lá a agua é distribuída aos lotes num processo que necessita de energia. Só que o chamado “poço” enfrenta problemas no transformador que faz a alimentação elétrica.
Como a água salobra é imprópria para beber, por ter grande quantidade de substâncias dissolvidas, os moradores improvisam uma forma de captação. Quando chove, postam baldes e bacias para aparar o máximo de água possível.
“Eu planto mandioca e milho. Tô com a roça gradeada, mas não tem dinheiro para semente e falta água para a horta. Tá lá meu solo, não dá pra plantar. É duro. Para sobreviver trabalho para outras pessoas. Quando a pesca tá aberta vou lá pro rio”, disse ao Diário o produtor Aparecido Eugênio. “A pessoa tem que sair para ganhar o sustento da casa. O Incra vem e diz que não pode sair do lote. Como não vai sair do lote se não tem como sustentar, se não dão apoio, não dá pra viver”, argumentou Comerino Tavares.
De acordo com a presidente da Associação de Produtores e Produtoras Rainha do Lar Assentamento São Gabriel, um caminhão-pipa cobra para abastecer as caixas d’água. “Quando cai a agua não há problema, agora que não tem, o caminhão não atende a gente. Esse caminhão é contratado pelo Incra e cobra R$ 20 para colocar água nos lotes. Como vamos pagar caminhão para colocar água para nós? Vinte reais é 500 litros. O Incra deveria olhar com atenção e carinho para cá, por que não há condições de ficar sem água”, disse Vera Batista. Ela destacou que os assentados recebem apoio do Centro de Referência da Assistência Social (CRAS-Rural), que é mantido pelo Município.
“Para viver aqui cada um se vira do seu jeito, quem é aposentado tem um pouco que ajuda no dia a dia. Marido e mulher têm que sair para a cidade para fazer uma diária, porque da terra não tiramos nada, praticamente nada. Quem não tem condição passa necessidade e tem gente abandonando lote. Falta assistência para a gente. Nossa vida está difícil, estamos jogados aqui, esquecidos, não temos ajuda de nada. O único auxílio que vem aqui é o CRAS mesmo”, afirmou Leda Martins de Moraes, moradora do São Gabriel e 1ª secretária da Associação de Produtores e Produtoras Rainha do Lar.
Outro lado
A assessoria de comunicação do órgão informou que “logo após o carnaval, uma grande equipe do Incra vai se instalar na unidade avançada de Corumbá para resolver todas as pendências”.
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