Polêmica ameaça projeto de ferro na Bolívia

Um plano ambicioso para desenvolver uma jazida de minério de ferro que se estende pela Bolívia e o Brasil enterrou-se em brigas entre o governo populista da Bolívia e a empresa indiana Jindal Steel & Power, destacando os desafios diante do modelo socialista do presidente Evo Morales e o impacto da queda dos preços mundiais […]

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Um plano ambicioso para desenvolver uma jazida de minério de ferro que se estende pela Bolívia e o Brasil enterrou-se em brigas entre o governo populista da Bolívia e a empresa indiana Jindal Steel & Power, destacando os desafios diante do modelo socialista do presidente Evo Morales e o impacto da queda dos preços mundiais do ferro.

Morales concedeu o contrato de US$ 2,1 bilhões para a Jindal em 2007, depois de empurrar uma lei especial no Congresso, a qual deu ao governo participação de 50% numa joint venture para construir um parque industrial de cerca de 5.000 hectares na reserva mineral de El Mutún. A estimativa é de que a reserva contenha 40 bilhões de toneladas de minério de ferro, sendo considerada uma das maiores do mundo.

Durante anos, o governo de Morales mostrou-se ansioso para exibir o projeto como uma evidência de que as empresas multinacionais podem trabalhar em parcerias de igual para igual com seu governo, e como um exemplo da cooperação “do sul com o sul” defendida pela esquerda latino-americana.

Mas, cinco anos depois, a mina continua sendo pouco mais de uma pedreira numa montanha imersa na floresta. O local processou menos de um milhão de toneladas de minerais. A Mutún Steel Corp, a empresa estatal criada para administrar o projeto, teve três presidentes desde 2007.

O governo acusa a empresa indiana de investir apenas US$ 12 milhões dos US$ 600 milhões que ela deveria ter investido durante os primeiros cinco anos do projeto. Os executivos da Jindal dizem que a empresa investiu entre US$ 70 milhões e US$ 100 milhões até agora. As autoridades locais temem que o colapso do projeto possa destruir a frágil economia local de Puerto Suarez, onde a Mutún está situada.

A Jindal, por sua vez, reclama que o governo negligenciou o fornecimento de energia e de outras infraestruturas necessárias para o avanço do projeto. A disputa foi para a arbitragem internacional no ano passado, depois que a Bolívia tomou posse de uma garantia de US$ 18 milhões depositada pela Jindal no Banco Union da Bolívia. A Jindal entrou com uma apelação contra a medida no tribunal mercantil internacional de Paris.

Se a Jindal e as autoridades bolivianas não conseguirem resolver suas diferenças, o conflito pode aumentar, de acordo com especialistas jurídicos.

A Jindal diz que precisa de 10 milhões de metros cúbicos de gás natural por dia para alimentar uma planta de ferro esponja que a Jindal encomendou à Midrex Technologies, da Kobe Steel Ltd., e de uma usina de 725 megawatts que seria construída pela alemã Siemens AG.

Mas isso é equivalente ao consumo de energia do país inteiro, disse Sergio Alandia, presidente da Mutún Steel Corp. “A Jindal não obteve a minha assinatura para o gás porque não forneceu documentação suficiente para justificar esse volume”, disse ele após uma tensa reunião com os executivos da Jindal, há pouco tempo.

Os executivos da Jindal dizem que a Bolívia simplesmente não está acostumada a lidar com projetos tão grandes.

“Estamos esperando o governo nos dizer se eles têm o gás ou não. Se eles não podem fornecer a energia que precisamos para o projeto, então nós iremos embora”, disse Saroj Jain, um executivo sênior da sede local da Jindal.

Especialistas em energia dizem que há uma abundância de gás na Bolívia, mas o governo não dispõe de meios para extraí-lo do solo. “Há reservas comprovadamente suficientes para sustentar o projeto da Jindal, bem como outros”, disse Jim Bibb, que representa na Bolívia a empresa de engenharia McGuffy Energy Services, de Houston, no estado americano do Texas. “O problema é atrair o investimento necessário para desenvolver novos campos e fornecer o gás para onde for necessário.”

Mas desde que governo de Morales aumentou o controle do estado sobre a indústria de gás natural, em 2007, muitas empresas privadas têm relutado em investir.

O investimento total no setor de energia da Bolívia, juntando o governo e empresas privadas, foi de US$ 96 milhões em 2010, comparado com US$ 372 milhões em 1999.

Em 2011, o investimento subiu para US$ 214 milhões, mas em grande parte graças aos gastos da Petrobras com melhorias no suprimento de gás para o Brasil.

Outro fator contribuindo para a desconfiança mútua: o contrato da Mutún determina que a Bolívia forneça o gás a preços domésticos, que são subsidiados. “Foi um grande erro amarrar o preço do gás a valores que não estão sujeitos às variações do mercado”, admite Alandia, o presidente da Mutún Steel. Mas alguns bolivianos suspeitam que a intenção da Jindal era comprar o gás a preços domésticos subsidiados e vendê-lo para o Brasil e o Paraguai.

O diretor de operações globais da Jindal, Vakrant Gujral, descarta tais alegações, dizendo que “não existe ligação” com nenhum país vizinho. Ele disse também que os preços mundiais do minério de ferro estavam cerca de 25% mais altos quando a Jindal recebeu a concessão da Mútun e que “aos preços de hoje nós estaríamos operando com prejuízo”.

A maioria dos analistas relegou o projeto como perda total para a Jindal. “Já que o projeto parece estar tendo problemas, nós não estamos levando essa empreitada muito em consideração na nossa análise das perspectivas da companhia”, disse Dhrushil Jhaveri, um analista da Prabhudas Lilladher, uma corretora de Mumbai.

A Jindal está no momento transportando pequenas quantidades de minério de ferro bruto, de balsa pelo Rio Paraguai, para vender nos mercados vizinhos da América Latina, segundo executivos da companhia. (Colaborou Prasenjit Bhattacharya.)

(Fonte: Martin Arostegui/Wall Street Journal Americas em 16 de Março de 2012)

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