Pesquisa cientifíca deixa vírus da gripe aviária mais letal
Em setembro de 2011, cientistas holandeses e americanos, coordenados por Ron Fouchier e Yoshihiro Kawaoka, criaram uma mutação no vírus Influenza A H5N1, causador da temida gripe aviária. Após a alteração, o vírus se tornou ainda mais perigoso: pela primeira vez, ele ganhou a ‘habilidade’ de contaminar mamíferos pelo ar. O Painel Científico Consultivo para […]
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Em setembro de 2011, cientistas holandeses e americanos, coordenados por Ron Fouchier e Yoshihiro Kawaoka, criaram uma mutação no vírus Influenza A H5N1, causador da temida gripe aviária. Após a alteração, o vírus se tornou ainda mais perigoso: pela primeira vez, ele ganhou a ‘habilidade’ de contaminar mamíferos pelo ar. O Painel Científico Consultivo para Biossegurança Nacional (NSABB, na sigla em inglês), órgão do Departamento de Saúde dos Estados Unidos, considerou a pesquisa um risco à saúde pública e vem tentando, convencer as revistas científicas Nature e Science a publicarem versões modificadas do estudo.
O vírus H5N1 raramente infecta humanos. Desde 1997, quando foi relatado o primeiro episódio, em uma criança asiática de três anos de idade, a Organização Mundial de Saúde registrou cerca de 600 casos. O temor que ele provoca tem a ver com o alto grau de letalidade – dos 600 infectados, mais de 300 morreram. Para a nossa sorte, o vírus é de difícil contágio em humanos. Para infectar o homem, é necessário o contato com aves doentes e, ainda mais raramente, alguém contaminado pode transmitir a doença para outra pessoa. Os poucos casos documentados de transmissão entre humanos nunca foram inteiramente confirmados e teriam se dado após longo convívio entre uma pessoa doente e outra infectada, não pela via aérea.
O estudo realizado pela equipe de Fouchier conseguiu reverter essa ‘dificuldade’ de infecção entre humanos do H5N1: após uma série de mutações, o vírus se tornou altamente transmissível pelo ar entre furões (modelo animal preferido para o estudo da gripe em humanos). Os caminhos percorridos para se chegar a esse resultado, no entanto, ainda permanecem desconhecidos. A pesquisa ainda não foi publicada, graças aos reiterados pedidos do governo americano para que seja censurada.
A censura
Em comunicado oficial, o NSABB recomendou em dezembro às revistas Nature e Science (periódicos aos quais os artigos foram submetidos para veiculação) que publicassem apenas uma versão modificada, excluindo a metodologia da mutação dos originais. O órgão, que não tem poder para de fato censurar ou mesmo julgar alguém pela publicação do estudo, justifica a recomendação com o risco do estudo ser usado por “pessoas que desejem fazer o mal.” Em outras palavras, para fins de bioterrorismo. Tanto a Science como a Nature resolveram aguardar pelas próximas recomendações do governo americano.
“Uma preocupação importante é a de que o vírus seja replicado mundo afora e acabe escapando dos laboratórios. Essa pesquisa não deveria nem ter sido feita”, diz Donald Henderson, professor emérito da Escola de Medicina da Universidade Johns Hopkins e conceituado pesquisador em bioterrorismo. Para o especialista, os riscos apresentados em um estudo como esse são muito maiores do que os benefícios. “Não dá para garantir que esses resultados ajudarão na criação de drogas ou vacinas mais eficientes. A pesquisa toda não faz sentido”, condena.
A opção pela censura, no entanto, é rebatida energicamente pela comunidade científica. Segundo Ricardo José Giordano, presidente da Comissão Interna de Biossegurança do Instituto de Química da USP, impedir a disseminação do conhecimento é impor barreiras ao avanço da ciência. “Os benefícios da publicação desse material são muito maiores. É importante que os cientistas que trabalham com esse vírus tenham acesso a esses dados”, diz.
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