O desembargador Nery Junior teria realizado ação para favorecer frigorífico Torlim em 2011, quando coordenou força tarefa para acelerar processos em Ponta Porã. Empresa é acusada de sonegar impostos e crimes fiscais em cerca de R$ 184 milhões

O desembargador do TRF 3 (Tribunal Regional Federal da 3ª Região), Nery da Costa Júnior é citado em investigação da corregedoria do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) na qual ele e o juiz federal, Gilberto Rodrigues Jordan teriam usado seus cargos para favorecer o frigorífico Torlim. O relatório assinado pela corregedora do CNJ, ministra Eliana Calmon, deve ser votado no próximo dia 30. O frigorífico é acusado de sonegação de impostos e crimes tributários em valores próximos a R$ 184 milhões.

De acordo com reportagem divulgada pela Folha do São Paulo – que obteve documentos da sindicância sigilosa – o relatório do CNJ aponta evidências de que o desembargador teria interferido no processo para desbloqueio dos bens do frigorífico, o qual foi decidido pelo juiz Gilberto Rodrigues Jordan em fevereiro de 2011.

Após operação da Polícia Federal, em 2004, os bens do frigorífico foram bloqueados e o Torlim tentou liberá-los judicialmente,o que não aconteceu, causando uma crise nos negócios da empresa. Na época o Torlim operava em pelo menos cinco Estados, incluindo Mato Grosso do Sul.

Em 14 de janeiro de 2011, teve início a ação para auxiliar o frigorífico, a partir de um pedido do desembargador para instaurar uma força-tarefa e acelerar processos na cidade de Ponta Porã. De acordo com o relatório, na época Nery ocupava interinamente a corregedoria do TRF3 e teria adiado suas férias para coordenar o trabalho, que durou cerca de duas semanas e teve apenas duas sentenças resolvidas, sendo uma delas a do Torlin.

O juiz Gilberto Jordan, em decisão do dia quatro de fevereiro de 2011, desbloqueou bens de quatro empresas do grupo. O advogado, Sandro Pissini, responsável pela defesa do Torlim desde 2008, foi apontado no relatório do CNJ por ter relações com o desembargador.

Pissini foi assessor dele no TRF entre 1999 e 2001 e, um mês após a sentença, um ex-funcionário do escritório dele foi nomeado como chefe de gabinete de Nery Júnior. Além disso, o desembargador já vendeu uma fazenda ao advogado.

Em entrevista a Folha, o desembargador nega as acusações. Em 2007, Nery Júnior chegou a ser denunciado após operação da Polícia Federal que investigou a venda de sentenças. Contudo, a denúncia foi rejeitada pelo Superior Tribunal de Justiça em 2009, por falta de provas.

CNJ pode afastar desembargador e juiz

O relatório diz que ambos podem “de fato ter agido com violação dos deveres impostos aos magistrados” e “de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro de suas funções” e deve ser votado no dia 30 de julho.

A sindicância do CNJ foi aberta em maio de 2011, a pedido do MPF (Ministério Público Federal). O Conselho pode abrir processo contra o desembargador e o juiz, além de afastá-los.

O desembargador nega todas as acusações. Ele disse à Folha que é vítima de “jogada política” do Ministério Público Federal e criticou a atuação da Corregedoria do CNJ, que segundo ele usou provas emprestadas do MPF. Sobre a criação da força-tarefa, ele alegou que sugeriu após manifestação de outro desembargador, Luiz Stefanini, que teria reclamado da demora dos processos em Ponta Porã.

O advogado Sandro Pissini também negou influência do magistrado no processo e disse que quem atuou no caso foi outro advogado, que não faz mais parte de seu escritório. Já Gilberto Jordan não respondeu, e informou à Folha que vai anexar documentos no processo do CNJ para pedir apuração de vazamento da sindicância contra ele. (Com informações da Folha de São Paulo.)

Depoimentos atestam que não havia motivos para força-tarefa

A reportagem da Folha conseguiu ter acesso a depoimentos feitos à Corregedoria do TRF, os quais alegam que não havia motivos para a força-tarefa ou para acelerar a expedição de sentenças de desbloqueio de bens porque a cão não envolvia presos e dependia de diligências.

No relatório do CNJ, Calmon diz que o desembargador e o juiz “agiram com o deliberado intuito de rever o conteúdo da decisão liminar” de 2004, segundo a Folha, bem como em benefício das partes atingidas, “violando os deveres e imparcialidade e independência”. Na época, esses bens das empresas eram avaliados em R$ 10 milhões.