Fisco x craques: entenda como os jogadores entram na mira da Justiça

Ídolos precisam explicar contas nos tribunais

Ouvir Notícia Pausar Notícia
Compartilhar

Ídolos precisam explicar contas nos tribunais

Neymar, Messi, Mascherano, Eto’o, Rooney, Figo, Maradona, Zico… além de craques, todos esses têm em comum o fato de carregarem um histórico de problemas com o fisco. Os casos mais recentes envolvem jogadores do atual elenco do Barcelona, sendo que Neymar, por razões distintas, terá que encarar as Justiças de Brasil e Espanha.

Enquanto na Europa o atual camisa 10 da Seleção foi chamado a depor na próxima terça em Madri para explicar detalhes da negociação que o levou do Santos para o Barça em 2013, ele foi denunciado ao longo desta semana pelo Ministério Público Federal, no Brasil, por crimes de sonegação fiscal e falsidade ideológica.

Os argentinos Messi e Mascherano respondem por sonegação, sendo que o volante foi condenado recentemente a um ano de prisão – o melhor do mundo ainda terá que encarar o seu julgamento. O mesmo já aconteceu com Figo e Eto’o no passado, quando eles jogavam no Barça. Nem mesmo referências como Zico e Maradona escaparam.

O Pibe foi acusado de burlar o fisco italiano no período em que atuou no Napoli, ao longo da década de 80. Por essa razão, inclusive, passou anos sem pisar no país europeu. Também lá, o Galinho enfrentou problema semelhante que acelerou a sua saída do Udinese, em 1985. Quatro anos depois, ele acabou inocentado, em pedido feito pelo próprio promotor de Justiça do Ministério Público.

– O jogador conhece do campo de jogo, é o que ele sabe fazer. Cada um tem a sua especialidade e é crível que ele não tenha esse conhecimento. Às vezes é difícil compreender. O jogador deve confiar os seus direitos a alguém. Enfim, pode haver uma assessoria ruim em relação a alguns atletas. É um caso hipotético, mas já vi situações assim – disse o advogado especializado na área desportiva e criminal Michel Assef Filho, em entrevista por telefone, ao ser questionado se casos do tipo poderiam acontecer por inocência dos jogadores.

No caso específico de Neymar no Brasil, a questão envolve contratos e direitos de imagem. Segundo a acusação, revelada pelo GloboEsporte.com nesta sexta-feira, Neymar e o pai criaram três empresas de fachada e adulteraram documentos com o objetivo de pagar menos impostos.  Assim, fugiriam das taxas cobradas a pessoas físicas (27,5%), criando as empresas para receber a maior parte dos salários pagos pelo Santos e dos contratos de publicidade. Segundo a revista Veja publicou neste sábado, a manobra teria feito com que o jogador abatesse mais de 50% dos impostos a pagar.

A pena para esses dois crimes pode chegar a cinco anos de prisão, mas a Justiça ainda analisará o pedido para decidir se pai e filho serão transformados em réus. A tarefa será entender se eles usaram essas empresas apenas para abater os impostos ou se estavam no direito de usar um recurso permitido em lei, de ceder a imagem do craque a uma empresa terceira.

– Eu não vejo problema para um atleta ceder direito de imagem a uma empresa. Também não vejo ilegalidade de um clube adquirir direitos de imagem de um atleta por uma empresa. Há uma linha muito tênue. Não falo do caso do Neymar, é um caso hipotético. Mas o que pode haver em alguns casos é uma simulação para pagar menos imposto, e esse que é o problema. O que é salário é salário. Não há problema de um clube contratar direito de imagem de uma empresa. O que não pode haver é uma simulação. Simular um fato que não está acontecendo para driblar ou esconder o pagamento de salário – explicou Michel Assef Filho.

Ao longo de seis anos, foram abertas três empresas, que, segundo a denúncia da Procuradoria, não teriam capacidade de administrar a carreira do craque. Os sócios eram o pai e a mãe de Neymar e havia apenas dois funcionários, que trabalhavam como seguranças. A acusação afirma ainda que, de 2010 a 2013, Neymar recebeu R$ 43,78 milhões do Santos, só que apenas R$ 8,1 milhões em forma de salário, como pessoa física. O restante foi por meio dos contratos de imagem firmados com suas empresas.

Michel Assef Filho diz que a tributação pode ser diferente dependendo do tipo de contrato firmado e explica que a pessoa jurídica recolhe menos imposto que a pessoa física no Brasil. Segundo o advogado, a existência do direito de imagem é um artifício legal e é normal o atleta, ao assinar o contrato com um determinado clube, ceder esses direitos à equipe.

– Antes de mais nada, é preciso entender a acusação para poder saber o que eles fizeram. Quais são as provas apresentadas contra o Neymar ou outros atletas? Se a acusação, que eu não conheço, se refere à existência de uma empresa que detenha a imagem do atleta, isso, para mim, não basta. Isso, no meu entendimento, é normal. O atleta pode ter o contrato com uma pessoa jurídica e ceder a sua imagem para a empresa. Isso não é um problema. Ele só tem que  avisar isso ao clube que vai contratá-lo, que decide se aceita os termos ou não. O clube pode exigir que ele rescinda o contrato com a empresa para assinar – completou.
 

Mascherano confessa e espera multa pesada

Além da denúncia do MPF, Neymar convive com outra dor de cabeça, essa com a Justiça Espanhola. Inclusive, ele foi chamado para depor em Madri na próxima terça, três dias antes de seu aniversário de 24 anos, para dar explicações sobre a sua transferência do Santos para o Barcelona, em 2013. Essa, entretanto, é uma investigação independente da que está em curso no Brasil.

Nessa, ele não está sozinho, e outros jogadores do Barcelona estão enfrentando problemas com a Justiça da Espanha. Na semana passada, o Tribunal de Barcelona condenou o volante Mascherano a um ano de prisão por fraude fiscal nos anos de 2011 e 2012. O jogador, que já havia confessado o delito no ano passado, agora tentará transformar a pena em multa ainda não estipulada, que se juntaria à punição de € 815 mil (R$ 3,6 milhões) já imposta pelo tribunal no mesmo julgamento. 
 

Messi também enfrenta a acusação de sonegação, supostamente por ter deixado de declarar € 4,1 milhões, assim como seu pai, Jorge. O Tribunal de Barcelona marcou o julgamento do caso para começar no dia 31 de maio, podendo se estender até 3 de junho. Caso seja condenado, o argentino pode pegar até 22 meses e meio de prisão.

No caso do melhor jogador do mundo, a investigação da Justiça espanhola teve início em 2013, com base em uma denúncia do jornal “El País”, e tem como alvo um suposto esquema para não declarar um montante que era desviado para empresas em paraísos fiscais e contratos de prestação de serviços em outros países. Depois, este dinheiro voltava livre de impostos para a Espanha.   

Já Mascherano reconheceu, em audiência em outubro de 2015, ter ocultado mais de € 1,5 milhão de direitos de imagem em 2011 e 2012 no Imposto de Renda. Ele teria utilizado duas estratégias para cometer a fraude: não declarar rendas obtidas da Nike, uma de suas patrocinadoras, através de uma sociedade nos Estados Unidos, e simular a cessão de seus direitos de imagem a uma empresa radicada na Ilha de Madeira (Portugal).
 

Eto’o e Figo, outros no histórico do Barcelona

A lista inclui outros jogadores com passagem pelo Barcelona no passado. Em caso parecido com o de Neymar, o camaronês Samuel Eto’o foi acusado de criar empresas fantasmas para abater impostos entre 2006 e 2009, período em que viveu na Catalunha. Recentemente, o Supremo Tribunal da Espanha condenou Luís Figo a pagar mais de R$ 10 milhões referentes a impostos não pagos entre 1997 e 1999, período em que ele estava no Barça.

Na Europa, o problema vai além das fronteiras da Espanha. Na Itália, Maradona chegou a ser condenado a pagar € 37,2 milhões de euros ao fisco por fuga aos impostos entre 1985 e 1990, quando defendeu o Napoli, e por isso, ficou anos sem pisar no país. Mais tarde, em 2013, um tribunal encontraria erros no processo, e o argentino pôde retornar a circular no território.

– Eu não matei ninguém. Eu vim pedir justiça – disse Maradona, ao chegar ao país naquela ocasião.
Zico, por exemplo, deixou o Flamengo rumo ao Udinese em 1983, mas a carreira na Itália durou apenas dois anos. Mesmo assim, foi tempo suficiente para ele ter problemas com o fisco do país, sendo inocentado em 1989.

– Assinei um contrato de uso de imagem no Brasil e, na Itália, o presidente do Udinese acertou um outro contrato de publicidade. Seria preciso uma autorização da receita federal italiana para que eu pudesse fazer publicidade na Itália. Respeitei isso e cumpri meu outro contrato. Mas aí os agentes da receita entraram com uma ação contra mim e tive que apelar. Mostrei, então, o contrato que tinha assinado no Brasil, que respeitava as leis brasileiras, e provei que pagava impostos corretamente. Apelei e fui totalmente absolvido. Era totalmente legal e não fiz nada para evitar pagar meus impostos. Só que a imprensa não mencionava isso – disse Zico, em entrevista certa vez à revista inglesa “FourFourTwo”.

Conteúdos relacionados

Bia Ferreira - (Foto: Reprodução, Instagram)