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Cotidiano

Barragem do Nasa Park: 6 meses após tragédia, o que mudou?

Várias perguntas fundamentais sobre a barragem do Nasa Park seguem sem respostas
Liana Feitosa -
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Propriedade atingida por lama do Nasa Park (Fotos: Helder Carvalho, Midiamax)

Seis meses. Esse foi o tempo que passou desde o dia 20 de agosto de 2024, quando Gabriele do Prado temeu que sua família tivesse sido engolida pela lama e arrastada por enxurrada que invadiu sua casa, localizada em uma propriedade rural que fica às margens da BR-163, em Campo Grande. 

Ela e outras 12 famílias foram diretamente afetadas pela inundação causada após 800 milhões de litros de água terem extravasado do lago artificial criado sem autorização de órgãos ambientais no loteamento de luxo Nasa Park. 

Logo, a água virou lama e saiu não somente arrastando, mas também destruindo tudo o que encontrava pela frente, por quilômetros

Entre os maiores prejuízos contabilizados está a devastação do meio ambiente, já que áreas de preservação, animais e vegetação foram atingidos.

Seis meses se passaram, tentativas de resolução foram acertadas, mas o único avanço registrado até agora foi um acordo de somente R$ 1,3 milhão para 11 pequenos produtores rurais da região atingida. 

Segundo informações do MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul), divulgadas no último dia 13 de fevereiro, o pagamento será completado em 1 ano, sendo feito em 3 parcelas pagas de quatro em quatro meses.

Acordo firmado

No dia 11 de dezembro do ano passado, o MPMS reuniu o grupo de vítimas para mediar uma tentativa, conforme os empresários do loteamento. 

Como resultado, ficou definido que os sócio-proprietários do empreendimento deveriam cumprir uma série de diretrizes, entre elas:

1 – Recuperação ambiental. Em dezembro de 2024 os proprietários do empreendimento apresentaram um projeto de recuperação ambiental de toda a região do entorno da barragem. Segundo o Ministério Público, a medida inclui todas as propriedades afetadas, margens do rio, mata ciliar, cercamento, plantio de mudas e tudo que for determinado em um estudo técnico, e que será analisado pelo órgão ambiental (Imasul). 

No entanto, ainda não está claro quando essas ações vão começar. Qual o plano de ação para essa recuperação, da qual dependem várias famílias? Serão recuperadas as áreas somente do entorno da barragem, ou todas as áreas que sofreram com a ação da enxurrada que se arrastou por quilômetros? Estas informações não foram esclarecidas.

2 – Segurança. Também em dezembro, segundo o MP, os empresários ainda protocolaram o pedido de licenciamento de recuperação da barragem e do loteamento, apresentando todos os documentos necessários para a segurança da barragem, seguindo aquilo que está na legislação, conforme o órgão;

Esse pedido de licenciamento foi aceito? Essa confirmação não foi apresentada.

3 – Danos financeiros. Ainda segundo o MPMS, das 11 vítimas que estiveram presentes nas negociações, os investigados concordaram em indenizar o pedido integral de sete. Para as demais, apresentaram contraproposta, que não foi aceita pelas vítimas por acreditarem que não cobriam os danos sofridos.

Logo após a tragédia, o MPMS afirmou que a estimativa do órgão era de que R$ 5,3 milhões seriam pagos em indenizações.

Por que, então, o valor acordado com as vítimas ficou bem abaixo do estimado pelo MP? Isso também não foi esclarecido.

Seis meses depois, o que avançou?

Neste mês de fevereiro, o Jornal Midiamax fez repetidas tentativas de comunicação com o MPMS para obter uma atualização sobre o caso, e saber como está o processo de recuperação da área degradada pelo rompimento da barragem. Até hoje, nenhum retorno foi dado.

Para a família de Gabriele – esposo, 4 filhos, assim como a mãe, irmão e pai -, a falta de resolução e transparência sobre o caso só aumenta o medo de que a área jamais seja recuperada.

As incertezas são inúmeras e, inclusive, levaram Gabriele a solicitar amparo psicológico ao MPMS, auxílio oferecido às famílias dias após o rompimento da barragem, mas nunca efetivamente concedido pelo órgão público.

O cenário, que antes era formado por área de vegetação abundante no entorno do Córrego Estaca, passava por uma TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) de recuperação para garantir a preservação ambiental.

Todos os investimentos foram perdidos e deram lugar a assoreamento, bancos de areia, galhos retorcidos e árvores derrubadas.

Importância ambiental da região

O Córrego Estaca pertence à sub-bacia do Rio Pardo, que é afluente do Rio Paraná, o segundo maior da América do Sul, ficando atrás somente do Rio Amazonas.

Em se tratando da Bacia do Rio Pardo, os desafios desse recurso natural não são recentes. Em dezembro de 2023 o Governo do Estado criou um grupo de trabalho, o CBH Pardo (Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Pardo), justamente para garantir a gestão adequada dos recursos hídricos dessa região.

A Bacia do Rio Pardo está localizada no leste de Mato Grosso do Sul e faz parte da bacia do Rio Paraná, abrangendo uma área de 39.419 km².

Os cursos d’água dessa bacia estão não apenas no território de Campo Grande, mas também de outros 11 municípios: Camapuã, Bandeirantes, Rochedo, Jaraguari, Sidrolândia, Nova Alvorada do Sul, Ribas do Rio Pardo, Nova Andradina, Santa Rita do Pardo, Bataguassu e Brasilândia. 

TAC firmado sem avanços significativos

Entre as incertezas que a família carrega estão perguntas sobre a recuperação ambiental da área degradada pela enxurrada que se arrastou com o rompimento da barragem.

“E o dano ambiental? E a erosão que se formou com a força da água, como que fica? Quem vai recuperar? A área está toda contaminada, o solo está contaminado”, questiona Gabriele.

Isso porque diversas propriedades tinham tanques de peixe e poço artesiano, tomados por lama, ficando impróprios. Além disso, sem rede de esgoto no local e com várias áreas usadas na criação de animais, a água espalhou não somente lama, mas dejetos e resíduos contaminantes, que deixaram o local com mau odor por dias.

No dia 13 de fevereiro de 2025, o Ministério Público de MS divulgou informações comemorando a formalização de uma TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) entre o órgão e a advogada dos empresários do empreendimento.

As novidades informadas sobre esse acordo, no entanto, não apresentam muitos avanços, nem elucidam dúvidas da população e das vítimas.

“O Termo de Ajustamento de Conduta contempla ainda obrigações relativas à recuperação ambiental dos imóveis afetados pelo rompimento da barragem”, diz texto do MPMS.

No entanto, o material não entra em detalhes sobre como se dará essa recuperação dos imóveis afetados, e nem quais são esses imóveis exatamente: são edificações do próprio Nasa Park ou aqueles que receberam a enxurrada do loteamento?

“Além disso, [o TAC] reforça a necessidade de cumprimento rigoroso das normas de segurança para a instalação de uma nova barragem, garantindo que os planos de segurança sejam devidamente seguidos, conforme a legislação vigente”, diz, ainda, o texto ministerial.

Quais são essas normas de segurança para a instalação de nova barragem? O texto também não deixa claro, evidenciando falha do MPMS na prestação de esclarecimentos sobre esse caso, dificultando o acesso da população a informações importantes sobre esse caso, para poder acompanhar e cobrar soluções.

Os questionamentos feitos pelo Jornal Midiamax ao MPMS ainda foram além:

Foram bloqueados R$ 35 milhões dos empresários do loteamento pela Justiça para garantir o pagamento de indenizações às vítimas do rompimento da barragem.

Onde esse valor será empregado, já que o valor total acordado com as vítimas foi de R$ 1,3 milhão?

Segunda barragem pode se romper

Segunda barragem localizada no Nasa Park (Foto: Reprodução Google Maps)
Segunda barragem no Nasa Park (Foto: Reprodução Google Maps).

Além da barragem rompina no ano passado, o loteamento de luxo ainda abriga outro reservatório d’água, acima do que acabou esvaziado. São 14 hectares, o equivalente a 20 campos de futebol, contidos por uma pequena barreira de terra, como mostra a imagem acima.

Quais as condições dessa segunda represa? Ela é segura? Esse reservatório d’água é objeto de estudo do MPMS? 

Todas as perguntas destacadas nesta reportagem foram feitas pelo Jornal Midiamax ao Ministério Público de Mato Grosso do Sul a fim de esclarecer sobre o processo em curso sobre o Nasa Park. O espaço segue aberto para que o órgão conceder tais esclarecimentos.

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