O tráfego de 20 tritrens abarrotados de eucalipto todos os dias na MS-450, a Estrada-Parque Piraputanga, poderia ser evitado. Pelo menos é o que alegam ambientalistas que acompanham a situação que gerou até racha no Conselho Consultivo da Área de Proteção Ambiental Estrada-Parque Piraputanga. Os ambientalistas argumentam que a indústria Suzano teria opção de rota alternativa, mas que a escolha em trafegar pela estrada turística foi para “economizar tempo”.

Segundo os ambientalistas, trecho de 11 quilômetros da estrada construída para uso contemplativo da natureza será ocupado pelos tritrens, carretas gigantes com três vagões ou semirreboques, por um período de no mínimo três anos. Cada carreta gigante tem capacidade para transportar até 74 toneladas de carga bruta.

“A fazenda onde fazem a retirada [de eucalipto] é a Lageado, que começa ali na Cipolândia, em Aquidauana e vai até Dois Irmãos do Buriti. Pega toda a extensão da Serra de Maracaju, então, lá possui uma saída por Terenos e outra por Dois Irmãos do Buriti. Aliás, antes até do local ser vendido para Suzano, escoavam pela Ponte do Grego e era para ser assim. Mas, depois bateram o pé e aos 45 do segundo tempo passaram a escoar pela Estrada-Parque porque a outra não tinha asfalto. O que eles querem é economizar tempo”, argumenta um ambientalista ouvido pela reportagem e que vive nas proximidades.

Segundo o denunciante, em distância por quilômetros as duas rotas não têm tanta diferença, porém, o asfalto é o que faz a estrada turística ser mais ‘vantajosa’ para a indústria.

“No começo a população aqui ficou meio preocupada, só que tinha muito desencontro. Tinha gente que falava que ia passar 200 caminhões por dia, outros falavam que a ponte não ia aguentar e aí por isso que foi marcada uma reunião com a empresa. Só que eles chegaram com toda a documentação, todo o aval e a reunião terminou com a população pedindo recurso para apoiarem os eventos turísticos da região”, relembrou.

No entanto, o assunto veio novamente à tona, por meio da denúncia do SOS Pantanal, que deixou a cadeira no Conselho e demonstrou diversas preocupações com o aumento de tráfego de caminhões na região, porém, não houve mudanças significativa no processo de autorização da unidade de conservação.

“Houve essa carta aberta a Suzano, considerando as questões ambientais e então pediram a renúncia. Só que, ao meu ver, ignoraram. Agora o assunto veio à tona novamente. Neste fim de semana, vi que eles possuem um ponto de parada, ali em uma rotatória da BR-262, em que um fiscal vai lá e limpa placas e faróis para os motoristas seguirem viagem. E são poucos os pontos de ultrapassagem para veículos, então, tudo isto tem que ser levado em conta também”, argumentou.

Plano de manejo estava pronto quando empresa iniciou escoamento

Outro ambientalista ouvido pela reportagem, com extenso currículo e que inclusive já foi contratado para fazer um plano de manejo na região, disse que o diagnóstico na região já estava pronto quando a Suzano começou as atividades. “Pegou a gente de surpresa e aí mudamos toda a abordagem, o diagnóstico e as tratativas que estávamos fazendo, neste nosso planejamento. E a situação lá está ruim mesmo. Usam estes 12 km para chegar na planta, lá em Ribas [do Rio Pardo]. E inclusive disseram que iam comunicar a comunidade”, explicou o profissional, que é biólogo.

Conforme o profissional, são ao todo três distritos afetados diretamente, com impacto no turismo e biodiversidade: Paineiras, Piraputanga e Camisão. “A empresa, nessas reuniões do Conselho, sempre estava com todas as autorizações possíveis, o que envolvia os órgãos ambientais também, então, enfim, a gente entende que é um problema sério, que vai durar três anos pelo menos e que vai ser ruim. Em grupos de WhatsApp, por exemplo, está todo mundo reclamando, de lixo, de sujeira, de atropelamentos e do fim do sossego”, opinou.

O biólogo diz que em nome de “uma matriz econômica”, que saiu do leste e já está “entrando no Pantanal”, está ocorrendo uma grave e preocupante problema. Neste período, diz que houve inúmeros ofícios encaminhados do Conselho para os órgãos responsáveis.

“O tempo todo a gente tinha delineado a rota alternativa, que saía por trás da fazenda, só que eles bateram o pé e disseram que não. Acabou que alguns órgãos se fizeram de mortos e deixaram de cuidar do nosso patrimônio. Vai detonar estrada, vai acabar com tudo, três anos de tritem, vinte por dia, é um absurdo realmente, deviam ter planejado melhor porque a vocação daquela estrada não é de transporte de carga pesada e sim de contemplação”, alertou.

‘Vai induzir comportamento ruim de motoristas’

Outra questão, ainda de acordo com o ambientalista, é o estímulo ao mau comportamento de motoristas. “Ninguém vai querer ficar atrás de um comboio. Eu penso, sinceramente, que ainda não aconteceram grandes tragédias, mas, precisa ver a entrada da Estrada-Parque ali na BR, a fila de caminhões que fica para poder cruzar a pista e entrar, é terrível. Eu qualifico tudo isso como uma grande ameaça externa e interna”, ponderou.

Segundo o ambientalista, o plano de manejo trará um diagnóstico socioambiental, com o zoneamento ambiental, o qual aponta o que pode e não pode em determinados locais, aonde que é área de preservação, onde pode ser área de produção, já que cada zona ambiental tem uma regra e é isso que o plano traz. “Vai apontar o impacto dessa magnitude sim, mas, quais as consequências, só no médio prazo mesmo”, argumentou.

Transporte de carvão e carros em alta velocidade na Estrada-Parque

Uma outra denúncia, encaminhada ao Jornal Midiamax, fala sobre o transporte de carvão e carros em alta velocidade, como um agravante que vinha ocorrendo na região.

“São todos estes impactos que a gente está observando, tanto na biodiversidade quanto na segurança da população, mas, tem outros, que é tirar a área excessiva de desmatamento, de florestas, em prol de fazer pequenos loteamentos, tem área de nascente que está fora dos limites do plano e é muito castigada em termos de ocupação. Por exemplo, não está cercadinha no entorno, do jeito que a gente queria que estivesse e o plano traz também nova perspectiva de como agir nessas áreas, recomendar programas de recuperação de área degradada, programa de recuperação de solo, programa de qualidade de água, tudo isto neste universo de cinco anos de planejamento”, afirmou.

Sobre todos estes questionamentos, a reportagem enviou email ao Imasul (Instituto do Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul) e não obteve respostas até o fechamento da matéria. Na tarde dessa quarta-feira (3), a reportagem também entrou em contato com o promotor de Justiça Luciano Furtado Loubet, que integra o núcleo ambiental do MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul), questionando se havia algum procedimento instaurado, quando ele afirmou de um inquérito instaurado em Dois Irmãos do Buriti. O Midiamax vai apurar mais detalhes nos próximos dias.

Suzano afirma que tem adotado ações mitigatórias

A empresa Suzano enviou nota ao Jornal Midiamax sobre o assunto, onde afirma ter as autorizações legais para o transporte do eucalipto e diálogo ativo com as partes. Confira na íntegra:

Após obter todas as autorizações legais e realizar um diálogo ativo – e permanente – com a comunidade local para entender suas preocupações e anseios relacionados tanto ao dia a dia local, como das questões turísticas e de meio ambiente da região, a Suzano implantou uma série de soluções que permitiram iniciar um transporte de madeira seguro e sustentável ao longo do trecho de 11 quilômetros da MS-450, que inclusive já é utilizada por outras empresas de Mato Grosso do Sul para o transporte de cargas.

Dentre tais ações, a empresa destaca:

  • Melhorias na sinalização de trânsito e implantação de bolsões para facilitar a ultrapassagem de veículos pequenos, bem como para servirem de paradas emergenciais ao longo de todo o trecho utilizado para o transporte de madeira (projeto aprovado pela Agesul);
  • Controle ativo de frota (por meio de Central de Controle online) de forma a garantir a velocidade dos veículos em cada trecho da MS-450, bem como o fluxo de tais veículos exatamente dentro dos horários informados à comunidade, com destaque para a restrição de circulação em horários escolares e redução considerável da frota aos finais de semana; ou seja, a empresa implantou uma operação referência no setor, com o menor impacto possível para a comunidade;
  • Rotogramas falados, ou seja, avisos eletrônicos diretamente na cabine dos motoristas reforçando os limites de velocidade em cada trecho, alertas de fauna, presença de ciclistas e proximidade da escola da região;
  • Treinamento com 100% dos motoristas sobre cuidados e orientações relativos à fauna, ciclistas, descarte de lixo, e sobre respeito a comunidade local. Esses treinamentos serão reaplicados ao longo da operação de transporte, sempre que necessário.
    A empresa também colocou à disposição da comunidade seu canal de Ouvidoria – 0800 771 4060 – para que possa receber sugestões, críticas ou denúncias visando aperfeiçoar ainda mais sua operação na região.

Confira outras reportagens do Jornal Midiamax sobre o assunto