Na década de 1980, a chegada de um novo cinema transformou a Rua 15 de Novembro, entre as ruas Rui Barbosa e Pedro Celestino. Para muitos campo-grandenses, o local proporcionou o primeiro contato com a sétima arte, experiência que se estendeu até 2012, quando o Cine Campo Grande, último cinema de rua da cidade, fechou oficialmente as portas.

No ano seguinte, contudo, o Sesc (Serviço Social do Comércio) adquiriu o espaço com a promessa de revitalizá-lo. No entanto, passados 11 anos, as obras nem ao menos iniciaram.

Desde 2013, havia a promessa de inaugurar um centro cultural que reuniria teatro, música, cinema e oficinas de arte em um só lugar. Em 2015, o Sesc atribuiu atraso das obras à falta de área para a construção de um estacionamento. Com o tempo, a promessa deu lugar à desesperança e o local permaneceu fechado.

Passados nove anos, em 2022, o Sesc anunciou que o projeto estava pronto e em fase de aprovação pelos órgãos legais. A estimativa era de 18 meses de obras, com inauguração prevista para 2024, o que novamente não ocorreu.

Prédio foi declarado como ocioso

Fachada irá remeter aos cinemas antigos
Fachada contará com letreiro informando a programação (Divulgação, Sesc)

Ainda neste ano, relatório da CGU (Controladoria Geral da União) sobre a gestão 2024 do Sesc-MS destacou o prédio como ocioso e sem destinação para atividades-fim. A CGU recomendou a adoção de medidas para acelerar a conclusão do projeto, solicitando uma resolução da ociosidade do imóvel o mais breve possível. Em resposta à CGU, o Sesc pontuou questões burocráticas como empecilho para não ter dado continuidade à reforma.

Regina Ferro, diretora do Sesc-MS
Regina Ferro – (Divulgação, Sesc-MS)

Regina Ferro, diretora regional do Sesc-MS, explica que a demora nas obras ocorreu devido a entraves com a empresa responsável, levando ao descarte do projeto inicial. No entanto, um novo projeto está em fase de elaboração e será entregue até o fim deste mês.

“Não levamos um puxão de orelha, até porque antes mesmo do relatório da CGU, já havíamos descartado os projetos com o escritório responsável pela obra. Estabelecemos um novo prazo para 30 de julho, e estimamos o lançamento de um novo edital para as empreiteiras interessadas em setembro”, afirma a diretora.

Teatro multiconfiguracional

Projeto
Projeto do novo centro cultural (Divulgação, Sesc)

Conforme Regina Ferro, há expectativa para que as obras iniciem ainda em 2024 e que até 2026 o local esteja finalmente disponível ao público. No novo projeto, haverá um teatro multiconfiguracional, projetado para receber espetáculos de teatro, música, dança e cinema, com capacidade para cerca de 200 pessoas.

“O projeto visa criar um lugar acessível a todos, onde diferentes linguagens culturais possam ser expressas. Queremos um espaço simples e acolhedor tanto para a população quanto para a classe artística, onde seja possível explorar todas as formas de expressão, como teatro, música e dança”.

Além do teatro, o novo espaço contará com uma biblioteca com ambiente para leitura, salas acústicas para aulas de música e coral, um hall para eventos e uma cafeteria para atender os visitantes.

“No início, planejamos uma intervenção maior, mas enfrentamos limitações devido ao tamanho do terreno. Agora, o projeto irá preservar a estrutura original do prédio”, explica.

Incêndio e invasões

Incêndio ocorreu em 2023
Incêndio ocorreu em 2023 (Kísie Ainoã, Midiamax)

Em meio ao abandono, o local se tornou alvo de invasões por pessoas em situação de rua e dependentes químicos. Em 2023, um incêndio destruiu a sala de projeção no primeiro andar do prédio. O Corpo de Bombeiros encontrou indícios de incêndio criminoso, já que o local frequentemente servia como abrigo para o uso de drogas.

O incêndio não foi um caso isolado. Em 2017, os bombeiros enfrentaram outro incêndio no mesmo local. Na ocasião, as investigações também atribuíram o fogo aos dependentes químicos e pessoas em situação de rua que utilizavam o local.

Regina Ferro destaca que, após a última invasão, o Sesc intensificou a segurança para evitar novos incidentes.

“Como o prédio está vazio, pessoas em situação de rua acabam invadindo, eles acendem o fogo para aquecer alimentos ou para se aquecer, o que pode resultar em incêndios. Por isso, reforçamos a segurança, pois não queremos que o local se torne uma moradia inadequada e que interfira na segurança do entorno e da vizinhança”, ressalta.

Ela afirma ainda que os incidentes não afetaram a estrutura do prédio nem a proposta de intervenção em planejamento.

Memória afetiva de Campo Grande

Cine Campo Grande
Cine Campo Grande (Divulgação, Saul Schramm)

Inauguradas na década de 1980 e administradas pela Cinematográfica Araújo, as duas salas do Cine Campo Grande resistiram mesmo com a chegada da concorrência, o Cinemark, localizado no principal shopping da cidade.

Considerado um cinema popular, o Cine Campo Grande atraía um público diverso. Segundo Marinete Pinheiro, autora do livro “Sala dos Sonhos”, que conta a história dos cinemas da cidade, o sucesso do local era atribuído ao seu fácil acesso, por estar situado na área central da cidade, à exibição de filmes blockbusters (voltados ao entretenimento) e aos baixos preços dos ingressos.

Na época em que o cinema fechou as portas, o filme que liderava as bilheteiras do país era “Os Vingadores”. Desde então, o longa-metragem ganhou três sequências, enquanto as salas do antigo cinema permaneceram fechadas.

Cine Campo Grande
Sala de cinema do Cine Campo Grande (Divulgação/Sesc)

Questionada sobre a incorporação das salas de cinema no novo projeto, Regina Ferro explicou que elas continuarão a exibir filmes, mas agora funcionarão como espaços multiculturais, voltados a arte e aos artistas regionais. Além disso, a fachada irá conter letreiros luminosos que remetem aos cinemas antigos.

“Uma das salas de cinema, a maior, será transformado em um teatro multiconfiguracional, com capacidade para mais de 200 pessoas. O outro espaço será totalmente aberto para atividades relacionadas a outras linguagens artísticas, como literatura e arte visual”, explica a diretora.

Rombo de R$ 7 milhões

Relatório de auditoria feita pela CGU aponta que o Sesc-MS aumentou em 46% suas despesas operacionais – gastos para manutenção das operações da entidade – em 2022. Com isso, a entidade sem fins lucrativos passou de saldo positivo de R$ 5,5 milhões em 2021 para um rombo de R$ 7,1 milhões no ano seguinte.

Conforme o resultado operacional do Sesc, as despesas operacionais em 2021 foram de R$ 55,4 milhões, enquanto no ano seguinte saltou para R$ 81,9 milhões. A CGU aponta, ainda, que o déficit foi amenizado por ajuda de custo repassada pelo Departamento Nacional da entidade.

Apesar do rombo, a CGU identificou que o Sesc possui R$ 69,6 milhões em aplicações financeiras. Dessa forma, o relatório aponta que: “O SESC/MS possui ampla margem para possibilitar, após estudo de viabilidade, a ampliação dos investimentos no programa de gratuidade em benefício da sociedade de modo geral, visto que no período analisado os investimentos em gratuidade representaram em média, pouco mais de 12% do montante existente em aplicações financeiras”.

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