Tem viralizado nos últimos dias alguns vídeos em que a equipe de bordo pede para passageiros descerem voluntariamente do avião. O motivo? O calorão poderia atrapalhar o desempenho da aeronave – deixá-la mais leve seria uma prioridade de segurança.

De fato, a situação foi registrada em alguns estados brasileiros e não por overbooking, um termo utilizado por empresas quando é vendida uma quantidade maior de bilhetes que a capacidade de passageiros oferecida.

Felizmente, apesar de Mato Grosso do Sul beirar temperaturas de 43°C na onda de calor, a situação não aconteceu em solo sul-mato-grossense.

Performance em xeque

Ao Jornal Midiamax, a companhia Gol, uma das maiores operadoras de voo do país, afirmou que a situação ocorre diante dos termômetros altos, pois a temperatura é um parâmetro importante no cálculo de desempenho dos voos.

“Temperaturas altas, principalmente em aeroportos mais restritos, pode ser um motivo para a companhia ter que diminuir o peso da aeronave. Como a variação de temperatura é dinâmica e, às vezes, grande, ao longo do dia, cada voo é analisado individualmente para verificar essa condição até o momento do embarque, podendo ser necessário recalcular o peso a bordo”.

A companhia ainda reforça que a medida não tem nenhuma relação com a temperatura dentro da aeronave ou com a capacidade de funcionamento do ar-condicionado, que garante o conforto dos passageiros mesmo com altas temperaturas externas em solo.

“A GOL possui unidades de ar-condicionado externo, distribuídas em diversos aeroportos do Brasil, possibilitando a refrigeração das aeronaves em solo. Inclusive, durante embarque e desembarque dos passageiros. A Companhia reitera que todas as ações são tomadas com foco total na segurança, nosso valor número 1”, pontua.

Situação pouco comum

Um artigo publicado pela Abear (Associação Brasileira das Empresas Aéreas) reforça que o atraso e até cancelamento de uma viagem em dia de muito calor é pouco comum no Brasil, mas relativamente corriqueiros em aeroportos próximos de regiões desérticas, como no Saara Africano.

“Por aqui, esta situação é muito menos frequente, mas não impossível. Trata-se de uma questão puramente científica: para decolar, um avião precisa de potência suficiente para vencer a resistência do ar e atingir uma velocidade que permita a ele ter sustentação para superar seu próprio peso, subir e se sustentar no ar”, traz o artigo.

A associação continua: “a potência do motor depende do fluxo de combustível e do volume de oxigênio que entra nos motores dos aviões durante a aceleração e esse fator está diretamente relacionado à densidade do ar. Pelas leis da física, quando a temperatura do ar aumenta, cai sua densidade e ele se torna mais leve. É o que faz os balões de ar quente flutuarem, por exemplo. Os motores a jato funcionam a combustão, que ocorre após a reação entre combustível e o oxigênio. Em situações de intenso calor, com a densidade do ar reduzida, o volume de oxigênio que entra nos motores também diminui, o que impacta diretamente na potência, portanto, e na performance de decolagem do avião”.

Ou seja, quanto menor a densidade do ar, mais velocidade será necessária para tirar o avião do solo. Consequentemente, será preciso mais espaço em pista para permitir essa aceleração. Em situações extremas, em que a pista não é longa o suficiente, o voo pode atrasar até a melhora das condições ou ser cancelado.

Já a integridade dos pneus não é afetada pela temperatura da pista, pois são projetados para trabalhar em condições bem extremas.

Calorão continua

Geralmente, o fim de ano é marcado por chuvas e calor ameno. Entretanto, este ano o cenário não é animador. A análise do Cemtec (Centro de Monitoramento do Tempo e do Clima) para os próximos três meses é de muito calor e pouca chuva no Estado por influência do El Niño, o fenômeno tem contribuído para o aumento das temperaturas.

Para mitigar registros desta intercorrência em voos futuros, o diretor de Segurança e Operações de Voo da Abear, Ruy Amparo, relata que as companhias aéreas devem se atentar ao planejamento para evitar atrasos e cancelamentos.

“O planejamento envolve desde a definição da aeronave certa para cada rota, até os melhores horários para realização dos voos e controle do peso transportado, mas nem sempre é possível prever certas oscilações bruscas e atípicas de temperatura, sendo necessárias algumas ações de contingência”, diz.

A experiência do piloto e da equipe de bordo deve somar em medidas para reduzir o peso da aeronave para viabilizar a partida. “Se houver condições para isso, é possível reduzir a quantidade de combustível a ser embarcada, desde que excedente ao mínimo exigido por legislação, retirar parte da carga e, apenas em último caso, realocar passageiros para outros voos”, finaliza.