Profissão passada de pai para filho, trabalhar na ferrovia de era sinônimo de muito orgulho entre as gerações. Além de local de trabalho, a vila ferroviária de Campo Grande abrigava famílias unidas pelo mesmo propósito: ajudar na construção e formação da cidade.

Dia 30 de abril é a data escolhida para homenagear todos que trabalharam na ferrovia. Mas como falar da profissão do ferroviário sem citar a grande família que se formava, a cada vez que um novo integrante entrava para o time da empresa?

Apelidos engraçados, amizades e muito saudosismo, são o que restaram para os ex-funcionários da ferrovia. Desde o trabalho até festividades e campeonato de futebol, os ferroviários estavam sempre juntos, e com as famílias que ali formavam, eram todos uma grande família.

José Dias da Silva Filho, mais conhecido como “Zé Copinho”, entrou na ferrovia em 1980, desempenhando a função de maquinista. Trabalhar na empresa foi uma continuidade, pois seu pai e seu irmão mais velho também foram ferroviários. José Dias foi o último da geração de ferroviários, mas não esquece os momentos que passou com sua família e seus amigos de profissão. “Na época da Rede Ferroviária e da Noroeste Brasil, a empresa fornecia produtos na época da páscoa, para toda a família. Na época de e também sempre tinha festividades”, conta.

Zé Copinho relembra tempos de maquinista Foto: Kísie Ainoã/Midiamax

O ex-ferroviário aposentou pela empresa aqui em e hoje mantém sua casa na Vila Ferroviária e o famoso bar do Zé Carioca, também na região. As suas maiores saudades do tempo de maquinista são os amigos e maneira como cuidavam da ferrovia. “A ferrovia para nós era um prolongamento de casa. Era uma empresa nossa, não era uma empresa onde você simplesmente trabalhava. Os pais antigos, quando nasciam os filhos, já queriam que um dia fosse ferroviário”, explica.

O diretor da Afapedi (Associação dos Ferroviários, Aposentados, Pensionistas, Demitidos e Idosos), Nelson Pereira de Araújo, nasceu na explanada ferroviária e toda sua família esteve inserida nesse meio. Seu pai e tios e irmãos foram o grande incentivo para Nelson seguir essa profissão. Aos 24 anos fez o concurso para maquinista e assim ingressou na ferrovia. “A gente costuma falar que todo ferroviário tem sangue de aço. Ser ferroviário está dentro da gente, não tem como viver mais sem a ferrovia”, conta.

Nelson conquistou grandes amigos na ferrovia, que se tornaram compadres com o tempo. “Tenho hoje compadres que conheci dentro da ferrovia. Batizei os filhos, fui padrinho de casamento de alguns, então realmente você cria um laço que é pra vida toda”, relata.

As famílias foram se expandido, e se entrelaçando, ao ponto que hoje muitos ferroviários possuem hoje parentesco. “Existe hoje muitos ferroviários que viraram parentes por causa dos filhos que se conheceram e se casaram”, acrescenta o diretor.

José Ferreira da Silva, chegou na cidade para trabalhar na ferrovia, com uma mala e uma bicicleta, que está em sua casa até hoje. Aqui se estabeleceu e criou raízes, motivo de orgulho para o ferroviário, que desempenhava a função de agente de estação. É tanto carinho que guarda dos tempos da ferrovia, que José sabe com exatidão quantos dias trabalhou dentro da empresa: foram 32 anos, sete meses e um dia, vendendo passagem e fazendo despacho de bagagens. “Eram sete linhas, cheias de vagões. A gente fazia plantão, amanhecia aqui trabalhando. Eu trabalhava com amor”, relata.

Um trabalho muito importante desempenhado na ferrovia era o da polícia ferroviária, criada para garantir a segurança nos trilhos e estações, e proteger os tesouros que eram transportados. José Melquiades Velasques se orgulha de dizer que fez parte dos policiais ferroviários. “Eu morava perto da ferrovia, meu primeiro trabalho como adolescente era vender o esterco dos cavalos que ficavam próximo à ela. A ferrovia ficou na minha história. Eu fiz o concurso e passei”, conta.

Da esquerda para a direta: José Melquiades, José Ferreira da Silva, José Dias da Silva e Nélson Pereira de Araújo. Foto: Kísie Ainoã/Midiamax

O conjunto ferroviário de Campo Grande

A primeira estação ferroviária de Campo Grande foi inaugurada em 6 de setembro de 1914, e teve seu último trem, partindo da estação, no dia 30 de 1996, quando a empresa foi privatizada. A estação ferroviária teve um importante papel no desenvolvimento do estado do Mato Grosso do Sul e sua edificação possui grande representatividade na história do Complexo Ferroviário.

Após a privatização, foi desativado o trem de passageiros. Em 2004 a estrada de ferro teve seus trilhos arrancados do centro da cidade pelo então prefeito em exercício, pois atrapalhava o trânsito.

Foto: Kísie Ainoã/Midiamax