Após a troca do hino de Mato Grosso do Sul pelo de Mato Grosso em materiais distribuídos pela Semed (Secretaria Municipal de Educação) para alunos da Reme (Rede Municipal de Educação), a prefeitura deverá fornecer cópias com a letra correta da canção. O erro foi percebido por pais ao vistoriarem o material de seus filhos.
“Meu filho recebeu o kit na semana passada. Para minha surpresa, quando estava preenchendo a agenda dele, percebo que o hino estava errado”, comentou um pai, que preferiu não se identificar.
A percepção do pai foi correta. O hino não está errado, mas a troca realmente ocorreu e o hino do estado vizinho passou a ser apresentado para os alunos da Capital de MS. A reportagem teve acesso ao kit escolar e confirmou o erro.
Em nota, a Semed (Secretaria Municipal de Educação) informou que o erro ocorre em todas as agendas entregues aos alunos da Educação Infantil — Grupos 4 e 5 — da Reme. A secretaria também explica que as empresas vencedoras da licitação, ambas com sede em Curitiba/PR, receberam o memorial descritivo da agenda escolar, onde foi solicitado que constasse os hinos Nacional, de Mato Grosso do Sul e de Campo Grande.
Como solução, a pasta irá fornecer cópias com a letra correta do hino de Mato Grosso do Sul a todos os alunos que receberam a agenda com o erro. As empresas responsáveis foram notificadas e a secretaria afirma que tomará todas as medidas jurídicas e administrativas cabíveis.
Veto do executivo
A Prefeitura de Campo Grande vetou projeto de lei, aprovado na Câmara Municipal, que previa, além do Hino Nacional Brasileiro, o de Mato Grosso do Sul e o de Campo Grande, nos materiais das escolas municipais da Capital. A informação foi publicada no Diogrande (Diário Oficial de Campo Grande) desta quarta-feira (20).
Segundo o documento, a Semed se manifestou contra ao referido Projeto de Lei nº 10.078, afirmando que a proposta seria inviável, informando que os cadernos escolares distribuídos na Reme (Rede Municipal de Ensino), compõem o kit escolar, cuja aquisição é realizada por meio de licitação pública, com edital próprio.
O texto publicado no Diogrande destacou que a medida cria atribuição ao Poder Executivo e viola o princípio de harmonia e independência dos poderes. O veto ainda é encaminhado e os vereadores podem votar por mantê-lo ou derrubar a proibição, tornando-a válida.
Erro milionário
Vale lembrar que a Prefeitura de Campo Grande desembolsou R$ 2.108.570,60 para a compra dos kits escolares distribuídos em 2022. A empresa contratada para fornecer o material foi a Brink Mobil Equipamentos Educacionais.
Segundo o documento, a aquisição foi assinada entre representantes da empresa e da Semed. O contrato terá validade de 12 meses, contados da assinatura feita em 1º de fevereiro.
Arte ajuda na difusão do hino
O hino de Mato Grosso do Sul foi cantado pela primeira vez em 1º de janeiro de 1979, durante a cerimônia que pôs em prática o que já estava no papel. Naquele dia, o coral da UFMS cantou, no Teatro Glauce Rocha, a primeira e recém-criada versão do hino de MS, que abrilhantou a solenidade de posse do governador Harry Amorim Costa e dos deputados constituintes.
A canção e sua história ainda é pouco difundida entre a população do recente estado. Esses fatos são relatados no documentário Hino – Glória e Tradição de uma Gente Audaz, fruto do curso de documentário “MS 40 anos em Histórias Cinematográficas”, promovido em 2017 pelo MIS (Museu da Imagem e do Som) e pela TVE.
Dirigido por Guilherme Cavalcante, Lizandra Moraes e Marcia Furtado, e também com produção de Silvana Rocha, Fabiana Rocha e argumento original de Debora Rossi Otto, o documentário é fruto de uma longa pesquisa nos acervos e arquivos da TVE e da Fundação de Cultura de MS, além dos depoimentos de personalidades da época, pesquisadores e de pessoas comuns.
O resultado propõe uma visão bem-humorada e um tanto quanto crítica daquilo que deveria ser o maior símbolo sul-mato-grossense.
Curiosidades sobre o hino
Atualmente pouco difundido entre os habitantes do Estado, há alguns detalhes pouco explorados nas aulas de história, que você confere a seguir.
Concurso
De fato, um concurso foi lançado para se escolher os símbolos pátrios do recém-criado Estado. Porém, somente brasão e bandeira foram premiados — a comissão julgadora não gostou das propostas de hino que foram inscritas no concurso. Com isso, o advogado Jorge Antônio Siufi e o agrônomo Otávio Gonçalves Gomes foram chamados às pressas, poucos dias antes do natal, para compor uma letra à melodia composta pelo maestro Radamés Gnattali, que seria apresentada nos dias seguintes durante a solenidade que ‘tiraria’ Mato Grosso do Sul do papel.
Primeira Execução
Toda a pressa era para que no dia 1° de janeiro de 1979, data em que Mato Grosso do Sul passou efetivamente a funcionar, o hino pudesse ser executado e abrilhantasse a solenidade — a musicista Lenilde Ramos, hoje sanfoneira consagrada no Estado, participou da primeira execução, no Teatro Glauce Rocha. O hino, no entanto, seguiu esquecido até 1994, quando finalmente ocorreu o primeiro registro da partitura em mídia física, comandado pelo músico Odon Nacasato.
Calote
No concurso, o prêmio para o hino era de 100 mil cruzeiros. Mas, nem a dupla de compositores Jorge Antonio Siufi e Otávio Gonçalves Gomes e nem o autor da melodia, o maestro Radamés Gnattali, foram devidamente pagos por seus serviços. Radamés, no caso, recebeu apenas a primeira parcela do pagamento. O que foi feito com o dinheiro é um mistério que dura 40 anos. Siufi e Gomes receberam apenas um “obrigado”, como o mesmo relatou.
Representações
Além de divulgar e enaltecer belezas naturais de Mato Grosso do Sul, o hino também destaca figuras históricas e retrata grandes nomes de episódios históricos como a Retirada de Laguna, durante a Guerra da Tríplice Aliança, também conhecida como Guerra do Paraguai. Os nomes que aparecem são de Vespasiano Martins, que foi político e defensor da emancipação do sul do Mato Grosso; Coronel Carlos de Morais Camisão, que liderou a Retirada de Laguna; Tenente Antônio João, que no mesmo episódio ordenou a retirada de civis e resistiu até a morte contra a artilharia Paraguaia; guerreiros Guaicurus, índios cavaleiros que lutaram na Guerra do Paraguai; e Ricardo Franco de Almeida Serra, engenheiro militar português responsável pela fundação do Forte Coimbra, em Corumbá.
Hinos alternativos
Em 2005, em uma solenidade de abertura da XIV dos Jogos Abertos Brasileiros, durante a gestão do então governador Zeca do PT, a canção ‘Trem do Pantanal’, de Paulo Simões e Geraldo Roca, foi tocada no lugar da hino oficial. Foi a deixa para uma calorosa discussão sobre representatividade, conforme traz a obra de Álvaro Neder ‘Enquanto este novo trem atravessa o Litoral Central’.
Mas, além de ‘Trem do Pantanal’, a canção ‘Sonhos Guaranis’, também de Paulo Simões, costuma ser considerada hino alternativo, até porque narra os mesmos fatos históricos mencionados na letra oficial de Siufi e Gomes. Porém, até a Mercedita, um chamamé clássico do Paraguai, já foi abraçado pelos sul-mato-grossenses como uma canção representativa da identidade de quem mora aqui.
Lembra ou não lembra?
O número de pessoas que sabe o hino de cor costuma ser bem baixo. Há várias possíveis explicações para isso, sendo a primeira o fato da gravação oficial ter demorado 16 anos. Isso dificultava, por exemplo, que as escolas ensinassem a letra nas aulas. Além disso, tem toda a questão que dialoga com o contexto autoritário no qual Mato Grosso do Sul foi criado — como uma estratégia para garantir número suficiente de representantes do partido Arena no Congresso Nacional, a fim de assegurar a eleição do general João Figueiredo em 1979 e sobrevida do regime militar até 1985, conforme apontam os historiadores.
“Vale lembrar que na época da criação do Estado, estávamos submetidos ao Ato Institucional n° 5, ou seja, no auge da ditadura militar. Não houve participação popular para a criação do Estado, muito embora, historicamente, alguns movimentos já tenham pedido a emancipação política do sul do Mato Grosso. Mas, numa ação sem clamor popular, as questões identitárias que envolvem o hino se tornam muito frágeis. Boa parte da população nem tinha ideia do que estava acontecendo”, explica a historiadora Alisolete Weingartner, do instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso do Sul.
Hino de Mato Grosso
O Hino de Mato Grosso foi reconhecido oficialmente 1983, a partir da avaliação por uma comissão criada para estudar possíveis mudanças na sua letra. A polêmica avaliação envolveu a citação de municípios que não pertenciam mais a Mato Grosso após a divisão do Estado, em 1977.
Os municípios como Dourados e Corumbá, localizados em Mato Grosso do Sul, compõem o arranjo do Hino do Estado, que na época suscitaram muita discussão. Apesar disso, a comissão optou por manter a letra original e preservar a história local.
A interpretação dada pela comissão é de que o trecho ressalta a bravura de Antônio João Ribeiro, que comandou a colônia Militar de Dourados, e dá destaque para Antônio Maria de Coelho pela bravura na retomada de Corumbá na guerra do Paraguai, e que ocupou o cargo de primeiro governador de Mato Grosso já na fase Republicana.