Após suspeita de motor adulterado, comprador vive pesadelo há 2 anos para transferir veículo
Em vistoria no Detran-MS foi identificado uma adulteração, mas até hoje nada foi concluído
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Desde 2019, Anderson Silva da Costa, de 34 anos, vive um pesadelo para conseguir realizar a transferência de um veículo para o seu nome. Surpreendido durante a vistoria no Detran-MS para concluir a transferência de propriedade do carro, o morador foi informado que o motor estava com suspeita de adulteração. No entanto, até hoje, dois anos depois, nada foi concluído e ele segue impedido de fazer qualquer procedimento com o carro.
Ele explicou ao Jornal Midiamax que quando foi até o atendimento do Detran-MS no Shopping Bosque dos Ipês para fazer a transferência, foi informado da suspeita que inicialmente seria uma adulteração no chassi do carro, um Golf Sportline. Porém, foi posteriormente informado que, na verdade, era no motor.
“O carro foi apreendido no dia em que fui fazer a transferência para o meu nome. Apreenderam e ficou 6 meses no pátio do Detran”, explicou. Na ocasião, um boletim de ocorrência foi registrado como crime de ‘adulteração de sinal identificador de veículo automotor’ e ele ficou como fiel depositário após a liberação da apreensão. No entanto, Anderson relata que após dois anos nunca foi intimado judicialmente ou fizeram qualquer procedimento para solucionar o problema.
No laudo feito por perito diz que ‘apresenta-se adulterado por supressão de caracteres por instrumentos abrasivos e posterior remarcação de caracteres’, onde também foi feito exame químico.
Um dos documentos encaminhados para a reportagem revela que após o registro da ocorrência, o antigo dono do veículo foi intimado a depor na delegacia e explicou que, quando comprou o Golf em dezembro de 2018, fez a vistoria e foi aprovado, porém, o motor do carro fundiu três dias depois. Após passar por retífica, o veículo passou novamente por vistoria, desta vez no Detran-MS, e tudo estava certo.
“No Renavam [Registro Nacional de Veículos Automotores] está tudo certo. O chassi e o motor são o mesmo. Esse carro já foi transferido para outros donos anteriormente e nunca deu nenhum problema. Já foi passado na vistoria deles [Detran] por 10 anos desde que esse carro saiu da fábrica e nunca teve problema. Agora falam que meu carro é adulterado?”, questionou.
Impedido de trafegar com o carro e muito menos vendê-lo, Anderson permanece com um ‘elefante branco’ na garagem. “Quando quero pagar o documento dele, tenho que ir no Detran pedir uma autorização para a delegacia de trânsito, é uma burocracia para fazer qualquer coisa no veículo, que ainda está no nome da antiga dona. Tenho passado por uma humilhação, um descaso. Não sei mais o que fazer”, pontuou.
A reportagem entrou em contato com a assessoria de imprensa do Detran-MS e foi informada que a polícia abriu um inquérito para investigação: “O veículo foi preso durante vistoria na agência do Shopping Bosque dos Ipês no dia 28/01/2019. O Detran-MS (Departamento Estadual de Trânsito de Mato Grosso do Sul), instaurou processo para investigação e encaminhou para Corregedoria. Atualmente o caso está sendo investigado pela Deletran, que já instaurou procedimento criminal”,disse em nota.
Denúncias recorrentes
Denúncias de carros que foram ‘barrados’ em vistoria do Detran-MS, apesar de estarem em sua total integridade, são noticiadas há anos pelo Jornal Midiamax. Em 2020, um entrave sofrido por trabalhador da construção civil de Campo Grande chamou a atenção do mecânico de motores e empresário Vanderlei Scuira. O homem procurou Scuira após ter negada pelo órgão a transferência da documentação da Ford F-4000 que acabara de comprar. A vistoria do órgão apontou que o motor do caminhão estaria adulterado, alegação duramente contestada pelo mecânico, mesma situação enfrentada por Anderson.
Scuira denuncia há mais de duas décadas o que acredita ser um serviço de vistoria “capenga” prestado pelo Detran-MS. O empresário fala em “incompetência” de servidores do departamento e das empresas credenciadas para o procedimento.
No caso em questão, a vistoria teria acusado que a numeração inscrita no bloco do motor da F-4000 não condiz com modelo original de fábrica. Ainda, que o número teria sido raspado e, por isso, motor deveria ser trocado para ter transferência aprovada, o que custaria de R$ 10 mil a 12 mil.
A situação é idêntica, segundo Vaderlei Scuira, a caso ocorrido em 2002. Naquela época, o mecânico obteve da própria fabricante do motor a resposta de que a peça posta em xeque pelo Detran-MS era, sim, original de fábrica. A consulta à indústria foi toda documentada.
Nenhuma investigação
O mecânico Vanderlei Scuira, de 57 anos, que tem histórico a frente de denúncias envolvendo o Detran-MS, relatou em entrevista ao Jornal Midiamax em novembro de 2020 que a confusão que os casos geram tem a ver com anos de suspeitas sobre como funciona o serviço do órgão estadual que deveria coibir o mercado de roubos e furtos de veículos, e que denúncias não são investigadas.
É um problema recorrente em Mato Grosso do Sul, que ajudou, de certa forma, a construir a fama de Vanderlei Scuira. Ele carrega um legado de mais de 30 anos à frente de denúncias que revelaram irregularidades envolvendo o Detran-MS (Departamento Estadual de Trânsito de MS).
O preço, porém, é alto: além da perseguição, ele é um exemplo vivo da frustração entre brasileiros com a dificuldade para melhorar serviços públicos e cobrar o cumprimento da lei. Após 3 décadas, Scuira denuncia que quase nada mudou e quer saber o que explica a falta de resolutividade para os problemas do Detran-MS, que vive implicado em escândalos de fraudes e ilegalidades.
Motores com sinais aparentes de numeração raspada ou, de alguma forma, adulterada e até mesmo ilegíveis, são indícios de que a peça poderia ser fruto de roubo. Com isso, o veículo deveria ser apreendido e a transferência não pode ser realizada. Assim, um carro, moto ou caminhão recém-adquirido se torna uma bomba na mão de quem o comprou.
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