De abandono a focinho dilacerado: em 2016, um animal resgatado a cada 48h

Delegacia recebeu 275 denúncias de maus-tratos

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Delegacia recebeu 275 denúncias de maus-tratos

Somente nos 11 primeiros meses de 2016 a média de resgate de animais em condições inapropriadas em Campo Grande foi de um a cada dois dias, cerca de 15 animais por mês, de acordo com assessora jurídica das organizações protetoras de animais da Capital. Nos últimos seis meses, a Decat (Delegacia Especializada de Repressão a Crimes Ambientais e Atendimento ao Turista) computou 275 denúncias de maus-tratos, grande parte motivadas por práticas abusivas dos próprios donos.

Em tese os animais são considerados amigos dos homens, em alguns casos, a relação se intensifica a ponto de eles serem considerados integrantes da família. Contudo, a teoria muitas vezes foge da prática e revela a face desagradável da relação, onde o elo distancia-se do laço amigável e evidencia uma relação de poder e autoritarismo sobre os bichos, que em alguns casos, acabam sendo facilmente descartados ou negligenciados.

Durante o ano de 2016 noticiamos casos  de maus-tratos a animais que geraram comoção popular e trouxeram à tona debates sobre a relação homens e bichos, além de análises das deficiências no serviço de combate e punição aos abusos.

Neste ano,um dos casos que mais chocaram  foi registrado no início março, quando um cachorro foi visto andando no Bairro Santa Emília com o focinho dilacerado. A suspeita é de que o animal, batizado de ‘Valente’, tenha sido amarrado pelo focinho. Ele foi resgatado por uma protetora, passou por cirurgia de reconstrução e se recuperou. Por falta de informações a polícia não conseguiu localizar nem punir o responsável pela agressão.

Em setembro, uma protetora localizou um terreno no Bairro José Abrão, que supostamente funcionava como espaço de ‘desova’ de animais ainda vivos. Na época a denunciante informou que os bichos eram largados no local amarrados dentro de sacos e caixas. A delegada Rosely Molina informou que policiais estiveram no lugar e, à paisana, vistoriaram o local por vários dias, porém, não conseguiram identificar nenhum suspeito.

Em outubro, dois cachorros que ficavam em meio a um cumulado de fezes e infestação de carrapatos foram resgatados por agentes da Decat de uma casa no Bairro Carandá Bosque I. O caso chocou pelas condições de negligência em que os animais estavam. O proprietário do local foi conduzido à Delegacia onde foi autuado por prática de ato abusivo e maus-tratos a animais, conforme prevê o Artigo 32 e 54 da Lei nº 9.605 de 12 de fevereiro de 1998.

“Não basta se sensibilizar na internet, tem que denunciar”

No mês de julho, imagens feitas por uma denunciante causou revolta. Em um vídeo, é possível ver uma mulher abandonando o cachorro do filho no pátio do CCZ (Centro de Controle de Zoonoses), em Campo Grande. Depois de ser jogado para fora do automóvel, achando que tratava-se de uma brincadeira, o animal chegou a perseguir o carro por alguns metros, na tentativa de alcançar os donos, mas a mulher avança e deixa o cachorro para trás. O cão foi adotado, porém, por falta de denúncia formal o caso terminou impune. Por causa disso, a ocorrência trouxe à tona um dos embaraços de trabalhar na área.

De acordo com a delegada Rosely Molina, titular da Decat, desfechos como o da ocorrência de abandono no pátio do CCZ acabam sendo comuns e limitam o serviço dos policiais, já que para a polícia agir é preciso que a delegacia seja informada dos fatos, mesmo que de maneira anônima, porém, nem sempre isso acontece. “Muitas  pessoas relatam os casos apenas nas redes sociais. Compartilham vídeos no Facebook, se comovem, deixam mensagens de revolta, mas isso não basta, é preciso denunciar formalmente os casos”, explica.

Para tentar contornar a situação, neste ano a Decat implantou um canal de denúncias. Pelo telefone 3325-2567, é possível fazer denúncias, mesmo que de maneira anônima. Para quem optar por se identificar, a delegacia dá o feedback e deixa o denunciante por dentro do andamento dos casos informados.

Parcerias

A luta contra a arbitrariedade com bichos não é solitária e forma uma verdadeira rede de apoio. Além dos denunciantes que informam, da polícia que investiga e da Justiça que pune, existe o incansável trabalho de órgãos e de protetores independentes que acolhem e tomam à frente no enfrentamento aos maus-tratos. Em Campo Grande existem cinco Ongs (Organizações Não Governamentais) registradas, porém, dezenas de protetores independentes se dividem no ofício.

“Nosso trabalho se torna difícil porque falta apoio do Poder Público. Sobrevivemos de doações, de desconhecidos, nos mantemos pelas redes sociais, e mesmo assim, a situação financeira é bem complicada”, revela a advogada Adriana Freitas, assessora jurídica voluntária de Organizações Não Governamentais e de protetoras independentes.

Além das ONGs e da Decat, a Prefeitura também fiscaliza casos de maus-tratos e abandono. Segundo a assessoria de comunicação da administração municipal, vistorias zoosanitárias são realizadas de acordo com denúncias recebidas no CCZ (Centro de Controle de Zoonoses). Se constatada a infração, o Centro pode autuar o dono do animal e impor as penalidades vigentes na legislação. As multas variam entre R$ 100,00 (cem reais) e R$ 15.000,00 (quinze mil reais). Quando o responsável não é encontrado a infração é publicada no Diogrande (Diário Oficial de Campo Grande).

“Não basta apenas ter medo da punição em caso de maus-tratos, é preciso ter consciência de que ter um animal é coisa séria, demanda tempo e cuidados. Infelizmente muitas pessoas agem por impulso, levam um bicho para casa, depois começam a deixá-lo sofrer. Consciência é a palavra chave, é preciso pensar muito bem antes de assumir a responsabilidade de adotar um animal de estimação”, aconselha a delegada Rosely.

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