Até criminosos ‘viram pastores’ e igrejas admitem falta de fiscalização

Ainda não há sistema de fiscalização no Estado

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Ainda não há sistema de fiscalização no Estado

Nos últimos meses, a denominação ‘pastor’ tem ocupado páginas policiais em jornais de Campo Grande. Suspeitos de cometerem crimes se intitulam pastores sem que, necessariamente, tenham alguma formação teológica ou tenham passado por um concílio, ou avaliação para que possam exercer a função em algumas igrejas evangélicas. A situação revolta os tradicionais.

Em entrevista com pastores e membros da comunidade evangélica, a informação dada para a equipe de reportagem do Jornal Midiamax é de que não há fiscalização. “Há pessoas que abrem uma porta de igreja sem conhecimento do Conselho de Pastores e, infelizmente, não temos como fiscalizar”, afirma o presidente do Conselho Estadual de Pastores, Edilson Vicente da Silva.

Ou seja, nem todos os que se dizem pastores, realmente podem ser chamados assim. De acordo com o pastor Ronaldo Leite, vice-presidente do Conselho de Pastores de Campo Grande, para se tornar pastor de igrejas históricas, deve-se cursar teologia, o que leva de 3 a 4 anos. Após esses anos de estudo, a pessoa passará pelo concílio, uma espécie de “exame” para se tornar pastor, em que tópicos como vocação, teologia e outros assuntos referentes à igreja são questionados.

A princípio, para se tornar pastor, a pessoa deve receber o “chamado de Deus”. A partir daí, se dedica exclusivamente ao estudo e conhecimento teológico, para então poder seguir carreira pastoral. O problema é que, algumas vezes, pessoas com pouco conhecimento decidem abrir uma igreja e se dizem pastores por ter arrebanhado um grupo de fiéis.

Para o pastor Carlos Osmar Trapp, a formação teológica também não é suficiente. “A formação não faz pastor, mas aquele que é chamado por Deus se prepara, estuda e não vai agir como alguém que não tem o devido preparo”, diz.

Punições

De acordo com Ronaldo Leite, os pastores que são membros dos conselhos e passam por situações de desvio de conduta, são excluídos e banidos do meio evangélico. Em determinados casos, eles são ajudados pela igreja, para retomarem a moral, mas não exercem mais a função de pastor. “Aqueles que se envolvem em crimes, geralmente, não participam de conselhos, porque já são mal intencionados”, afirma.

Para o pastor Edilson, a situação é a mesma retratada por Leite “Todo mundo erra, mas é raro os pastores, os reais homens de Deus, se envolverem nesses tipos de crime. Eles são homens que dão a vida pelas pessoas”, diz.

“Como abrir uma igreja”

Procurando em páginas de busca na internet a frase “como abrir uma igreja”, o primeiro site relacionado dá dicas e apresenta até um manual de como abrir uma igreja legalmente. É possível entender que há certa facilidade para que qualquer pessoa possa abrir uma igreja, com registro em cartório.

O pastor Trapp diz que certa vez andava em um ônibus quando ouviu alguém dizer “eu vou abrir uma igreja para mim também”. Para ele, muitas vezes as pessoas pensam no lado monetário e querem ganhar dinheiro com as igrejas. “Nós combatemos isso, o foco não pode ser o dinheiro. O pastor tem que ser alguém cristão, deve ter o chamado de Deus para esse ofício e estar preparado”, conta.

Ainda de acordo com Carlos Osmar Trapp, a pessoa, seja pastora ou não, monta uma diretoria composta por presidente, vice, tesoureiros, secretários, conselheiros e requer um CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica). Além disso, a igreja deve ter pelo menos 30 fiéis, que assinam um documento no primeiro culto para que seja oficializado.

Para o pastor Edilson, essa facilidade nem sempre é algo ruim, pois muitas vezes pessoas humildes que poderiam estar envolvidas em crimes, conseguem se encontrar nessas pequenas igrejas e deixar de lado a vida de marginalidade.

Todos podem errar

Os pastores reafirmam que todos podem errar, mas que dificilmente aqueles envolvidos com o evangelho e com a igreja entram no mundo dos crimes. “Você passa na frente de alguns lugares, o sujeito nem sabe falar português direito, se diz pastor e começa a arrebanhar algumas pessoas. A falta de qualificação contribui sim para possíveis deslizes, mas quem tem formação também pode cometer erros”, afirma Carlos Osmar.

Para o pastor Edilson, o julgamento criminal cabe à polícia. “Em todo lugar encontramos pessoas boas ou ruins. Nós desaprovamos absolutamente os crimes e se chega no nosso conhecimento essa pessoa é excluída, isolada e a polícia que cuide dela”, diz.

Falsos pastores

Para Ronaldo Leite, os fiéis devem sempre prestar atenção na vida pessoal dos pastores, antes de entregarem a fé nas mãos deles. “Tem que analisar o caráter, o convívio familiar desse pastor, o equilíbrio no casamento dele. Se ele tem qualquer desvio de conduta, já se sabe que não tem caráter aprovado. Um pastor tem que ser exemplar”, afirma.

O pastor Antonio Dionizio da Silva, da Assembleia de Deus no Ministério Missões, reforça a necessidade da própria igreja de analisar os pastores. “A Assembleia é criteriosa para separar pastores. Eles passam por auditoria, para que a igreja possa saber do passado da pessoa, se ela realmente tem curso de teologia e o chamado para o pastorado”, diz.

A igreja oferece curso para os pastores, mas confirma que algumas pessoas acabam sendo passadas para trás por falsos ministros. “Os mais humildes podem acabar aceitando pessoas que só querem explorar elas e ganhar mais e mais dinheiro. Porém, quando isso chega ao conhecimento da direção, esse falso pastor é retirado da igreja”, afirma Dionizio.

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