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Brasil

Sob Bolsonaro, Abin espionou políticos, jornalistas e ministros do STF, diz PF

Programa pode ter sido destinado à vigilância ilegal de adversários do governo do ex-presidente
Agência Estado -
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Fachada da Abin. (Reprodução, X)

Uma operação da Polícia Federal colocou a Abin (Agência Brasileira de Inteligência) no centro de uma investigação sobre espionagem de políticos, advogados, jornalistas e ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) durante o governo de Jair Bolsonaro (PL). Nessa sexta-feira (20), dois servidores da agência foram presos sob suspeita de usar indevidamente um sistema de geolocalização de celulares do órgão. Segundo a PF, o sistema FirstMile fez 33 mil monitoramentos ilegais sob a gestão Bolsonaro.

Pelo menos 1,8 mil usos desse programa foram destinados à vigilância ilegal de adversários do governo do ex-presidente, conforme informações do jornal O Globo. A lista inclui um homônimo do ministro do Supremo Alexandre de Moraes – o que, para os investigadores, reforça a suspeita de que o magistrado tenha sido alvo do esquema de monitoramento pela agência. Para não deixar vestígios, a “gangue Abin de rastreamento”, como são chamados os servidores alvo da operação, apagou dos computadores a grande maioria dos acessos, de acordo com reportagem da TV Globo.

Software

O sistema FirstMile é capaz de detectar um indivíduo com base na localização de aparelhos que usam as redes 2G, 3G e 4G. Para encontrar o alvo, basta digitar o número do contato telefônico no programa e acompanhar em um mapa a última posição. Desenvolvido pela empresa israelense Cognyte (ex-Verint), o software se baseia em torres de telecomunicações instaladas em diferentes regiões para captar os dados de cada aparelho telefônico e, então, informar o histórico de deslocamento de quem está com o celular (mais informações nesta página).

A PF afirmou que o grupo sob suspeita teria usado um “software intrusivo na infraestrutura crítica de telefonia brasileira” para rastrear celulares “reiteradas vezes”. À época, a Abin era comandada por Alexandre Ramagem, aliado de Bolsonaro e hoje deputado federal pelo PL do Rio.

Reunião

Na reunião ministerial de abril de 2020 – que levou à abertura de inquérito para apurar possível interferência de Bolsonaro na PF – o então presidente reclamou de não receber informações da PF e outros órgãos de segurança. “Sistemas de informações, o meu funciona. O meu particular funciona. Os que têm oficialmente desinformam. E, voltando ao tema, prefiro não ter informação a ser desinformado em cima de informações que eu tenho”, disse.

Em nota, a Abin disse que a corregedoria-geral da agência concluiu, em fevereiro deste ano, correição extraordinária – uma apuração interna – para verificar a regularidade do uso de sistema de geolocalização adquirido pelo órgão em 2018. A partir das conclusões dessa correição, foi instaurada sindicância investigativa no dia 21 de março. De acordo com a Abin, a ferramenta deixou de ser utilizada em maio de 2021. Ramagem, por sua vez, afirmou que o FirstMile foi adquirido antes do governo Bolsonaro e que, ao assumir a agência, determinou uma auditoria interna e encaminhou o contrato do sistema de espionagem para a corregedoria interna.

Detidos

Os dois servidores presos ontem são Rodrigo Colli e Eduardo Arthur Izycky. Eles foram detidos no Distrito Federal. Em 2016, Izycky participou como palestrante da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre crimes cibernéticos, na Câmara dos Deputados. Ele atuou em investigações contra terrorismo cibernético por ocasião da visita do papa Francisco ao Brasil, em 2013, e da Copa do Mundo de 2014. Naquele período, atuava também em questões de segurança envolvendo os Jogos Olímpicos do Rio, realizados em agosto de 2016.

De acordo com a PF, “além do uso indevido do sistema, apura-se a atuação de dois servidores da agência que, em razão da possibilidade de demissão em processo administrativo disciplinar, teriam utilizado o conhecimento sobre o uso indevido do sistema como meio de coerção indireta para evitar a demissão”.

Além de vasculharem a sede da Abin, em Brasília, agentes fizeram buscas em endereços em São Paulo, Goiás, Paraná e Santa Catarina As ordens foram expedidas por Alexandre de Moraes, que determinou, ainda, o afastamento de cinco funcionários da agência – dois eram diretores do órgão. Na casa de um deles, Paulo Maurício, a PF apreendeu quase US$ 172 mil em espécie durante as diligências. Outro alvo da operação é o filho do general da reserva Carlos Alberto dos Santos Cruz, ex-ministro de Bolsonaro. Caio Cesar dos Santos Cruz teria participado das tratativas de venda do programa usado indevidamente para espionagem.

Crimes

A investigação mira possíveis crimes de invasão de dispositivo informático alheio, organização criminosa e interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei. As defesas dos citados não foram localizadas pela reportagem.

A Abin é o órgão principal do Sistema Brasileiro de Inteligência (Sisbin) e tem como função fornecer informações estratégicas ao Palácio do Planalto. Os informes são enviados ao Executivo via relatórios, com a finalidade de evitar possíveis ameaças ao estado democrático de direito e à soberania nacional. O atual diretor-geral da Abin é Luiz Fernando Corrêa, nomeado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em maio.

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