Para juristas, filmagem de professores viola direitos e é inconstitucional
Juristas ouvidos pelo jornal O Estado de S. Paulo nesta segunda-feira, 29, afirmaram que a filmagem de professores em sala de aula, como propôs o ministro da Educação, Abraham Weintraub, pode violar direitos fundamentais dos educadores e é inconstitucional. A Constituição Federal determina que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a […]
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Juristas ouvidos pelo jornal O Estado de S. Paulo nesta segunda-feira, 29, afirmaram que a filmagem de professores em sala de aula, como propôs o ministro da Educação, Abraham Weintraub, pode violar direitos fundamentais dos educadores e é inconstitucional.
A Constituição Federal determina que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”. Na avaliação do jurista Leonardo Bertolazzi, sócio-coordenador da área de propriedade intelectual do escritório Braga Nascimento, o direito à imagem é “inviolável”.
Ele diz ainda que Lei de Direitos Autorais (9.610/1998) é clara ao estabelecer que a gravação de uma pessoa depende de sua autorização expressa. Bertolazzi diz que há várias medidas legais que permitem aos professores acionarem judicialmente alunos que filmarem o conteúdo autoral, como as aulas, ou usarem a imagem sem consentimento. “Um trecho de uma aula, retirado de um contexto, pode prejudicar a imagem do profissional. Isso pode impulsionar diversas demandas judiciais e, em última análise, sobrecarregar o judiciário com esse tipo de pedido”.
O constitucionalista Saulo Stefanone Alle, do Peixoto & Cury Advogados, reforça que para um aluno poder filmar um professor é preciso autorização ou em caso de previsão contratual da instituição de ensino. “A propriedade do professor, o seu modo de ensinar e o conhecimento organizado, fazem parte de uma obra intelectual. Por isso, é preciso respeitar os direitos patrimoniais dos docentes”.
Professores contratados em regime de educação à distância assinam contratos temporários que podem ser renovados periodicamente para que o conteúdo possa ser atualizado e continuar sendo divulgado. Para Stefanone Alle, no entanto, há uma diferença considerável: o objetivo da gravação. “Um caso é gravar o professor com sua autorização por conta do estudo relacionado ao curso. Outra situação é gravar com a finalidade de constranger, tirando de contexto e atrapalhando a discussão dentro da sala”.
Ele lembra que a Constituição de 1988 prevê ainda a “liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber”.
‘Censura velada’
Já o filósofo Luiz Bueno, professor da Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP), diz que os professores são respaldados pela liberdade de cátedra e que é um valor fundamental do professor a liberdade de ensinar sem ter de passar o conteúdo pelo crivo dos alunos ou dos pais. “É exatamente o contrário. Ele tem de ter liberdade e autoridade para poder determinar conteúdos e processos avaliativos”, afirma.
Para ele, a ideia de filmar um professor não traz acrescimento ao processo de aquisição de conhecimento. “Vem num clima de denúncia, de controle, de fiscalização da atividade do professor É uma forma velada de censura que tende a prejudicar o ambiente educacional. É um movimento que aparenta um discurso de liberdade mas esconde uma forma de censura, é típico de regimes totalitários”.
Relembre o que disse o ministro
O ministro da Educação afirmou ao Estado que filmar professores é um direito dos alunos. “Não incentivo ninguém a filmar uma conversa na rua, mas as pessoas têm o direito de filmar. Isso é liberdade individual de cada um. Vou olhar os casos com calma. Não faremos nada de supetão”, afirmou Weintraub. O ministro afirmou ainda que o objetivo não é criar um clima de “caça às bruxas” e que os direitos dos professores será preservado.
O que diz a lei sobre a liberdade ideológica no ambiente universitário e escolar?
O direito brasileiro é explícito em configurar os ambientes de sala de aula e de pesquisa, nos níveis escolar e universitário, como espaços de liberdade aguda para a expressão de teorias, ideias e opiniões. Isso é dito tanto na Constituição quanto nas leis que regulam os ensinos fundamental e médio no Brasil, como é o caso da Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Por isso, qualquer medida que agrida a essa liberdade, concreta ou potencialmente, é em princípio contrária ao direito.
É preciso ser ambicioso na interpretação para reconhecer as muitas formas que essas agressões podem tomar, sob pena de diminuir a efetividade da proteção legal: não apenas demissões ou sanções formais, mas também denúncias difamatórias em redes sociais ou grupos de mensagens, como também procedimentos disciplinares puramente intimidatórios, se tiverem por objetivo constranger ideologicamente professores, não têm amparo legal. Essa é uma via de mão dupla: tampouco alunos podem ser perseguidos, intimidados, ridicularizados, ou prejudicados nas suas avaliações ou no ambiente escolar em razão de sua posição política divergir da posição do professor.
Qual sua avaliação sobre filmagens ou gravação de áudios de docentes no ambiente escolar e acadêmico?
Todos têm direito a não ter sua imagem e voz gravadas e divulgadas sem prévio consentimento expresso. A Constituição protege nossa imagem como parte de nossa privacidade de maneira muito forte, classificando-a de ‘inviolável’. Assim, a conduta de filmar e divulgar uma pessoa sem seu consentimento – mais ainda com o intuito de constrangê-la no exercício de seu direito de livre exercício profissional ou liberdade científica – é flagrantemente ilegal.
Aulas e palestras são também patrimônio intelectual do professor e não podem ser gravadas, muito menos divulgadas, sem sua expressa autorização. A violação desses deveres dá ao professor direito de reparação por danos morais ou materiais, conforme o caso.
Como devem agir as instituições de ensino nesses casos?
Entendo que a direção de um estabelecimento educacional tem o dever de colocar-se ao lado do professor agredido e defendê-lo contra violências e intimidações praticadas por alunos e pais. Como empregadores, as escolas são responsáveis pela integridade de seus funcionários (professores) em sua relação de trabalho, devendo protegê-los de constrangimentos ilegais e assédios de qualquer natureza. Ao receber a notícia de que um professor está sofrendo intimidação ou agressões presenciais ou virtuais por suas posições políticas e ideológicas, a escola tem o dever de agir em sua proteção.
Os casos em que o direito permite o uso de filmagem não autorizada de alguém limitam-se às situações em que tal filmagem é constituída como prova para a defesa contra um crime de que se é vítima. Assim, é perfeitamente lícita a conduta de uma aluna filmar, clandestinamente, o assédio sexual de seu professor para defender-se de suas investidas, fazê-las cessar, e vê-lo punido; mas é ilícito o ato de intimidar o professor no livre exercício de sua profissão apenas por divergir de sua posição ideológica ou político-partidária, ou por não compartilhar da opinião dele sobre Jair Bolsonaro, Lula, Olavo de Carvalho ou Paulo Freire.
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