Investigado por corrupção no Detran-MS questiona inquérito: ‘não quebraram sigilo bancário’
Advogado aponta fragilidade do inquérito e estranha fato da polícia não tentar chegar em quem recebeu o dinheiro
Gabriel Maymone –
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Investigação conduzida pelo Dracco (Departamento de Repressão à Corrupção e ao Crime Organizado) sobre corrupção no Detran-MS (Departamento Estadual de Trânsito de Mato Grosso do Sul) causou estranheza pelo fato de não apurar o destino do dinheiro proveniente das fraudes, que poderia chegar a poderosos apontados como verdadeiros chefes do esquema.
Investigação policial identificou em fevereiro deste ano série de alterações em documentação de caminhões feitas de forma irregular no sistema do Detran-MS, pela servidora Yasmin Osório Cabral, que agia em conluio com o despachante David Cloky Hoffaman Chita. O grupo abordava empresários e exigia quantia para liberar o veículo.
O vídeo em que o despachante denuncia políticos do PSDB como verdadeiros chefes do esquema e aponta nomes como o deputado federal Beto Pereira e o ex-prefeito tucano em Nova Alvorada do Sul – e ex-diretor do Detran-MS – Juvenal Neto, foi enviado pelo PGJ (Procurador-Geral da República), Romão Ávila Milhan Júnior, ao PGR (Procurador-Geral da República), Paulo Gonet.
Conforme apurado pela reportagem do Jornal Midiamax, a investigação não pediu a quebra do sigilo bancário dos investigados. Recentemente, inquérito da PF (Polícia Federal) sobre suposto esquema de venda de sentenças no TJMS (Tribunal de Justiça de MS) quebrou o sigilo fiscal de todos os investigados, por exemplo. O objetivo desse tipo de prática é percorrer o caminho do dinheiro e identificar todos que se beneficiaram dos valores angariados pelas fraudes.
Após a conclusão das investigações, o inquérito foi encaminhado ao MPMS (Ministério Público de MS), que também não se manifestou para que as apurações avançassem. Dessa forma, ofereceu denúncia contra os operadores do esquema.
Advogado diz que inquérito é frágil
Em entrevista ao Jornal Midiamax, o advogado Mikhail Monteiro, que defende Hudson Romeiro Sanches – outro despachante investigado no processo -, afirma que causou estranheza alguns pontos do inquérito, que se mostrou frágil.
“Investigação terminou e não se sabe o valor [proveniente das fraudes], não consta. Para que conta foi? Não tem. Por que não pediram quebra do sigilo do David, que é o principal investigado? Não pediram quebra do sigilo da Yasmin. Por que não quebrou sigilo bancário?“, dispara o advogado.
O advogado que é especialista em direito criminal estranhou o porquê as investigações pararam na hora de apurar os destinatários do dinheiro, ou seja, quem recebeu o valor das fraudes. “Não é comum que seja oferecida uma denúncia fraca como essa, estamos falando de uma delegacia especializada”, pontuou.
Para tentar provar que seu cliente ‘caiu de paraquedas’ no inquérito, Mikhail pontua que anexou aos autos toda a movimentação financeira de Hudson. “Nós apresentamos o do Hudson, porque ele precisa voltar a trabalhar [ele está com registro de despachante suspenso]. Mas ali, parou, não se investigou. Porque, se quebram o sigilo bancário do David, dá para saber, em tese, de onde veio e para onde foi o dinheiro, mas isso não aconteceu”, diz o advogado.
Despachante alega que senha foi usada por outra pessoa
Contra o despachante Hudson Romero, o inquérito aponta que houve 27 tentativas na senha dele de baixar um documento que teria sido fraudado.
No entanto, ele afirma que seria praticamente impossível ele ter tentado baixar tantas vezes um documento no sistema do Detran-MS. “Não foi eu. No sistema, aparece que documento não pode ser baixado. Sou despachante vai fazer 15 anos. Se sistema está acusando que o documento não pode ser baixado, porque vou tentar baixar de novo?”, explica.
Dessa forma, uma das hipóteses levantadas pela defesa é de que a senha de Hudson pode ter sido usada por outra pessoa. “A pessoa que usou tentou várias vezes porque não sabe como funciona as diretrizes do programa”, alega.
Corrupção no Detran-MS: operações com suspeita de blindagem
O despachante, que confessou operar no esquema, alega que órgãos de investigação de Mato Grosso do Sul estariam agindo deliberadamente para blindar políticos do PSDB implicados no caso. Assim, ele quer formalizar um acordo de colaboração para apresentar todo o rol de provas que implicariam Beto Pereira como o verdadeiro chefe do esquema de corrupção no Detran-MS.
Segundo David Chita, as operações policiais seriam sempre orquestradas para ‘dar satisfação à opinião pública’ e salvar a pele dos poderosos implicados.
No entanto, apesar de detalhar inúmeros fatos e apresentar provas, Chita garante que tem “muito mais” para apresentar, assim que o MP o chamar para firmar o acordo. “Só que não falei tudo, nem 30% do que eu sei. Tem coisas de 1 ano e meio atrás, coisas de 4 anos atrás que estou segurando”, afirma.
Isso porque Hoffaman diz no vídeo que teve conhecimento de conluio dos entre MPMS, delegados e políticos para que o Dracco não chegasse aos verdadeiros chefes do esquema, assim como ocorreu em outras operações contra fraudes no Detran-MS e também denunciadas em matérias jornalísticas do Midiamax.
Servidores da Sejusp que atuam na Cotra (Corregedoria de Trânsito) ouvidos pela reportagem confirmam blindagem também por parte do MPMS. “Todos lá dentro sabem até que os delegados da corregedoria chegaram a pedir ajuda ao Gaeco para investigar este esquema de fraudes, que tem proporções nacionais e pega muita gente graúda do PSDB aqui em MS. Só que o pessoal do MP deu pra trás. Não quiseram e usaram como desculpa que já estava tudo na mão da Medina”, relatam.
O esquema de propinas e fraude no sistema de cadastro do Detran-MS não é novo e foi denunciado antecipadamente em reportagem do Núcleo de Jornalismo Investigativo do Jornal Midiamax em 2020. Na época, esquema para anular multas de ‘playboys’ mostrou a corrupção dentro do órgão. Operação policial confirmou as denúncias e até chegou a alguns servidores, mas a suposta blindagem de políticos na atuação do MPMS e de delegados de polícia manteve o grupo a salvo.
A reportagem tentou contato com a delegada Ana Claudia Medina, que recusou as ligações e não respondeu às mensagens. O espaço segue aberto para manifestação.
Já o Dracco emitiu nota sem responder o porquê a investigação não quebrou sigilo bancário dos investigados, limitando-se a dizer que: “O inquérito foi concluído no prazo legal, e o Ministério Público Estadual apresentou denúncia, já recebida, com ação penal em curso”.
A DGPC (Delegacia-Geral de Polícia Civil) foi questionada pela reportagem sobre abertura de procedimento na Corregedoria para apurar as denúncias. No entanto, não houve resposta até esta publicação. O espaço segue aberto para posicionamento.
Questionada sobre o porquê as investigações não apuraram o destino do dinheiro, a Polícia Civil, através da Sejusp (Secretaria de Estado de Segurança Pública), limitou-se a dizer que “o inquérito foi concluído no prazo legal, e o Ministério Público Estadual apresentou denúncia, já recebida, com ação penal em curso”.
Em nenhum momento Beto Pereira ou sua assessoria responderam aos questionamentos feitos pela reportagem sobre as denúncias apresentadas por David.
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