Além das suspeitas de que tenha mudado lei estadual para favorecer o filho de um ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça), o governador (PSDB) alterou a Lei Orgânica 95 através da Lei Complementar 257, autorizando os advogados da PGE (Procuradoria-Geral do Estado), pagos com dinheiro público, a atuarem na defesa de pessoas físicas, como o próprio governador, em processos por improbidade.

Conforme apurou o Jornal Midiamax, a mudança foi feita meses após a Operação Vostok ser deflagrada em pelo STJ e um mês antes da nomeação de Leonardo Campos Soares da Fonseca, filho do ministro Reynaldo Soares da Fonseca, na Procuradoria de Representação em Brasília.

Na prática, os ‘ajustes' permitem inclusive que o filho do ministro do STJ monitore os andamentos de processos naquela corte, segundo servidores, já que é nomeado na Procuradoria de Representação da PGE de Mato Grosso do Sul em Brasília desde janeiro deste ano.

A mudança permite também que os servidores defendam os secretários estaduais, além de pessoas ocupantes de cargos de comando superior e de direção superior do Poder Executivo em ação civil pública, ação popular, ação de improbidade, ‘mediante requerimento'.

‘No apagar das luzes'

A alteração que resultou em mudanças na Lei Complementar 257, de 21 de dezembro de 2018, foi publicada no Diário Oficial do Estado no dia 26 de dezembro. As mudanças são apontadas por servidores de carreira da PGE que falaram com o Midiamax como ‘manobra de interesse político' supostamente orquestradas como resposta à Operação Vostok, que tem Reinaldo Azambuja entre os alvos. Segundo eles, tudo foi feito ‘ao apagar das luzes'.

O texto do Executivo solicitando a mudança foi protocolado na Assembleia Legislativa em 11 de dezembro do ano passado. No dia 19, já tinha tramitado por todas as comissões da Casa com pareceres favoráveis.

Neste mesmo dia, recebeu uma emenda do deputado (DEM), que era o presidente da CCJR (Comissão de Constituição, Justiça e Redação), que incluía a previsão de nomeação para a Procuradoria de Representação em Brasília feita diretamente pelo Procurador-Geral do Estado.

Tudo foi aprovado no mesmo dia em plenário. No dia 20, foi para a redação final e encaminhada ao governo para ser sancionada no dia seguinte.

Concursado em MS, transferido para Brasília

Esta seria a terceira alteração em lei promovida pelo governo de Reinaldo e supostamente ligada ao filho do ministro. As outras duas, segundo apontou a Folha de S. Paulo, foram alterações na Lei Orgânica da Procuradoria do Estado, feitas no ano de 2016, mas com data retroativa.

Antes de nomear filho de ministro em Brasília, Reinaldo mudou lei e liberou defesa pela PGE

Leonardo foi nomeado procurador em Paranaíba no dia 24 de setembro de 2015, mas ficou pouco tempo em Mato Grosso do Sul. Menos de um anos depois, teve a transferência autorizada para Brasília.

A volta do advogado para a Capital Federal se tornou possível depois da lei, aprovada em setembro de 2016, retroagir ao dia 2 de agosto daquele ano e permitir a transferência antes mesmo de cumprido o período de estágio probatório.

Desta vez, no entanto, o governador incluiu nas atribuições a defesa de pessoas físicas, diferente do que prevê a Lei, que institui a PGE como órgão que atua para defender os interesses do Estado.

Já Leonardo Campos Soares da Fonseca foi beneficiado, segundo servidores, com a nomeação para o cargo feita diretamente pelo Procurador-Geral do Estado. Antes, o nome de Leonardo teria que ser avaliado pelo Conselho de Procuradores.

Na publicação da nomeação de Leonardo em Brasília, em 15 de janeiro deste ano, a resolução é assinada apenas pela Procuradora-Geral do Estado Fabíola Marquetti Sanches Rahim, a contar de 21 de janeiro.

Antiguidade e férias

Leonardo é contestado pela PGE no STJ após ter pedido na Justiça para ter direito à promoção por antiguidade e aquisição de férias, mesmo estando afastado da procuradoria em Paranaíba.

Em resposta, o órgão manifestou-se contrário afirmando que o afastamento do servidor ‘tem natureza jurídica de cessão', o que demonstra que ele foi transferido após consulta, e não requisitado como alegou a gestão de Reinaldo, justificando que a mudança ‘decorreu de expressa previsão do código eleitoral'.

No entanto, a Resolução TSE 23.484/2016 e a Resolução TSE 23.523/2017 afirmam que as requisições são vedadas em casos de estágio probatório, diferente do que disse o governo à reportagem da Folha de S. Paulo.

 

Antes de nomear filho de ministro em Brasília, Reinaldo mudou lei e liberou defesa pela PGE

O Jornal Midiamax entrou em contato com a assessoria de comunicação do governo do Estado questionando se o governador fez requerimento de defesa pessoal para a PGE. A reportagem tentou saber ainda quantos servidores já teriam acionado o órgão para serem defendidos, e se há atuação do servidor Leonardo Campos Soares da Fonseca em casos de Reinaldo no STJ.

Até o momento de publicação deste texto, o jornal ainda aguarda as respostas, que serão levadas imediatamente aos leitores assim que chegarem.

Operação Vostok

Reinaldo Azambuja responde a dois inquéritos que tramitam no STJ, decorrentes da Operação Vostok resultante de delação da JBS. Nos casos, são apurados pagamentos de R$ 67 milhões em propina em troca de benefícios fiscais concedidos a empresas no Estado.

Neste ano, a Polícia Federal fez nova rodada de oitivas relacionadas ao caso. Entre os chamados a testemunhas, estava a mãe e o irmão do governador. Reinaldo, por sua vez, disse que nenhuma mencionou seu nome e que ‘a verdade vai prevalecer sobre o caso'.