Contag questiona no STF lei que transfere terras da fronteira à iniciativa privada
Confederação dos trabalhadores na agricultura protocolou Ação no Supremo
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Confederação dos trabalhadores na agricultura protocolou Ação no Supremo
A Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) ingressou com Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no STF (Supremo Tribunal Federal) contra a Lei 13.178/2015 – que ratificou registros imobiliários em terras públicas que são decorrentes de alienações e concessões, e estão em faixas de fronteira -. A lei foi sancionada pela ex-presidenta afastada pelo processo de impeachment, Dilma Rousseff (PT). A normativa entrou em vigor no dia 7 de dezembro de 2015.
A ADI foi protocolada pelo advogado Ivaneck Perez Alves, contra o Congresso Nacional e a Presidência da República.
A Confederação entende que a lei terá um impacto “irreversível sobre a estrutura fundiária de uma parcela significativa do território nacional”.
“A Contag pede que o STF dê à norma interpretação conforme a Constituição para que seus dispositivos sejam aplicados de forma harmônica com a política da reforma agrária, declarando inconstitucionais regras que conduzam a resultados conflitantes com seu objetivo”, explica o Supremo. A questão está nas mãos do ministro Dias Toffoli.
Para os trabalhadores, ao transferir para a propriedade privada um patrimônio público que, como indicam cálculos do Incra, alcança área superior à de vários países europeus, a União estabelece patamar ainda mais desigual na política de terras do Brasil.
“Esta transferência, ainda, ocorrerá em condições extremamente favoráveis aos interesses privados, em condições que poderão incentivar, sem os cuidados, a grilagem e o aumento da violência contra os agricultores e agricultoras familiares que estejam nestas áreas, já que a homologação terá como um dos seus fundamentos os registros cartorários e não as efetivas condições de exploração e ocupação das terras em questão”, declara a Confederação.
O STF explica que a ADI pede ao Supremo que as terras sejam interpretadas conforme a Constituição, para que as terras estejam sujeitas a desapropriação por interesse social.
“De tal modo que a ratificação dos imóveis ou títulos fiquem sempre sujeitos ao regime próprio da titulação de terras rurais originárias de desapropriação por interesse social para fins de reforma agrária, bem como ao regime de legitimação ou reconhecimento de ocupação de terras públicas rurais de domínio da União”, esclarece o STF, no portal.
Entenda a lei
Sancionada por Dilma no dia 22 de outubro de 2015, a legislação afirma que serão ratificados os “registros imobiliários referentes a imóveis rurais com origem em títulos de alienação ou de concessão de terras devolutas expedidos pelos Estados em faixa de fronteira, incluindo os seus desmembramentos e remembramentos, devidamente inscritos no Registro de Imóveis até a data de publicação desta Lei, desde que a área de cada registro não exceda ao limite de quinze módulos fiscais”.
Da regra ficam excluídos imóveis rurais que tenham “domínio questionado ou reivindicado na esfera administrativa ou judicial por órgão ou entidade da administração federal direta e indireta ou que sejam objeto de ações de desapropriação por interesse social para fins de reforma agrária ajuizadas até a data de publicação desta Lei”.
Celso Cestari, ex-procurador federal do Incra (Instituto nacional de colonização e reforma agrária) discutiu a questão no portal jurídico Conjur. Ele afirma a titulação de terras fronteiriças levanta dúvidas e discussões no meio jurídico há muitos anos.
A primeira normativa que estabeleceu parâmetros sobre essas faixas de terra remonta ao Império, de acordo com ele. Era a lei 601/1850 – Lei de Terras – e previa que as terras devolutas localizadas na faixa de 10 léguas (66 quilômetros) da fronteira poderiam ser concedidas “gratuitamente”. Essa permissão integra a prática de ocupação geopolítica das fronteiras e de “ampliação da segurança nacional”.
“Com o fim do Império e a implantação da República Federativa, na Constituição de 1891, transferiu-se o domínio das terras devolutas para os Estados, excepcionando apenas a porção do território ‘indispensável para a defesa das fronteiras’ para a União (artigo 64). Essa porção era a faixa de 10 léguas da Lei de Terras, que foi considerada recepcionada pela ordem constitucional republicana”, explica o ex-procurador do Incra.
Essa ditribuição foi reiterada nas Constituições de 1934, de 1937, de 1946 (na vigência da qual, a Lei 2.597/1955 estendeu o domínio da União para 150 Km da faixa da fronteira), de 1967, de 1969 e, na Constituição de 1988, que estabeleceu o domínio da União sobre as terras devolutas indispensáveis à defesa das fronteiras no seu artigo 20, II.
“Além dessa distribuição de domínio, variável ao longo da história constitucional brasileira, outros requisitos para alienação e concessão de terras devolutas em faixa de fronteira também oscilaram ao longo dos anos. Instituiu-se a necessidade de assentimento prévio de um Conselho de Segurança Nacional na faixa de até 100 Km da fronteira (1934) e depois de 150 Km (a partir da Constituição de 1937); e impuseram-se limites de área (variáveis de 2,5 mil a 10 mil hectares ao longo dos diversos regimes) para essas concessões, a partir dos quais seria necessária a aprovação do Senado Federal, Conselho Federal, ou Congresso Nacional, a depender da época”, esclarece Cestari, no Conjur.
O que o ex-procurador explica, no entanto, é que esse regime de expansão nos Estados possibilitou irregularidades ao não fiscalizar, na prática, as concessões. De acordo com ele, a política de titulação possibilitou “inúmeros atos de privatização de terras sem a observância de tais requisitos, principalmente no que diz respeito às concessões e alienações a non domino, isto é, feitas pelos Estados sobre terras que eram, na verdade, da União”.
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