Durante audiência pública na Câmara Municipal de Campo Grande, realizada para discutir a adesão do município ao programa federal “Ruas Visíveis”, a coordenadora adjunta do Comitê Intersetorial de Acompanhamento e Monitoramento da Política Nacional para População em Situação de Rua (CIAMP-Rua), Joana d’Arc, fez um apelo direto à segurança pública e criticou práticas que ela classificou como “higienistas e segregadoras”.
“Do mesmo jeito que as pessoas que pagam seus impostos e estão domiciliadas têm direito à segurança pública, nós, pessoas em situação de rua, também somos cidadãs dessa terra”, afirmou Joana, que participou do evento acompanhada do filho recém-nascido.
Ela denunciou relatos recebidos pelo Comitê Nacional de ações de internação compulsória e remoções forçadas em comunidades terapêuticas, comparando essas práticas a antigos manicômios. Para ela, essa abordagem desrespeita a dignidade das pessoas e ignora a raiz social da situação de rua.
“Enquanto a sociedade não encarar isso como uma prioridade, nada vai mudar. As pessoas vão para a rua porque é o último recurso, não por escolha”, afirma.
“Nada de nós, sem nós”
Representante da sociedade civil no comitê nacional, Joana também destacou a importância simbólica e prática de ser uma mulher preta, mãe e militante ocupando um espaço estratégico na construção de políticas públicas.
“Só a questão de eu ser uma mulher e estar num espaço de fala que acompanha e monitora as políticas para a população em situação de rua já diz para vocês o respeito que estão tratando a nossa política, que é a política para a população em situação de rua, e o lugar que esse governo [federal] tem colocado as pessoas na situação de rua, que é o lugar onde elas querem estar. O lugar onde elas se sentem à vontade para falar do que é melhor para si e o que é melhor para as outras pessoas que continuam na situação de rua”, ressalta.
Joana também destacou a necessidade de um comitê local ativo em Campo Grande para garantir o diálogo com as pessoas em situação de rua.
“O que falta para se instituir um comitê aqui? Para escutar essas pessoas que estão dispostas a dialogar e dizer o que querem. Não é assim que se faz política pública, empurrando solução pronta. É ouvindo. Não dá mais para fazer política sem ouvir quem vive essa realidade. A gente também vota, tem CPF, RG e quer ser reconhecido como cidadão de direito”, enfatiza.
Sobre a audiência
A audiência pública aconteceu na manhã desta segunda-feira (12/05), proposta pela vereadora Luiza Ribeiro (PT), reunindo autoridades e especialistas de diversos setores em torno da discussão do tema.
Campo Grande contabiliza 1.091 pessoas vivendo em situação de rua, das quais 1.064 estão inscritas no Cadastro Único para Programas Sociais. Os dados foram levantados em março de 2025 e fazem parte de um estudo realizado pelo Observatório Brasileiro de Políticas Públicas com a População em Situação de Rua (OBPopRua/POLOS-UFMG).
O “Plano Ruas Visíveis” envolve sete eixos elaborados pelo Governo Federal: Assistência Social e Segurança Alimentar; Saúde; Violência Institucional; Cidadania, Educação e Cultura; Habitação; Trabalho e Renda; e Produção e Gestão de Dados. O Plano abrange ainda iniciativas como o projeto Moradia Cidadã, o PAR (Pontos de Apoio da Rua), e destinação de recursos a cooperativas de catadores de materiais recicláveis.