A Justiça de Mato Grosso do Sul determinou, no início da noite desta sexta-feira (23), a suspensão imediata da nomeação de Carlos Alberto de Assis ao cargo de Diretor-Presidente da AGEMS (Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos), apontando “vícios formais e materiais insanáveis”
A decisão, assinada pelo juiz Ariovaldo Nantes Corrêa, da 1ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos de Campo Grande, atende a pedido liminar de uma ação popular impetrada pelo deputado estaudal João Henrique Cattan, do PL.
O juiz destacou que Assis, que é bacharel em Educação Física com ênfase em marketing esportivo, “não preenche os requisitos técnicos e legais exigidos para o exercício do cargo, sendo tal nomeação lesiva à moralidade administrativa, ao interesse público e à ordem jurídica”.
A recondução de Assis havia sido oficializada pelo Governo de Mato Grosso do Sul em 23 de abril, garantindo a ele mais quatro anos à frente da autarquia, como noticiou o Jornal Midiamax.
Para a Justiça, o problema não se limita à formação acadêmica do nomeado, mas atinge o próprio modelo de nomeação e os critérios legais que devem reger cargos estratégicos em autarquias reguladoras.
“A especialidade profissional do requerido Carlos Alberto de Assis […] revela-se incompatível com as competências técnicas exigidas para o exercício do cargo de Diretor-Presidente da AGEMS”, frisou o juiz.
A decisão ressalta que, apesar da nomeação ser um ato discricionário do Poder Executivo, ela está “juridicamente vinculada aos limites constitucionais e legais que condicionam a validade da indicação ao regime jurídico inerente às agências reguladoras”. O magistrado ainda alerta para o risco da politização desses espaços, afirmando que cargos como o de diretor-presidente “devem ser blindados contra aparelhamentos político-partidários”.
Assis foi nomeado após ter sido aprovado em votação simbólica na Assembleia Legislativa, durante sessão no dia 22 de abril. O juiz considerou que “a deliberação da Assembleia Legislativa, embora componha a vontade final do ato complexo, não afasta a natureza administrativa da nomeação, tampouco elide o vício de origem”. Na deliberação entre os parlamentares, a nomeação de Assis foi acolhida por 20 votos favoráveis frente a um contrário.
A ausência de formação compatível com áreas reguladas pela AGEMS, como transporte intermunicipal, energia elétrica, gás canalizado e saneamento, foi considerada um fator de “grave lesão à ordem jurídica”. A decisão sustenta que o ex-diretor não possui “expertise para avaliar a pertinência e a regularidade das multas administrativas, dos contratos administrativos, das concessões e dos demais serviços públicos sujeitos ao controle e fiscalização da ALEMS”.
O magistrado também rebateu o argumento do governo de que o desempenho prévio de Assis como secretário de Administração (2015-2018) e como dirigente da AGEMS desde 2021 o qualificaria para o cargo. A Justiça foi taxativa ao afirmar que a continuidade de Assis à frente da autarquia representaria risco concreto de “ineficiência técnica, violação à legalidade e à moralidade administrativa”.
Carlos Alberto de Assis recebeu no último mês, como presidente da autarquia, R$ 33.880,48 em remuneração bruta, somado a outros R$ 11.955,59 de remuneração variável, que pode incluir dentre outras, as verbas indenizatórias do cargo.
A liminar foi concedida com base na legislação federal e estadual que rege a administração pública e as ações populares. A decisão enfatiza que “estão presentes os requisitos para a concessão da tutela de urgência”, especialmente porque “a permanência do requerido […] representa risco concreto de perpetuação da aparente violação aos princípios da legalidade, da moralidade administrativa e do interesse público”.
Com isso, a Justiça determinou “a suspensão imediata dos efeitos do ato de nomeação”, bem como o “afastamento imediato da função até ulterior deliberação”.
O Estado de Mato Grosso do Sul será citado para apresentar defesa no processo. A AGEMS, por ora, continua operando sob a gestão colegiada da diretoria-executiva.
Quem é Carlos Alberto de Assis
Carlos Alberto de Assis tem longa trajetória na administração pública de Mato Grosso do Sul e no setor esportivo. Servidor de carreira da Caixa Econômica Federal, atuou como gerente bancário por mais de 20 anos antes de entrar para o alto escalão do governo estadual.
Na política sul-mato-grossense, Assis ocupou cargos estratégicos durante a gestão de Reinaldo Azambuja (PSDB), sendo secretário de Estado de Administração (SAD) entre 2015 e 2018. Também foi Secretário Especial do Governo e, nos últimos anos, esteve à frente da AGEMS (Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos), onde foi reconduzido ao cargo neste ano, até ser afastado por decisão judicial que apontou ausência de qualificação técnica para o posto.
No esporte, presidiu o Esporte Clube Comercial entre 2007 e 2011 e foi vice-presidente da Confederação Brasileira de Tênis.
A trajetória de Assis, no entanto, também carrega episódios controversos. Enquanto titular da SAD, seu nome foi envolvido em investigação do Ministério Público sobre superfaturamento na compra de 12 mil mapas geopolíticos personalizados de Mato Grosso do Sul. A licitação foi realizada em 2018, e o contrato firmado por R$ 1,4 milhão. Cada mapa custou R$ 120, valor que o MP considerou excessivo diante de outros orçamentos levantados.
O caso levou à formalização de um acordo de não persecução penal, homologado em 2024 pelo juiz Ariovaldo Nantes Corrêa — o mesmo que agora determinou seu afastamento da AGEMS. Pelo acordo, Carlos Alberto de Assis se comprometeu a ressarcir o erário em R$ 24.376,89 e pagar multa civil no mesmo valor.
Outro ponto sensível da passagem de Assis pela SAD está relacionado à Operação Clean, deflagrada em 2021 pelo Gaeco e Gecoc. A operação investigou fraudes em licitações da gestão Azambuja, envolvendo crimes como corrupção, peculato e associação criminosa. Embora seus endereços não tenham sido alvo de busca, Assis era secretário na época dos contratos investigados. A empresa envolvida, Max Limp, era representada por Magali Aparecida da Silva Brandão, que também atuava como advogada de Assis.
A Max Limp, que funcionava em um escritório de advocacia, participou de pregões da SAD em 2015 e 2017. Foi desclassificada inicialmente por apresentar produtos em desacordo com o edital, mas acabou beneficiada por pareceres favoráveis emitidos pelo mesmo servidor comissionado da assessoria jurídica da pasta.
Apesar dos episódios, Assis manteve influência política e respaldo dentro do governo estadual, sendo reconduzido ao comando da AGEMS neste ano.