Advogada suspeita de repassar depoimentos de presos ao PCC é absolvida 

Advogada foi denunciada em 2023 por repassar depoimentos do processo que investigava o latrocínio de um professor em Nova Alvorada do Sul

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Sete pessoas foram presas pelo latrocínio do professor. (Foto: Divulgação/ Polícia Civil MS)

A advogada acusada de repassar depoimentos de presos para membros do PCC (Primeiro Comando da Capital) em fevereiro de 2023 foi absolvida pela Justiça na terça-feira, 28 de janeiro de 2025. 

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Na época dos fatos, a advogada foi denunciada pelo MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) e virou ré por repassar depoimentos do processo que investiga o latrocínio, roubo seguido de morte, do professor Luciano Soares, de 41 anos, ocorrido na noite do dia 17 de janeiro em Nova Alvorada do Sul, a 115 quilômetros de Campo Grande.

Ela também chegou a pedir desligamento de uma das comissões que fazia parte, na OAB-MS (Ordem dos Advogados do Brasil). 

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Em dezembro de 2023, o Secretário-Geral e Corregedor da OAB-MS, Luiz Renê Gonçalves do Amaral, protocolou uma petição em favor da advogada manifestando-se pela rejeição parcial da denúncia.

“Pois o pedido condenatório ministerial claramente desafia a imunidade material prevista tanto no artigo 133 da Constituição Federal como no artigo 2º, §3º, da Lei 8.906/94, sendo de rigor sua absolvição nos termos do artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal, visto que OS FATOS NARRADOS SÃO ABSOLUTAMENTE ATÍPICOS POR SE REFERIREM AO EXERCÍCIO REGULAR DA ADVOCACIA CRIMINAL”, diz trecho da petição. 

Sobre a acusação de que a advogada estaria repassando informações de presos a facção criminosa, o Corregedor-Geral argumentou que a única participação dela no caso foi na juntada de instrumento procuratório dos autos em 20 de janeiro e para prestar assistência jurídica na audiência de custódia. 

“Em suma, o que se tem nos autos é CLARIVIDENTE ATIPICIDADE DA CONDUTA NARRADA, seja porque a advogada está imantada naquilo que realizou pela imunidade profissional da advocacia, seja porque a conduta narrada de fornecimento de cópia de investigação, sem processo-crime instaurado, se subsome ao tipo penal previsto no art. 355 do CP, de modo que a absolvição é medida que se impõe por não constituir o fato narrado infração penal, ex vi do art. 386, III, do Código de Processo Penal”.

Posteriormente, o juiz de Direito, Juliano Luiz Pereira, da Comarca de Nova Alvorada do Sul, verificou que não foram produzidas provas para confirmar a conduta da advogada descrita na acusação. “Ou seja, que a advogada de fato encaminhou cópias dos depoimentos e interrogatórios ao preso. Além disso, em análise ao diálogo não é possível ter a certeza de que a advogada mencionada de fato seja a ré”, afirmou o magistrado. 

O juiz ainda mencionou o depoimento prestado pelo delegado que, de acordo com ele, não é suficiente para afastar a dúvida relacionada à autoria dos fatos. Para o magistrado, seria necessário a apreensão e análise do aparelho celular usado pelo preso para confirmar a autoria da advogada. 

Assim, o juiz determinou a absolvição da advogada. “Dessa forma, considerando o princípio da presunção de inocência, consubstanciado na máxima in dubio pro reo, a improcedência da pretensão punitiva contida na denúncia é medida que se impõe para absolver a acusada, ante a ausência de provas de que realmente praticou o fato descrito na denúncia (CPP, art. 386, VII). Assim, a absolvição da ré é medida que se impõe”.

E na última terça-feira (28), o TJMS deu provimento para alterar a capitulação da absolvição. “A ausência de provas no processo de que a ré praticou o crime de patrocínio infiel impede o acolhimento do pedido recursal condenatório. Se no momento da denúncia a afetação do bem jurídico serviu de elemento indiciário para a acusação, a não transformação da afetação em lesão afasta a antijuridicidade material do fato, tornando a conduta atípica, impondo-se a alteração do fundamento da sentença absolutória”, diz o acórdão do TJMS.

‘Advocacia jamais tolerará violação ou criminalização da atuação profissional’

E quem fez a sustentação oral no julgamento do recurso foi o advogado Lucas Rocha, que representa a colega de trabalho. Ao Jornal Midiamax, o advogado disse que a absolvição ocorreu após intervenção justa e firme da OAB-MS.

“É preciso afirmar que a colega foi absolvida em primeira instância, todavia, após intervenção justa e firme da OAB-MS em defesa do exercício profissional da colega injustamente denunciada, o TJMS reformou a capitulação da absolvição para determinar a absolvição pela atipicidade da conduta, ou seja, a colega agiu estritamente dentro dos ditames éticos e profissionais”, disse Lucas Rocha. 

Ainda, o advogado reforçou que a classe merece respeito e jamais irá tolerar violações ou criminalizações da atuação profissional. “Então, a decisão do TJMS reforça que a Advocacia merece respeito acima de tudo, e mais, importante dizer que a Advocacia jamais tolerará qualquer espécie de violação ou criminalização da atuação profissional”, finalizou Lucas ao Jornal Midiamax. 

Nesta terça-feira (4), a OAB-MS também se manifestou sobre a absolvição da advogada, ressaltando que o Corregedor-Geral “reafirmou o compromisso da gestão pela salvaguarda de direitos dos advogados e a irrenunciável observância da imunidade profissional”.

Por fim, segundo a nota da OAB-MS, a advogada disse que o sentimento é de gratidão e o resultado demonstra um trabalho incansável pela defesa das prerrogativas e exercício da advocacia. “Sempre acreditei nesse resultado, porém, não tenho palavras para expressar meu sentimento de gratidão”, falou à OAB-MS.

Relembre o caso

As informações eram transmitidas a um interno da Penitenciária Estadual de Regime Fechado da Gameleira, liderança da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital).

Conforme informações obtidas pelo Jornal Midiamax, durante as investigações sobre o latrocínio do professor foi descoberto que um dos autores presos teria fugido do estado do Paraná, pois teria matado a esposa e estaria com mandado de prisão em aberto.

Também foi constatado durante as investigações que o latrocínio fazia parte de uma série de crimes que seriam cometidos com o objetivo de levantar dinheiro para organização criminosa. O destinatário das informações seria um interno do presídio da Gameleira, em Campo Grande.

Houve apreensão dos celulares dos envolvidos, após autorização do juiz responsável. Foi identificado que a advogada enviada até Nova Alvorada do Sul para fazer a assessoria jurídica dos presos pelo latrocínio teria sido contratada pelo detento de Campo Grande.

Sete presos pelo crime de latrocínio

Sete pessoas foram presas suspeitas do latrocínio. Quatro são do estado do Paraná, dois de Campo Grande e um de Nova Alvorada do Sul. A prisão de dois deles ocorreu em uma boca de fumo localizada no bairro Zé Pereira, na Capital, na manhã do dia 19, pelo GOI (Grupo de Operações e Investigações).

Os outros quatro foram presos pela PRF (Polícia Rodoviária Federal) no distrito de Nova Casa Verde, quando tentavam voltar para o Estado vizinho. Durante investigação, foi constatado que o grupo do Paraná veio para Mato Grosso do Sul para roubar um veículo. A suspeita é que com o carro seriam realizados roubos e furtos em fazendas e depois o veículo seria levado para o Paraguai.

Diante da informação, na data do crime um dos indivíduos pulou o muro da residência e ‘lutou’ com o professor, em seguida efetuou os disparos, dois no peito e um no pescoço. “Como houve os disparos eles acabaram deixando o veículo para trás e fugiram. Nós identificamos eles prendemos dois em Campo Grande e avisamos a PRF que prendeu os outros 4 no distrito de Nova Casa Verde”, informou o delegado local.

Os quatro vieram para Campo Grande e ficaram na Capital por alguns dias. Depois seguiram para Nova Alvora do Sul, onde um morador da cidade passou informações sobre o professor se tornar uma possível vítima. Na época, a Polícia Civil informou que o professor tinha o carro e a casa com muros baixos, o que foi visto pelos autores como facilitador para o crime.

Durante a operação montada para localizar os suspeitos, foram apreendidas três armas de fogo, celulares, entorpecentes (cocaína, crack e maconha), documentos, dinheiro e dois veículos utilizados para a prática do crime.

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