Fragmentação põe parlamentarismo europeu em crise
O parlamentarismo vive uma crise, principalmente na Europa. Países como Espanha e Itália não conseguem formar governos estáveis, enquanto partidos tradicionais têm dificuldades para manter apoio popular, como no Reino Unido e na Alemanha. A turbulência, segundo especialistas, está ligada à polarização, à fragmentação política e ao declínio dos partidos tradicionais. Noah Wanebo,…
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O parlamentarismo vive uma crise, principalmente na Europa. Países como Espanha e Itália não conseguem formar governos estáveis, enquanto partidos tradicionais têm dificuldades para manter apoio popular, como no Reino Unido e na Alemanha. A turbulência, segundo especialistas, está ligada à polarização, à fragmentação política e ao declínio dos partidos tradicionais.
Noah Wanebo, consultor da firma Harwood Levitt, de Bruxelas, diz que a polarização aumentou a participação nas eleições, dando à democracia europeia mais legitimidade. No entanto, Parlamentos mais expostos ao extremismo, segundo ele, prejudicam a governabilidade. “A polarização entre nacionalistas e liberais, entre comunidades urbanas e rurais, entre Leste e Oeste, acabou com as forças centristas na Europa”, afirma.
De norte a sul na Europa, os partidos tradicionais vão lentamente se esfacelando. Em nenhum país isto é mais claro do que na Espanha. No dia 10 de novembro, os espanhóis foram às urnas pela quarta vez em quatro anos para tentar dar fim ao impasse político que se arrasta desde abril.
Os socialistas, liderados pelo primeiro-ministro Pedro Sánchez, foram os mais votados na eleição de novembro, mas não conseguiram maioria para governar sozinhos – nem um acordo com outro partido de esquerda, o Podemos, dirigido por Pablo Iglesias, foi capaz de dar solidez ao governo – Sánchez agora terá de buscar apoio dos partidos separatistas catalães.
A crise na Espanha passa pela falta de empatia com os dois partidos tradicionais: Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE), de esquerda, e o Partido Popular (PP), de direita. O distanciamento causou a criação de partidos duplicados: o Podemos passou a disputar votos com o PSOE e o Ciudadanos a competir com o PP – mais tarde, o Vox, de extrema direita também atraiu eleitores conservadores. A fragmentação tem sido falta para a democracia espanhola.
Na Itália, a insatisfação com a política tradicional também cobrou um preço. O Movimento 5 Estrelas (M5S) se tornou o partido antiestablishment. A polarização se manteve entre esquerda, representada pelo Partido Democrático (PD), e a direita, encarnada pela Liga, que substituiu a liderança de Silvio Berlusconi. Com três forças antagônicas no Parlamento, a tarefa de formar um governo ficou ainda mais difícil – o país já teve 64 governos desde a 2.ª Guerra.
No Reino Unido – que vai às urnas nesta quinta-feira, o problema vai além da crise dos partidos tradicionais. A questão é a ausência de carisma dos líderes das duas maiores legendas. O premiê conservador, Boris Johnson, sofreu derrotas humilhantes no Parlamento e só não caiu porque seu rival, Jeremy Corbyn, do Partido Trabalhista, é ainda mais odiado.
Até a inabalável democracia alemã tem dado sinais de cansaço. Após as eleições de 2017, a União Democrata-Cristã (CDU), de Angela Merkel, levou 171 dias para formar uma coalizão com o Partido Social-Democrata (SPD). A aliança funcionou até que os social-democratas elegeram uma nova liderança: Norbert Walter-Borjans e Saskia Esken, a nova direção do SPD, levaram o partido mais para a esquerda, esticando a corda e ameaçando o acordo com a CDU.
“A falta de um líder forte, que atenda não só à agenda de uma corrente ideológica, somado a fatores históricos peculiares de cada um dos países, aumentam a fragmentação partidária”, explica o professor e consultor internacional, Guilherme Athia, sócio da agência Atlântico.
João Paulo Carvalho, ESPECIAL PARA O ESTADO / MADRI, O Estado de S.Paulo
08 de dezembro de 2019 | 06h00
O parlamentarismo vive uma crise, principalmente na Europa. Países como Espanha e Itália não conseguem formar governos estáveis, enquanto partidos tradicionais têm dificuldades para manter apoio popular, como no Reino Unido e na Alemanha. A turbulência, segundo especialistas, está ligada à polarização, à fragmentação política e ao declínio dos partidos tradicionais.
Londres
Muitos britânicos esquecem ou não sabem que o Reino Unido após a guerra ficou com uma dívida gigantesca e precisava renovar sua base industrial, diz sociólogo Foto: Facundo Arrizabalaga / EFE
Noah Wanebo, consultor da firma Harwood Levitt, de Bruxelas, diz que a polarização aumentou a participação nas eleições, dando à democracia europeia mais legitimidade. No entanto, Parlamentos mais expostos ao extremismo, segundo ele, prejudicam a governabilidade. “A polarização entre nacionalistas e liberais, entre comunidades urbanas e rurais, entre Leste e Oeste, acabou com as forças centristas na Europa”, afirma.
De norte a sul na Europa, os partidos tradicionais vão lentamente se esfacelando. Em nenhum país isto é mais claro do que na Espanha. No dia 10 de novembro, os espanhóis foram às urnas pela quarta vez em quatro anos para tentar dar fim ao impasse político que se arrasta desde abril.
Os socialistas, liderados pelo primeiro-ministro Pedro Sánchez, foram os mais votados na eleição de novembro, mas não conseguiram maioria para governar sozinhos – nem um acordo com outro partido de esquerda, o Podemos, dirigido por Pablo Iglesias, foi capaz de dar solidez ao governo – Sánchez agora terá de buscar apoio dos partidos separatistas catalães.
Pedro Sánchez
Pedro Sánchez é um economista madrilenho de 47 anos Foto: Emilio Morenatti / AP
A crise na Espanha passa pela falta de empatia com os dois partidos tradicionais: Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE), de esquerda, e o Partido Popular (PP), de direita. O distanciamento causou a criação de partidos duplicados: o Podemos passou a disputar votos com o PSOE e o Ciudadanos a competir com o PP – mais tarde, o Vox, de extrema direita também atraiu eleitores conservadores. A fragmentação tem sido falta para a democracia espanhola.
Na Itália, a insatisfação com a política tradicional também cobrou um preço. O Movimento 5 Estrelas (M5S) se tornou o partido antiestablishment. A polarização se manteve entre esquerda, representada pelo Partido Democrático (PD), e a direita, encarnada pela Liga, que substituiu a liderança de Silvio Berlusconi. Com três forças antagônicas no Parlamento, a tarefa de formar um governo ficou ainda mais difícil – o país já teve 64 governos desde a 2.ª Guerra.
No Reino Unido – que vai às urnas nesta quinta-feira, o problema vai além da crise dos partidos tradicionais. A questão é a ausência de carisma dos líderes das duas maiores legendas. O premiê conservador, Boris Johnson, sofreu derrotas humilhantes no Parlamento e só não caiu porque seu rival, Jeremy Corbyn, do Partido Trabalhista, é ainda mais odiado.
Boris Johnson
Em um duro revés para Johnson, o Parlamento adiou de sábado para segunda-feira a votação sobre o acordo alcançado na quinta-feira entre Londres e a UE Foto: Jessica Taylor / Parlamento britânico / AFP
Até a inabalável democracia alemã tem dado sinais de cansaço. Após as eleições de 2017, a União Democrata-Cristã (CDU), de Angela Merkel, levou 171 dias para formar uma coalizão com o Partido Social-Democrata (SPD). A aliança funcionou até que os social-democratas elegeram uma nova liderança: Norbert Walter-Borjans e Saskia Esken, a nova direção do SPD, levaram o partido mais para a esquerda, esticando a corda e ameaçando o acordo com a CDU.
“A falta de um líder forte, que atenda não só à agenda de uma corrente ideológica, somado a fatores históricos peculiares de cada um dos países, aumentam a fragmentação partidária”, explica o professor e consultor internacional, Guilherme Athia, sócio da agência Atlântico.
“Espanha e Itália têm dificuldade maior para escolher seus líderes, porque o regionalismo ainda é forte. Na Espanha, há o País Basco e a Catalunha. Na Itália, as diferenças entre o norte e o sul são gritantes”, explica Athia. “O tempo de líderes históricos, como Winston Churchill (ex-premiê britânico), passou ”
Miguel Anxo Bastos, da Universidade de Santiago de Compostela, acredita que o mesmo diagnóstico pode ser aplicado à Espanha. “Felipe González (PSOE) e José María Aznar (PP) foram excelentes líderes. Cada um à sua maneira e respeitando as diferentes ideologias, ambos conseguiram governar. Eles faziam discursos impactantes e conseguiam convencer as pessoas. Hoje, a Espanha está longe de ter bons líderes. Nenhum deles é convincente”, afirma.
Jovens não se sentem representados por líderes
Em 1945, com o fim da 2.ª Guerra, os sistemas parlamentaristas europeus passaram, geralmente, a ter um modelo com dois partidos: centro-esquerda (social-democratas) e centro-direita (conservadores). As siglas menores formavam uma oposição quase inofensiva aos grandes partidos ou se uniam a eles em coalizões. Esse paradigma, porém, ruiu na mesma intensidade com que caiu a popularidade dos partidos tradicionais – e as legendas pequenas se fortaleceram, dificultando a formação de um governo.
Na Espanha, o grande símbolo da fragmentação partidária está entre as pessoas de 20 a 35 anos. Segundo dados oficiais, levando em conta apenas o eleitorado mais jovem, os resultados são apertados: PSOE (24%); PP (21%); Vox (17%); Podemos (15%); Ciudadanos (13%) e Más País (10%). “Eu sempre votei na esquerda, pois acredito que minhas convicções políticas estão mais alinhadas a ela. Mas não me sinto representado por Pedro Sánchez (PSOE) ou Pablo Iglesias (Podemos)”, afirma a estudante Maria Hernandez, de 23 anos. Além da falta de líderes, a fragmentação, especialmente entre os mais jovens, também pode ser explicada pelas transformações sociais do mundo.
“Vivemos em um tempo onde tudo é efêmero. Estamos na época do imediatismo: aplicativos para relacionamento, comida, roupa e entretenimento. Tudo é para já. E com a política não poderia ser diferente. Todos querem um resultado imediato, um retorno rápido e sabemos que as esferas políticas são mais complexas que isso”, afirma o professor e consultor internacional, Guilherme Athia. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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