Reverenciado por crianças e adultos, o tereré ganha um dia especial para ser lembrado e cultuado no . A comemoração acontece sempre no último final de semana de fevereiro. E para mostrar que a bebida já está graduada, neste sábado (25), Universidade Nacional de Villarrica del Espíritu Santo faz uma conferência em sua homenagem.

Segundo informações da professora Patrocínia González, a atividade envolve professores e também alunos da instituição e está ligada aos costumes fronteiriços. “Esta é uma festa tradicional que nos remete aos tempos da do Paraguai e não pode ser esquecida”, explica Patrocínia.

Independente da classe social, praticamente em todo território paraguaio, e também do lado brasileiro, principalmente no Mato Grosso do Sul, o tereré é considerado um elemento de inclusão. É uma bebida que tem espaço em qualquer ambiente e cada vez mais ganha apreciadores.

Um dos mais recentes convertidos é o galã global Cauã Reymond que passou uns dias em MS. Durante as gravações da novela ‘Terra e Paixão', o ator conheceu a bebida e ficou encantado. O encontro entre Reymond e o tereré foi intermediado por uma fã de , onde o ator ficou hospedado.

Cauã Reymond provou da bebida durante intervalos das gravações de novela (Reprodução/Redes Sociais)

“Não faz cara de nojo”

Dentro de um veículo, no banco do motorista, o próprio ator registrou a movimentação sobre o seu primeiro contato com a erva-mate. Uma moça que trabalha em empresa de transporte ensinava como fazer tereré, mas o artista não estava entendendo nada.

“Não, não, explica direito. Calma, sem ansiedade. Esse aí é quem?”, perguntou. “Tereré”, respondeu a moça. “E aí, você vai me dar um tereré de presente?”, indagou Cauã Reymond. “Vou servir um tereré aqui para o Cauã, tô ensinando aqui pra ele como a gente faz”, explicou ela.

Logo em seguida, uma moradora que estava ao lado decretou: “Eu quero ver você tomar, Cauã”. “Mas eu vou tomar, quem disse que eu não vou?”, respondeu ele. “Vai lá, experimenta”, disse a moça que o apresentou o tereré, enquanto a moradora completou: “Não faz cara de nojo'”.

Ainda de dentro do carro, do banco do motorista, Cauã Reymond se filmou pelo retrovisor tomando seu primeiro tereré. “Muito gostoso, hein”, opinou o global. “Deixa eu ver se ele não fez cara de nojo mesmo”, cobrou a moradora. “Claro que não. Quer ver?”, retrucou ele. “Eu quero”, rebateu ela.

Ritual diário

Na sua passagem pela cidade, Cauã teria consumido a bebida mais de uma vez, como revelam relatos de que estiveram com ele em outras oportunidades. “Hoje o tereré foi diferente. Na fazenda e com participação do Cauã Reymond. Posso dizer que zerei a vida”, escreveu Marcia Guerra em suas redes sociais.

Longe das câmeras e mais ambientado com costumes fronteiriços, o engenheiro agrônomo Rafael Augusto Dias Coca conta ao Midiamax que o consumo da bebida é diário e já está incorporado à sua rotina. “Todos os dias, antes de sair de casa, primeiro preparo minha garrafa com gelo e erva”, conta o douradense que há quatro anos mora em San Inácio, no Departamento de Missiones, onde trabalha.

“Quando saio com alguns colegas paraguaios, eles sempre preparam um ‘yuyo' (a pronúncia em Guarani é ‘jujo'), ou remédio, como eles sempre falam. Normalmente é refrescante, mas tem para dores, diuréticos e pode ser encontrado nas bancas de raizeiros aqui do Paraguai”, revela o engenheiro agrônomo, que consome tererê desde que era criancinha.

“A erva aqui também é um pouco diferente da nossa, no Brasil a nossa erva é verde e aqui ela passa por um processo de cura, ou descanso por um período de até dois anos, o que acaba mudando um pouco o sabor e cor”, explica Rafael que tem um espaço reservado dentro da caminhonete para guardar o kit de tereré.

Monumento na entrada de faz referência ao tereré (Foto: Valdemir Almino)

Indígenas e soldados

Apesar do tereré ser reverenciado em terras brasileiras, há estudos que apontam a bebida como genuinamente paraguaia, uma vez que teria surgido nas comunidades indígenas guarani-nhandeva e também guarani-kaiowá.

Entretanto, há relatos históricos que sua difusão aconteceu durante a Guerra do Paraguai e também da Guerra do Chaco. Nessa versão, as tropas dos países envolvidos começaram a beber mate frio para não acender fogueiras que denunciariam sua presença ao inimigo na região fronteiriça onde atualmente estão localizadas Ponta Porã e Pedro Juan Caballero.

Na pesquisa “Tereré: patrimônio cultural de Mato Grosso do Sul”, o professor Carlos Barros Gonçalves, da UFGD (Universidade Federal da Grande Dourados) destaca a importância cultural da bebida para os dois países.

“O consumo da bebida, ou algo próximo ao que hoje chamamos de tereré, seja bem mais antigo e remeta aos povos indígenas no continente, em especial os Guarani”, explica o pesquisador, ressaltando o valor do tereré no contexto cultural dos dois países.

Patrimônio Imaterial

Na verdade, a bebida, nascida em solo fronteiriço e expandida em meio à guerra, se tornou um símbolo de confraternização entre brasileiros e paraguaios. Entretanto, ela teve uma de suas práticas, a roda de tereré, suspensa tanto no Brasil quanto no Paraguai, diante da pandemia da Covid-19.

“Estamos aos poucos retomando esse costume de partilhar a bebida com familiares e amigos. É um momento em que podemos nos reunir e colocar a conversa em dia. Isso faz muita falta no nosso dia a dia”, comenta o comerciante paraguaio Esteban Canhete, um dos que sentiu falta das rodas de tereré.

Mais do que uma área de comércio que impulsiona as duas cidades gêmeas (Ponta Porã e Pedro Juan), a fronteira é palco de tradições vivenciadas dos dois lados. O consumo do tereré é um deles e aparece em um monumento que dá boas-vindas aos visitantes, com a imagem de uma cuia e também de uma guampa.

Há pouco mais de dois anos, o tereré rompeu as fronteiras e foi reconhecido mundialmente como Patrimônio Imaterial da Humanidade, por meio de suas “Práticas e saberes tradicionais na cultura da medicina. Bebida ancestral guarani no Paraguai”. A declaração foi feita pela Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura).