Fone de ouvido escutando algo, saco de gelo para colocar no isopor e kit de barbeiro em mãos. É assim que, diariamente, Tiago Dornelas, de 22 anos, desce do ônibus e começa a rotina, na Rua 14 de Julho, região central de Campo Grande. Enquanto não consegue emprego formal em uma barbearia, corta cabelos e faz barba na rua, mostrando que realmente sonha em viver desta profissão. E na demora do cliente, não perde tempo: “Olha a água, água geladinha aqui. Só R$ 2”.
Logo cedo, por volta das 8h, ele chega na 14, que é uma das principais vias da cidade, e já a encontra movimentada, com carros e pedestres apressados ou então funcionários adentrando lojas. E foi ali, após ver vídeos de barbeiros atuando na rua, pela internet, que Tiago adquiriu a coragem e inspiração que precisava para empreender.
Desta forma, há dois meses, fez amizades ali, seja com os vendedores ambulantes ou funcionários de lojas da região. “Ele vende água, corta cabelo e até ajuda vendendo bolo e café. Acho que é um bom marketing para ele, quando abrir a barbearia muita gente vai gostar de saber desta história. É um cara esforçado e ainda faz faculdade de noite”, afirmou o vendedor ambulante Moisés dos Santos de 19 anos.
Barbeiro fica analisando cabelos de pedestres, brinca amigo
No dia a dia, Moisés diz que Tiago fica analisando o cabelo dos pedestres. “É muito engraçado. Ele gasta um tempo analisando os cabelos e cuida dos moradores de rua. Pega eles, oferece o corte de graça ou então cobra dois reais. Já vi ele muitas vezes fazendo isso, então, acaba sendo um serviço social também. E nessa brincadeira o Tiago me ensinou muito, eu era bem tímido, hoje sou mais cara de pau e consigo conquistar muitos clientes”, opinou.
Após breve “apresentação” do amigo, Tiago chega com um cliente. É quando ele conta um pouco da trajetória e diz que ainda aguarda o certificado de barbeiro profissional e, por isso, não foi em barbearias pedir emprego.
“Me formei no mês anterior e, assistindo vídeos, vi que em São Paulo e Paris tem alguns barbeiros ousados, trabalhando na rua. Foi quando eu decidi fazer o mesmo. Mas, eu sonho com um emprego formal e o meu espaço próprio. Aqui é uma batalha, tudo em nome do meu sonho, mas, a gente enfrenta sol forte, calor e o principal eu acho, que é o mau humor das pessoas”, lamentou.
‘Se eu fosse de barbearia renomada ia ter fila aqui’
Desta forma, Tiago discorre sobre o preconceito de muitos e o fato de muitas pessoas não darem valor no trabalho dele e de quem está nas ruas diariamente. “Tem gente que fala assim: de graça nada presta, então, nem aceita conhecer o meu trabalho. Penso que as pessoas sempre vão criticar quem parece menor. Se eu tivesse nome e fosse de uma barbearia renomada, pode ter certeza que ia ter uma fila para cortar cabelo comigo”, avaliou.
Sem jamais deixar o sonho de lado, Tiago já tem até o nome para futura barbearia: Ogazzo. “Eu cantava rap antigamente, só com os meus colegas mesmo, então, usava esse nome. E quando tiver a minha própria barbearia vou manter o mesmo nome. É de origem italiana, um sobrenome, acho bem Bonito“, comentou.
Nas ruas, Tiago ainda não fez uma tabela, mas, comenta que trabalha com preços populares. “Faço o corte a R$ 15, se acrescentar a sobrancelha fica R$ 15, daí tem a barba, o pezinho, fica tudo nessa faixa. São preços populares, mais para ajudar mesmo, porque eu fico aqui até 18h30, então, preciso pagar o meu almoço e também ajudar minha mãe. Em casa, é só eu e ela”, disse.
Um dos clientes de Tiago, o missionário Luis Escobar, de 26 anos, disse que é muito legal encontrar pessoas que amam e isso chama a atenção no trabalho de Tiago. “Ele me abordou e entendi que ele precisa destes incentivos, então, estou aqui e vejo que ele se torna uma inspiração. O sonho dele vai ser cumprido”, finalizou.
Veja o vídeo do barbeiro atuando nas ruas de Campo Grande:
