Depois de ficar paraplégico, artista monta ação para mudar calçadas em seu bairro
‘Será que eu passo?’ é o nome do projeto de ação do cadeirante
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‘Será que eu passo?’ é o nome do projeto de ação do cadeirante
Todos nós estamos sujeitos a ‘n’ tipos de situações em nossas vidas. Uma coisa é fato: nascemos, aprendemos a andar e seguimos com a vida até a morte. Segundo religiões, alguns acontecimentos já estavam pré-estipulados a ser concebidos e para outras, apenas foi uma missão que nos foi dada.
Podemos estar andando tranquilamente num parque, tropeçar numa pedra e cair de uma maneira boba e de repente, ficar paraplégico por uma ação inesperada. Ou então, podemos estar entrando em casa e levarmos um tiro nas costas, de um vizinho maluco e isso, pode vir a nos deixar entre a vida e a morte.
Para o artista plástico José Eduardo Borges Daniel, a última analise do parágrafo acima foi o que o fez ter sua vida completamente mudada em segundos. Com 44 anos, Zé Edu encontrou a um ano e meio, um novo desafio: aprender a andar com a cadeira de rodas.
Em 18 de fevereiro do ano passado, enquanto entrava em sua residência, um vizinho muito descontrolado, o parou para culpar o sumiço de uma TV. Na época, o vizinho tinha a plena certeza de que o roubou partiu de alguém da vila em que o artista plástico mora – vale lembrar que o imóvel é de sua família. Só que, intrigado, Zé Edu o retrucou alegando que não tinha na a ver com a história e quando menos esperou, virou as costas para abrir a porta de sua casa, e levou um tiro, a queima roupa, do vizinho.
“Naquele momento cai no chão, não passou todo um filme na minha cabeça, como dizem nos filmes e livros, mas me preocupei com minha filha, que estava fechando chegando em casa… só sei que ele atirou na pessoa errada”, conta. A filha, Luiza de 19 anos, saiu do litoral de São Paulo para vir morar com o pai, por conta do egresso na Universidade Federal de MS.
A partir de então, o artista plástico que também é pai de Mariana, de 15 anos, teve de reconstruir uma nova vida. “Sabia que poderia ficar paraplégico, algo me dizia isso, mas até os momentos de altos e baixos, enquanto estive no hospital, ficava com o pensamento de reinventar um novo Zé e reconstruir uma vida”.
O mundo da acessibilidade chegou e Zé Eduardo não teve como evitar. Quando se tornou cadeirante de fato, depois de meses em tratamento no hospital, a vida o pegou de surpresa. Viriam novos desafios, como por exemplo, adaptar toda a casa para a vida sobre rodas.
Neste procedimento de readaptação da ‘nova vida’, Zé Edu disse que só na cadeira manual foram 15 tombos – que ele contou, fora os não computados, e na cadeira elétrica, a que ganhou do Estado, já foram mais de cinco.
“Até acostumar demora, acho que todo mundo que um dia tem a vida reprogramada assim como a minha, tem uma dificuldade no aprendizado da ‘vida de cadeirante’, ainda mais com as estruturas da cidade, que não tem acessibilidade garantida”, avalia.
Questão da acessibilidade
Pensando não só nos inúmeros tombos que teve, o artista plástico procurou o MidiaMAIS para falar de um plano de ação. Ele e um grupo de amigos, estão se mobilizando para, pelo menos, modificarem as rampas do quarteirão que mora. “A ideia é que as pessoas possam sentir na pele um pouco dos desafios que a gente passa, porque não é fácil, sair de casa e chegar na esquina e não encontrar uma rampa”, explica.
A mobilização do artista, rendeu uma página ‘Será que eu passo?’ que faz alusão a dúvida que ele tem quando se depara com uma calçada mal projetada. “A gente quer pessoas que apoiem a causa e que, se possível, coloquem a mão na massa, porque não queremos ficar só na teoria, de como é ser um cadeirante e tal, queremos por em prática estas ações”, revela.
Uma das ações estipuladas por Zé Eduardo e pelo grupo está em se dedicarem, ao menos um dia da semana, para construírem as rampas em calçadas da cidade. “Todas as vezes que caí, encontrei pessoas boas que se empenharam para me ajudar a levantar, porque não nos mobilizarmos para não ver mais as pessoas/cadeirantes caírem no chão”.
Durante a nossa entrevista, um dos amigos de infância e colaboradores da causa que Zé Eduardo quer montar, João Henrique Miranda Sá, chegou ao local e nos deu seu depoimento: “acredito que nós temos um potencial tão grande de parceiros para somar que eu posso começar a fazer e me dedicar e até doar um cimento, para construir uma rampa… é começando a fazer pelo meu amigo que posso chamar a atenção das pessoas da minha rua, do meu bairro e da minha cidade, juntos e sentindo na pele somos mais fortes”.
Emocionado, Zé Eduardo que mesmo com a vida modificada, dedica seu tempo a pinturas de quadros, sem ao menos conseguir acesso com tranquilidade para comprar suas telas, diz que o apoio dos amigos, que estão empenhados na causa, é demais de gratificante e revigorante.
“Eu nunca briguei na vida e ganhei um tiro na inocência que me fez modificar toda minha vida, só quero poder ir a qualquer lugar com a minha cadeira e quando eu for, ter condições de passar”, pontua.
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