Veículo não está com as placas originais e foi abandonado em área próxima a bocas de fumo.
O secretário estadual de Desenvolvimento Agrário, da Produção, da Indústria, do Comércio e do Turismo, Pedro Pedrossian Neto, garante que usava dentro da normalidade o carro oficial que ‘sumiu’ da frente da casa dele último dia 22, por volta das 18 horas, e foi abandonado no Jardim Noroeste, neste domingo (31). O veículo usa placas vinculadas, ou seja, que não são as verdadeiras registradas no nome do Governo junto ao Detran-MS.
Para explicar porque estava com o carro oficial após o horário de expediente, Pedrossian Neto recorreu a desculpa parecida com a utilizada pelo secretário da Juventude, Jaber Cândido, suspeito de usar um carro acautelado também do Governo Estadual para frequentar uma faculdade no período noturno. Segundo Pedro, os secretários ‘fazem muitas viagens ao interior e por isso ficam com o carro para pegar a estrada mais cedo’.
No dia em que o carro desapareceu da frente da casa dele, no entanto, ele diz que não tinha nenhuma viagem agendada. Apesar de negar o uso particular, Pedrossian Neto registrou que o poder público estadual somente abasteceria o carro quando haveria uma das tais viagens.
No dia em que a Mitsuboshi Pajero prata, de placas originais HQH-4651 e com placas vinculadas HTN-9587, sumiu, o secretário garante que foi quem abasteceu. “É comum os secretários usarem os carros em atividades particulares porque temos muita atribuições. Porém nesse dia eu abasteci com meu dinheiro”, disse.
O carro foi localizado na periferia de Campo Grande depois de moradores acionarem a polícia. No local, segundo fontes policiais, o veículo foi encontrado sem sinais aparentes de arrombamento e, como a placa checada não era a verdadeira, cogitou-se que se tratava de veículo envolvido em negociações de drogas. A área é conhecida por ter bocas de fumo.
O secretário diz que a suspeita é descabida. “Não sei como os ladrões fazem para abrir uma porta sem deixar marcas, mas pelo que conversei com a polícia eles destruíram o miolo da ignição que liga o carro”, informou.
Pedrossian disse também que é comum, no Governo Estadual, usarem carros com placas que não são as verdadeiras, ou seja, uma placa fixada nos veículos e outra no registro do Detran-MS. O recurso, chamado de ‘placa vinculada’, seria uma forma de proteger os secretários e funcionários de alto escalão.
“Pelo que entendo, essa questão das placas só é feita em virtude de questões de segurança, para que as autoridades não sofram riscos. Isso não se chama placa fria, e sim placa vinculada”, explica.
Pedro conclui dizendo que o BO (Boletim de Ocorrência) foi registrado no dia seguinte ao do roubo, logo pela manhã, porém com as placas antigas, fato que causou estranheza de muitos. “Por isso causou essa conversa de que as placas foram trocadas. Era a placa vinculada”, esclarece.
O caso
O carro foi encontrado pela Polícia Militar após denúncia anônima que informava que um veículo importado estaria abandonado, no terreno baldio, próximo de pontos de venda de drogas.
A polícia foi verificar e encontrou o carro. Pela placa que estava no veículo, HTN-9587, de Campo Grande (MS), os policiais não encontraram nenhum registro. Contudo, ao fazer nova checagem perceberam que um veículo com as mesmas características tinha boletim em aberto de furto. E depois de verificarem as informações foi descoberto que o carro tinha a placa original HQH-4651 (Estado de MS), e a vinculada que estava colocada no veículo.
Juventude
No último dia 13 de agosto, outro funcionário nomeado politicamente para cargo de alto escalão pelo Governador André Puccinelli teve problemas ao usar carro do poder público estadual. O secretário estadual da Juventude, Jaber Cândido, estaria usando o Hyundai I30 preto, de placas NQE-7772, para frequentar as aulas em uma faculdade particular de Campo Grande.
Colegas fizeram fotos do carro no estacionamento da Faculdade e denunciaram. Jaber negou e, embora admita que é matriculado em um curso noturno na Faculdade, garantiu que no dia da foto estava ‘em agenda oficial’.
A instituição desmentiu o secretário com nota oficial, e colegas reafirmaram que ele estaria usando o veículo frequentemente. A governadoria prometeu que o caso seria investigado, mas até o momento não foi publicada nenhuma sindicância. André Puccinelli, questionado sobre o caso, mandou a reportagem ‘perguntar ao Herculano’, referindo-se ao político que indicou Jaber para o cargo de alto salário.
O automóvel flagrado com Jaber está acautelado pela Justiça para a Secretaria Estadual da Juventude, para a qual ele foi nomeado pelo governador. Carros acautelados são entregues para uso do poder público após serem apreendidos com drogas, por exemplo.
Descontrole e placas trocadas
Na secretaria, o assessor Marcos Silva confirmou que há automóveis acautelados sendo utilizados pela equipe, e informou ainda que, no caso da foto, se trata de um veículo de traficante que ainda estaria com as placas originais. “Neste carro nem trocamos as placas, estamos com a placa original, no nome do traficante, de fora”, disse em telefonema à redação.
O total de carros entregues pela Justiça para serem usados pelo governo estadual de Mato Grosso do Sul é um mistério até para quem deveria fiscalizar o uso dos automóveis, geralmente apreendidos com traficantes. Ministério Público, Secretaria de Governo e Senad (Secretaria Nacional Antidrogas) têm informações desencontradas e há servidores que denunciam ‘verdadeira farra’.
“Ninguém sabe ao certo a quantia, mas os indícios são de que não tem controle justamente para dificultar a fiscalização sobre carro acautelado sendo usado para fins particulares. Parece que há até um esquema para trocar as placas, mas esse carro flagrado com o secretário estadual de Juventude estava com a placa original porque o processo não está terminado”, disse à época um funcionário da Secretaria de Estado de Governo.
Oficialmente, o governo do Estado de Mato Grosso do Sul garantiu que possui apenas um carro acautelado para uso do poder público para fins administrativos. Mas, a informação é desmentida pelo Cead (Conselho Estadual Antidrogas). Mesmo admitindo não haver um número exato, o órgão informa que devem existir pelo menos 10 veículos sendo usados pelo governo estadual.
O presidente do Cead, Promotor de Justiça Sérgio Harfouche, afirmou que há, pelo menos, 10 carros acautelados para uso do poder público Estadual, embora não haja um sistema eletrônico que mostre a quantidade exata desses veículos. “Não posso mensurar uma quantidade precisa, porém, pelo menos 10, há sim”, frisa.
Harfouche diz, ainda, que, atualmente, só há uma lista antiga e desatualizada, com cerca de 10 anos, na qual constam mais de 3 mil veículos acautelados ao poder público. “Dependemos de um sistema eletrônico que mostra, em tempo real, quando cada carro é cedido para uso e devolvido. Peço isso há anos”, salienta.
