Grécia prorroga detenção de imigrantes em condições precárias, diz Médicos Sem Fronteiras

O governo da Grécia tem usado detenções sistemáticas de imigrantes e refugiados por tempo indefinido como ferramenta de coerção social. A afirmação, feita em entrevista a Opera Mundi, é de Ioanna Kotsioni, especialista grega em assuntos de imigração do MSF (Médicos Sem Fronteiras). “Trabalhamos na Grécia desde 2008 e esta não é a primeira vez […]

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O governo da Grécia tem usado detenções sistemáticas de imigrantes e refugiados por tempo indefinido como ferramenta de coerção social. A afirmação, feita em entrevista a Opera Mundi, é de Ioanna Kotsioni, especialista grega em assuntos de imigração do MSF (Médicos Sem Fronteiras).

“Trabalhamos na Grécia desde 2008 e esta não é a primeira vez que vemos irregularidades. Infelizmente, a situação só piorou: há uma preocupação alarmante com o impacto que esta detenção prolongada pode acarretar na vida e na saúde física e mental dessas pessoas”, relata Ioanna.

Em abril, Atenas autorizou a detenção de pessoas nessas situações por prazo indeterminado e muitas vezes superior ao limite máximo de 18 meses, até que concordassem em voltar voluntariamente ou cooperassem com um retorno forçado. Tal medida já foi colocada em prática pela polícia grega em centros de detenção no norte do país, em cidades como Paranesti e Fylakio, localizadas na fronteira entre Turquia e Bulgária.

É sabido que o Mediterrâneo é rota de acesso à Europa para milhares de imigrantes e refugiados de países do Oriente Médio – como Afeganistão, Paquistão e Síria – ou também provenientes do continente africano, sobretudo da Somália e Eritreia. Apesar disso, a maioria das pessoas atualmente nos centros de detenção foi presa residindo na Grécia há muitos anos, porém sem documentos ou com papéis que apresentam irregularidades. Isto é, quem é detido não é só aquele chega recentemente ao país, mas também pessoas que moram lá há anos.

Detenção como política de coerção

Segundo a organização médico-humanitária, estima-se que a detenção custe muito mais para as autoridades do que uma iniciativa de direcionamento de imigrantes e refugiados para outros tipos de instalações que tenham intuito de reinseri-los na sociedade.

Entre o período de 2011 e 2013, a Grécia recebeu € 98 milhões de financiamento do Fundo Europeu para Regresso; € 129,5 milhões do Fundo Europeu das Fronteiras Externas; e, € 12 milhões do Fundo Europeu para Refugiados. No total, foram cerca de € 240 milhões (R$ 732 milhões) gastos para despesas relacionadas às operações nos centros de detenção.

No entanto, para Ioanna, independente da crise econômica do país, o governo grego preferiu investir em centros de detenção por uma escolha política de caráter coercitivo. Ou seja, trata-se de um esforço para dissuadir os imigrantes, evitando que eles venham ao país. Uma das ações é, como dito, prendendê–los indefinidamente até consentirem em retornar. Contudo, há casos em que as pessoas simplesmente não poderiam voltar para casa –como em situações de conflitos armados e guerras civis, por exemplo – já que suas vidas correm perigo.

“Quando os refugiados sírios chegaram aqui em 2012, não gastaram nenhum dinheiro para criar instalações para acomodá-los – e estamos falando de mulheres e crianças, extremamente vulneráveis. Ao mesmo tempo, investiram muito na construção de novos centros de detenção com capacidade de receber até 4.500 pessoas. Portanto, são muito claras as prioridades das autoridades gregas”, diz.

O que acontece hoje na Grécia não é um caso isolado. Há muitas semelhanças na filosofia da política migratória de diferentes países europeus, como Itália e Espanha. Além disso, a questão do preconceito e da xenofobia entre a população é um fator que não colabora neste processo de aceitação e inserção de imigrantes e refugiados na sociedade.

“Embora seja um fenômeno global, a detenção não pode ser uma medida automática para ser aplicada indiscriminadamente pelas autoridades, mas deve ser encarado como um último recurso. Afinal, é preciso ter um argumento consistente para justificar a necessidade de deter uma pessoa”, afirma Ioanna. “O problema é que o governo enxerga a imigração como um fato, sem considerar os impactos humanitários que isso acarreta”, completa.

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