Washington é, às vezes, uma cidade fria e cruel, como pode atestar qualquer pessoa que esteja na capital americana neste mês de janeiro. Ninguém sente isso mais fortemente do que Barack Obama, que se prepara, nesta terça-feira, para seu sexto discurso do Estado da União.

O presidente americano ainda tem três anos de governo, mas todos em Washington já estão de olho em quem o substituirá, nas , e no desfecho das eleições legislativas deste ano. À medida que o tempo passa, diminuem as chances de que Obama consiga concretizar algum grande projeto no que resta de seu mandato.

No discurso do Estado da União de 2013, o presidente prometeu agir em três questões importantes: imigração, armas e meio ambiente.

Até o momento, porém, não foram aprovadas leis em nenhuma dessas questões.

Dividido, o Congresso americano bloqueou qualquer tentativa de aprovar projetos que permitissem a imigrantes irregulares permanecer legalmente nos , que aumentassem as restrições a vendas de armas ou que expandissem controles ambientais.

É uma diferença brutal em relação a 2009, quando o jovem e carismático Obama chegou à Casa Branca, em meio a grandes expectativas. Naquela época, todos seus discursos eram admirados. Agora, a pergunta a respeito do Estado da União de 2014 é: será que alguém ainda está escutando?

‘Emperrado’

O presidente tenta não perder o ímpeto, mas parece emperrado.

E, ainda que a Casa Branca tente, não pode atribuir ao Partido Republicano a culpa por todos seus infortúnios. Afinal, no final das contas, foi um pequeno grupo de senadores democratas que impediu a aprovação de leis de controle de armas. Por que Obama não os convocou e os instou a votar como queria?

A resposta disso está na pequena margem de manobra de que Obama dispõe.

Sem ter cortejado o Congresso – nem republicanos, nem democratas -, ele tem pouco capital político no Legislativo. E convencer as pessoas a fazer coisas que elas não querem é muito mais difícil quando você não investiu energia em tê-las ao seu lado.

As pessoas bem-informadas de Washington – pessoas que trabalharam na Casa Branca e jornalistas que cobrem o tema – dizem a mesma coisa: Obama tem problemas de relacionamento, em casa e no exterior.

E, num momento em que sua Presidência parece estagnada domesticamente, os EUA parecem estar se retraindo internacionalmente.

A credibilidade de Obama na Europa está em queda, ante as revelações de espionagem de líderes estrangeiros pela NSA (agência de segurança nacional). Há preocupações no Oriente Médio de que o atual governo americano estaria tentando afastar-se da região o mais rápido possível (a Casa Branca nega isso com veemência e cita esforços diplomáticos no Irã, na Síria e no processo de paz do Oriente Médio, mas a percepção entre líderes árabes é negativa).

Um especialista em Oriente Médio que acaba de voltar de Riad (Arábia Saudita) disse à BBC que os árabes se sentem negligenciados porque os Estados Unidos não os consultam ao decidir suas políticas.

Enfraquecimento

E levando em conta ainda os erros de manejo na questão sobre o ataque ou não à Síria e as confusões envolvendo o site do Obamacare, é fácil concluir que Obama faz o discurso do Estado da União em uma posição mais fraca do que estava um ano atrás.

Seu consolo é que os republicanos estão em uma posição mais fraca ainda. Os índices de aprovação do partido são mais baixos que os do próprio presidente, ante as dificuldades dos republicanos em dialogar com os públicos feminino, hispânico e afro-americano (todos importantes grupos eleitorais).

E, no que diz respeito à desigualdade de renda – algo que deve ocupar grande parte do tempo de Obama neste ano -, os republicanos têm dificuldades em inventar ideias que vão além de “cortemos impostos”.

Isso dá ao presidente um pouco mais de tempo, que pode ser usado para ações práticas nos próximos seis meses – que é basicamente o espaço de tempo que ele terá antes que as eleições legislativas de novembro impossibilitem qualquer iniciativa concreta.

Analistas creem que duas coisas podem ser feitas neste ano: primeiro, pode haver algum tipo (ainda que não muito abrangente) de reforma migratória; segundo, Obama pode usar seus poderes presidenciais para passar por cima do Congresso e tentar aumentar o mínimo, para ajudar a diminuir o abismo entre ricos e pobres.

É muito menos do que a abordagem “vamos mudar o mundo” de seu primeiro mandato. Mas os últimos seis anos suavizaram o idealismo de Obama. O homem que falará perante o Congresso nesta terça-feira é bem mais pragmático.