Tragédia na PF de Dourados que fez do agente ‘Rambo’ uma lenda completa 13 anos

Foi um dia e tanto, que ficou na história de Dourados e guindou para a galeria dos heróis locais o policial federal Marcos, o “Rambo”, considerado o terror dos narcotraficantes.

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Foi um dia e tanto, que ficou na história de Dourados e guindou para a galeria dos heróis locais o policial federal Marcos, o “Rambo”, considerado o terror dos narcotraficantes.

Enquanto a seleção brasileira perdia para a Noruega, o agente da Policia Federal Marcos Antonio Soares Assunção era assassinado numa rua deserta da periferia da cidade. Era terça-feira, 23 de junho de 1998. Zeca do PT começava a campanha que o levaria ao Governo do Estado enquanto as lágrimas da nação brasileira se voltavam para o funeral do cantor sertanejo Leandro.

Foi um dia e tanto, que ficou na história de Dourados e guindou para a galeria dos heróis locais Marcos, o “Rambo”, considerado o terror dos narcotraficantes.

A morte de Rambo foi uma grande tragédia para a Polícia Federal de Dourados assim como foi o Dia das Mães de 2011, quando numa “investigação desastrosa” o policial militar Sandro Alvarez Morel foi assassinado pelo Federal Leonardo de Lima Pacheco. Em ambos os casos os “crimes” chocaram a comunidade de uma cidade sempre cercada pela violência do narcotráfico e pelas idiossincrasias da moderna sociedade neoliberal.

Numa das esquinas da Rua Dezidério Felipe de Oliveira, Rambo foi alvejado por cinco tiros. Morreu instantaneamente. O relógio marcava 13h15. Na época, a Polícia Federal presumiu que o agente Marcos foi atraído para uma emboscada armada por dois de seus “informantes”.

Rambo sucumbiu ao lado de um veículo Saveiro descaracterizado que usou para chegar até o local da sua execução. Na cintura uma pistola Lock nove milímetros fabricada na Austrália. Em outro local do corpo estava um revolver Rossi 38. Dentro do carro Rambo tinha um fuzil Sturn Rugger calibre 5,56 milímetros. Mesmo com este arsenal, o policial federal não teve tempo para reagir.

Filho de pai policial militar e irmão de um policial rodoviário federal, Rambo gostava do que fazia. Tinha apenas 35 anos, era casado e pai de um filho de pouco mais de dois anos. Querido pelos colegas de corporação e reconhecido por grande parte da população era uma lenda viva por causa de sua atuação profissional e sua presença constante em locais públicos.

No mesmo dia do crime a Policia Federal prendeu em flagrante o então estudante de Direito Kleber Rocha Pinto na época com 34 anos por ser suspeito de ter ligações com o crime depois que pistas dadas por testemunhas levaram os policiais até ele.

Kleber era “informante” de Rambo e acabou entregando o seu “comparsa”, o também informante Jaime Favaro, o Jaiminho ou “Gauchinho”, conhecido meliante do Jardim Flórida. Conforme consta no inquérito policial, Rambo, no dia do crime, recebeu um telefonema anônimo alarmando que existia um ponto de drogas na Rua Dezidédio. Rambo foi atraído para a morte.

Consta que nesta “emboscada” Gauchinho usou uma moto de propriedade de Kleber para cometer o crime. Kleber teria visto os disparos.

O jornalista Percival de Souza, do Estadão, em seu livro “Sindicato do Crime” editado em 2006, diz na página 185 um pouco da vida de Rambo. No capitulo IX intitulado “A Noite dos Generais” Percival trata Rambo de “Rambinho” e diz: “os contrastes das relações crime-repressão podem predominar, mas muitos atos nunca fizeram e jamais farão parte dos autos.”

O jornalista segue no livro dizendo que “Rambinho, o agente federal Marcos Antonio Soares Assunção, em Mato Grosso do Sul, chegou a ser o numero 1 em nome da lei na repressão ao tráfico de drogas. Cabelos longos, fuzil nas costas, encarnava o personagem de cinema com eficiência, colocando em perigo o domínio do trafico na fronteira e atingindo expoentes do pó como José Elias dos Santos, o Bagual, um dos principais gerentes de Fernandinho Beira-Mar”.

No livro, Percival diz que “o ódio era grande. O policial federal caçador de traficantes foi emboscado por traficantes, que arquitetaram o plano da morte com um informante traidor do policial. Confiante que estava indo para um encontro em que receberia preciosas informações para mais uma grande apreensão de drogas, Rambinho deixou-se envolver pelo abraço da morte. Já inerte, o corpo recebeu um pontapé nas nádegas”.

O relato do jornalista paulistano reforça o ato heróico de Rambo que, enquanto jazia ante ao choro dos familiares, tinha em “seu nome” um grupo de cerca de 45 policiais numa verdadeira “caçada humana” para capturar Jaime Favaro, o Gauchinho, um rapazola branquela de cerca de vinte anos de idade. Gauchinho fugiu e buscou abrigo na casa de uma irmã na cidade de Laguna Caarapã. Não conseguiu guarida e, com o farnel cheio, se embrenhou numa mata fechada onde foi cercado por policiais.

Cansado, com fome e frio, Gauchinho “reagiu à prisão” e foi morto na sexta-feira, 26 de junho de 1998, três dias depois da “emboscada”. O corpo de Gauchinho transformou-se em peneira. Ficou irreconhecível. Depois de mais de 24 horas de “caçada”, o assassino de Rambo “cercado” pelos 45 policiais recebeu mais de vinte tiros conforme atesta o inquérito policial. Ao sair da mata ao encontro da morte Gauchinho esta portando apenas um revolver Magnum 357. A mega-operação para se “fazer justiça” serviu-se até de avião que sobrevoou a mata para tentar localizar o criminoso que foi acusado na época de participar de outras execuções.

Percival de Souza “justifica” em seu livro que narra além do caso de Rambo outros fatos envolvendo membros do PCC (Primeiro Comando da Capital) que: “O ódio era recíproco. O responsável pela morte de Rambinho virou peneira humana depois de uma longa caçada. Tudo registrado como “resistência e morte”, nos termos da lei, naturalmente”.

Assim se deu a tragédia que abalou a Policia Federal de Dourados em 1998. Ano em que o poder no Mato Grosso do Sul mudou de mãos. Ano em que o Brasil não conseguiu sem pentacampeão. Perdeu de três a zero para a França na final. Ano de tristezas pela perda do cantor Leonardo e de lições para a população douradense e para a segurança pública.

Passaram-se treze anos e mais uma tragédia aconteceu envolvendo um policial federal. Tal como Rambo, o agente Leonardo Pacheco era um bom policial e querido dos colegas. Nos dois casos muitas perguntas podem ficar sem respostas, porém novos paradigmas devem ser elaborados para que fatos tão chocantes não voltem a acontecer.

Rambo, o Marcos Antonio Soares Assunção, não mais retornará do Reino de Hades. Sandro Álvares Morel continuará silente abaixo do mármore frio de sua lápide. Sobraram apenas as lágrimas dos amigos e familiares de Rambo e Morel. Para o “Herói” Rambo, duas ruas com seu nome: uma em Dourados, e outra em Santo Anastácio (SP), onde nasceu e viveu a infância. Agora falta apenas uma homenagem póstuma para o policial militar, outra vítima de “erros anunciados”.

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