Autorizado aborto de feto sem cérebro em MS
Caso definido pelo juiz Carlos Garcete ocorreu em Campo Grande (MS); anomalia foi diagnosticada em mulher grávida de sete meses
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Caso definido pelo juiz Carlos Garcete ocorreu em Campo Grande (MS); anomalia foi diagnosticada em mulher grávida de sete meses
O juiz da 1ª Vara do Tribunal do Júri de Campo Grande (MS), Carlos Alberto Garcete, determinou a interrupção da gravidez de um feto anencéfalo em causa definida na última quinta-feira, mas anunciada somente nesta terça-feira (21).
Médicos afirmam que em situações como estas o índice de morte intra-uterina é alto e a permanência do feto no útero representa um risco a vida da mãe.
Estudiosos no assunto asseguram, ainda, que entre os os recém-nascidos anencéfalos nascem vivos dois de cada tres casos. Desses nascidos vivos 98% morrem ainda na primeira semana. Cerca de 1% sobrevive até três meses. Existem depoimentos na literatura científica de crianças que sobreviveram até um ano sem o auxilio de respiração artificial.
Texto divulgado nesta terça-feira pela assessoria de imprensa do TJ-MS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul) narra que a gestante que teve a autorização para aborta está na 30ª semana de gravidez e, por meio de exame de ultrassonografia, obteve o diagnóstico de que o feto possui anencefalia, isto é, não possui parte do cérebro.
Outros exames, além de confirmarem a anencefalia fetal, atestaram a existência de quatro camadas cardíacas atípicas.
O magistrado, informou a assessoria, considerou o fato de que não há relato, na literatura médica, de sobrevida neonatal de fetos com essa anomalia, assim a continuação da gravidez pode trazer risco à saúde da gestante, além de desgastá-la emocionalmente. O Ministério Público Estadual manifestou-se favorável ao deferimento do pedido.
Em casos como esse, autorização judicial é necessária porque a legislação brasileira considera crime a prática do aborto, seja pela própria gestante ou por terceiro (art.124, art.125 e art. 126 do Código Penal brasileiro).
Apesar dos avanços da medicina, o aborto de feto anencéfalo é uma discussão nacional, visto que o Código Penal Brasileiro permite o aborto somente quando a gestante correr risco de vida ou se a gravidez for resultado de estupro. Fora essas duas possibilidades, o aborto é considerado crime, com pena de 3 anos de detenção para a gestante que provocar ou consentir que provoquem o aborto.
Na sentença, o juiz escreveu: “O tema da interrupção da gravidez do feto anencefálico, no cenário nacional, está a despertar interesses de toda a sociedade, nomeadamente por sofrer influxos, dentre outros, da Filosofia, da Sociologia e da Teologia. Muitos são os detratores, os críticos do entendimento de admitir o aborto, sob autorização judicial, em casos tais, porquanto a gestante não teria a disponibilidade de decidir pela vida do feto, muito menos de decidir sobre o momento da interrupção de uma vida. O fundamento nuclear do entendimento de que o Poder Judiciário não poderia autorizar a interrupção da gravidez seria de que os anencéfalos não estão mortos, uma vez que a Medicina consideraria equivalente à morte a cessação total da atividade encefálica, e não apenas a ausência de atividade elétrica cerebral. O feto anencéfalo, conquanto não possua parte do cérebro, possuiria cerebelo e tronco encefálico”.
Ao tratar do tema, Garcete lembrou que em 2004 a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde promoveu, perante o STF, a ADPF nº 54-DF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental), pedindo que a Corte autorizasse, em todo o território nacional, a prática do aborto em casos de nascituros portadores de anencefalia. O ministro Marco Aurélio de Melo, na qualidade de relator, concedeu, em 01.07.04, liminar para admitir, até o julgamento de mérito em definitivo, do plenário do STF, o abortamento de fetos anencéfalos em todo o território brasileiro.
O juiz da 1ª Vara do Tribunal do Júri acrescentou na sentença: “Na atividade judicante, aliás, não deve o juiz estar inquieto com as pressões populares e com as diversas maneiras de arrostar o problema levado ao exame do Poder Judiciário, pois seu dever é, em última razão, decidir com a isenção necessária”.
E diante da difícil decisão, o juiz acrescentou: “Tive a cautela de, em audiência, ouvir os interessados (mãe e pai) e o médico que forneceu o diagnóstico clínico específico para assim agir, ter a consciência de haver decidido da forma mais justa. A meu ver, restou evidenciado que não há condições biológicas de sobrevida do feto, por se tratar de anencéfalo, conforme bem esclareceu o médico ouvido em audiência. Ademais, os pais demonstraram plena convicção da decisão que tomaram. Nessa senda, não autorizar a interrupção da gestação seria protrair a via crucis, máxime da genitora, marcada que está pela angústia e pelo sofrimento, sentimentos esses cuja análise não compete a ninguém fazê-lo por empatia, porque é “pessoal”; é “subjetivo”; não pode ser “introjetado” por quem quer seja. (…) Não tenho dúvida em asseverar que não permitir que uma gestante possa decidir acerca da interrupção de gravidez, em caso de feto anencefálico, a impor-lhe todos os danos psicológicos da manutenção dessa gestação, é descurar-se que nossa República é inspirada pelo princípio fundamental da dignidade humana (Constituição Federal de 1988, art. 1º, inciso III). (..) Há, sim, uma escolha (a interrupção) que, sem embargo, não ofende o bem jurídico tutelado pelo Direito Penal. Cuida-se (repise-se) de conduta atípica penal”.
Caso Marcela
O jornal o Estadão noticiou em 2006, cinco anos atrás, um caso de feto anencefálico que ficou famoso, ocorrido no município de Patrocínio Paulista., em que uma criança diagnosticada com a anomalia viveu por um ano, oito meses e doze dias após o nascimento.
A menina, batizada de Marcela de Jesus, nasceu no dia 20 de novembro de 2006 e morreu no dia 31 de julho de 2008. Ela não tinha o córtex cerebral, apenas o tronco cerebral, responsável pela respiração e pelos batimentos cardíacos. A menina faleceu em consequência de uma pneumonia aspirativa.
O caso gerou divergências: alguns especialistas, baseados na deficiência de uma definição exata do termo “anencefalia”, levantaram a hipótese de que a menina na verdade sofria de uma malformação do crânio (encefalocele), associada a um desenvolvimento reduzido do cérebro (microcefalia). Outros afirmam que o que houve, na verdade, foi uma forma “não clássica” de anencefalia, como avaliou a pediatra da menina, Márcia Beani Barcellos, profissional que mais acompanhou o caso. Segundo Márcia, a sobrevivência surpreendente de Marcela foi “um exemplo de que um diagnóstico não é nada definitivo”.[8]
Em entrevista concedida quando a criança ainda estava viva, a pediatra afirmou ainda que a discrepância não era só em relação ao diagnóstico intra-uterino, mas aos prognósticos geralmente feitos: “Ela não pode ser comparada com uma criança com morte cerebral, que não tem sentimentos. A Marcela não vive em estado vegetativo. Como ela processa isso, é um mistério!”
Veja a íntegra da sentença da juiz Carlos Alberto Garcete clicando aqui.
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