O leite materno é considerado o alimento mais completo que existe, sendo indispensável para bebês de 0 a 36 meses. No entanto, há diversas situações em que as mães não conseguem ou optam por não amamentar.

Nesses casos, ao invés de leite comum como o de vaca, a alternativa recomendada pelo Ministério da Saúde é recorrer ao banco de leite humano – ou às fórmulas de leite em pó.

O entrave é que Mato Grosso do Sul não possui programas específicos para a distribuição de fórmulas infantis, enquanto os estoques do BLH (Banco de Leite Humano) têm se tornado cada vez mais escassos. Em alguns casos, o bebê pode apresentar rejeição ou dificuldade de absorção do leite materno, tornando os meios judiciais o único recurso disponível para aqueles que precisam do leite em fórmula.

Vanessa Torres, responsável técnica da Maternidade Cândido Mariano e especialista em nutrição maternoinfantil, destaca que o leite materno possui a composição ideal para o organismo do bebê. Por isso, cada mãe produz o leite adequado ao seu filho, o que difere da fórmula infantil que só deve ser utilizada em casos específicos.

“Há fórmulas específicas que dependem do estado clínico do bebê, pode ser para bebês de 0 a 6 meses. Depois de 6 meses a 12 meses e 1 a 3 anos. Contudo, a fórmula infantil é um leite de vaca modificado, ou seja, não tem as mesmas propriedades que leite materno, principalmente no fator de proteção”, explica.

Quem precisa da fórmula?

Embora o aleitamento materno seja amplamente recomendado, muitas mães enfrentam desafios ao amamentar, o que frequentemente resulta no desmame precoce do bebê. Dados da Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) indicam que apenas 38% das crianças brasileiras mamam exclusivamente até os seis meses. Em muitos casos, a alternativa é recorrer à fórmula.

Conforme a nutricionista, o uso da fórmula dependerá do estado clínico tanto do bebê quanto da mãe, mas a amamentação sempre será priorizada. A fórmula será recomendada apenas em último caso, sob orientação médica.

“O leite materno só é contraindicado para mães com HIV (Vírus da Imunodeficiência Humana), HTLV positivo. Nesses casos, vamos direto para fórmula. Há também casos que suspendemos o leite materno devido à alergia ou intolerância e trabalhamos a dieta da mãe com restrição de leite e derivados, para assim, voltarmos com leite materno”, diz Vanessa.

Leite em fórmula
Leite em fórmula (Divulgação, Canva)

Quando o desmame ocorre antes dos 6 meses, o pediatra ou nutricionista também pode indicar o uso de fórmula infantil. O leite de vaca, por outro lado, geralmente recomenda-se apenas para bebês com mais de 12 meses.

Alguns exemplos em que se recomenda o uso de fórmula incluem:

  • Diagnóstico de alergia alimentar;
  • Fissura no lábio palatal ou outras patologias que comprometem a sucção, resultando em prejuízo nutricional e impedimento para a amamentação de crianças até 12 meses;
  • Prematuros com sequelas e/ou comprometimento nutricional;
  • Diagnóstico de doenças congênitas graves com comprometimento nutricional;
  • Crianças alimentadas por sonda;
  • Doença materna que contraindique a amamentação;
  • Infecção materna por HIV;
  • Óbito materno;
  • Crianças que não apresentam ganho de peso adequado para a idade apenas com o consumo de leite materno;
  • Crianças com distúrbio neurológico que comprometa a deglutição e a absorção de nutrientes.

Existem poucas situações em que a amamentação é contraindicada para a mãe, exigindo substituição parcial ou total do leite materno por orientação médica. Segundo o Ministério da Saúde, alguns exemplos incluem os filhos de mães HIV positivo, como citado pela especialista, e filhos de mulheres que fazem uso regular de álcool ou drogas ilícitas, as quais devem interromper a amamentação enquanto consumirem essas substâncias.

Fórmula é inacessível para quem precisa

Aleitamento materno
Aleitamento materno (Divulgação, Governo de MS)

Em janeiro, o Jornal Midiamax contou a história de Yanka Fernanda, uma bebê de 9 meses diagnosticada com uma malformação neurológica que a impede de se alimentar normalmente. Devido ao problema, ela necessita de um leite especial que custa cerca de R$ 300 por lata. Contudo, a família precisa de 17 latas por mês, totalizando aproximadamente R$ 6 mil mensais.

Diante da impossibilidade de arcar com os custos elevados, a família recorreu à Justiça por meio da Defensoria Pública para que o Estado assuma as despesas, já que esse tipo de alimentação não é fornecido pela rede municipal de saúde, mas está previsto no SUS (Sistema Único de Saúde).

Enquanto aguardam uma decisão judicial, os pais dependem de doações, realizam pequenos serviços e até promoveram uma rifa para conseguir pagar pelo leite, tendo inclusive comprado algumas latas ‘fiado’ em farmácias. Após diversas movimentações judiciais, em junho, o processo foi suspenso em cartório, ou seja, o juiz ou a juíza suspendeu o andamento do processo para que o devedor cumpra voluntariamente a obrigação durante o prazo concedido pelo credor.

Alergia ao leite de vaca

Leite em pó
Leite em pó – ilustrativa (Alicce Rodrigues, Midiamax)

Para crianças de 6 a 11 meses que não recebem aleitamento materno, a OMS (Organização Mundial da Saúde) orienta o uso tanto de fórmulas infantis quanto de leite de vaca, o que gera controversas entre especialistas. Já a partir de um ano de vida, as fórmulas infantis ou compostos lácteos não são mais recomendados.

No entanto, em alguns casos, crianças apresentam APLV (alergia à proteína do leite de vaca), necessitando exclusivamente de fórmulas especiais.

“O Leite de vaca (saquinho, caixinha) é recomendável para bebês acima de 2 anos, pois a proteína é diferente e antes disso pode causar alergia. Quando há o diagnóstico da APLV oferecemos uma fórmula específica para tratamento, trabalhamos a dieta da mãe e aos poucos voltamos com aleitamento materno”, explica a especialista que também é presidente dos Bancos de Leite do Estado.

Em casos como esse, o SUS prevê que crianças com até dois anos que são alérgicas à proteína do leite de vaca tenham acesso gratuito às fórmulas alimentares. Em 2019, o Ministério da Saúde incorporou três novas soluções nutricionais: à base de soja; de proteína extensamente hidrolisada, com ou sem lactose; e de aminoácidos.

Mas, apesar de o SUS prever a distribuição dessas fórmulas, não existe uma política pública bem estabelecida para todo o território nacional. Assim, conforme a SBP (Sociedade Brasileira de Pediatria), a criação de programas específicos acaba sendo uma escolha dos estados e municípios.

Lei de nutrição infantil nunca saiu do papel

Bebê
Leite materno é essencial para bebês de 0 a 36 meses (Reprodução, Pixabay)

Em 2018, Campo Grande aprovou o programa de nutrição infantil denominado “Mais Leite”, que previa a distribuição gratuita de fórmula de leite para famílias em situação de vulnerabilidade. O programa tinha como público-alvo lactantes, gestantes e nutrizes, visando atender crianças entre 0 e 3 anos.

Conforme a legislação aprovada, o leite em pó entregue pela prefeitura deveria conter a fórmula infantil à base de proteínas lácteas, enriquecida com ferro, isenta de sacarose e indicada para lactantes de 0 a 36 meses. A fórmula deveria também ter predominância de proteínas do soro do leite em relação à caseína, redução do percentual de gordura láctea, conter maltodextrina e acréscimo de prebióticos.

Além disso, a lei estabelecia que a distribuição do complemento lácteo pela Sesau (Secretaria Municipal de Saúde) ocorreria mediante o cadastramento dos beneficiários, que atendessem às exigências impostas pelo Programa, posteriormente regulamentado pela Rede Municipal de Saúde.

No entanto, o projeto nunca saiu do papel. Conforme a Sesau, embora o Programa de Nutrição Infantil seja uma lei sancionada em 2018, ele não passou pela devida regulamentação. Por isso, não está em execução.

Projeto carecia de reavaliação’

A decisão da Sesau considerou as recomendações do Ministério da Saúde, que preconiza para os estados e municípios o estímulo ao aleitamento materno em crianças até os dois anos ou mais, e que nos primeiros seis meses, o bebê receba somente leite materno (aleitamento materno exclusivo), sem necessidade de uso de sucos, chás, água ou outros alimentos.

“Considerando a desconexão com o que se preconiza pelo Ministério da Saúde, uma vez que este alimento (leite em pó) não é o mais indicado por não conter em sua formulação todos os nutrientes necessários ao desenvolvimento da criança, não houve regulamentação”, esclareceu.

Ainda conforme a Sesau, o programa carece de uma reavaliação e análise criteriosa para sua regulamentação e previsão orçamentária.

A nível estadual, também não há programas específicos que preveem a distribuição de fórmula de leite, conforme afirmado pela SES (Secretaria de Estado de Saúde).

Por outro lado, a Sead (Secretaria de Estado de Assistência Social e dos Direitos Humanos) esclarece que o programa de segurança alimentar que contempla a aquisição de alimentos é o Mais Social, que oferece um crédito mensal de R$ 450 em cartão para cada beneficiário. Contudo, fórmulas, como a Pregomin, uma das mais utilizadas, podem chegar a custar R$ 190,00 a lata de 400g, para cinco dias de uso, ou seja, a conta nunca fecha para quem precisa.

Banco de leite humano é alternativa para mães

Estoque de leite humano
Estoque de leite humano (Henrique Arakaki, Jornal Midiamax)

Uma alternativa para mães que não podem amamentar são os bancos de leite humano. Em Mato Grosso do Sul, cinco bancos de leite integram a rede nacional, sendo quatro em Campo Grande – HR (Hospital Regional de MS), HU (Hospital Universitário Maria Aparecida Pedrossian), Santa Casa e Maternidade Cândido Mariano.

O leite materno protege contra diarreias, infecções respiratórias e alergias. Diminui o risco de hipertensão, colesterol alto e diabetes, além de reduzir a chance de desenvolver obesidade. Conforme o Ministério da Saúde, crianças amamentadas no peito são mais inteligentes, e há evidências de que o aleitamento materno contribui para o desenvolvimento cognitivo.

Nos BLH, o leite é classificado de acordo com suas propriedades, e o pediatra prescreve exatamente o tipo de leite que cada bebê necessita (hipercalórico, colostro, baixa acidez). Dessa forma, o leite entra como uma espécie de ‘medicamento’ para os recém-nascidos, sendo que, um litro de leite humano pode alimentar até dez bebês por dia. No entanto, em meio às baixas temperaturas, o número de doações acaba reduzindo consideravelmente em Mato Grosso do Sul.

Como doar?

Leite humano
Leite humano inserido em sonda de bebê na UTI Neonatal (Henrique Arakaki, Midiamax)

A produção e doação de leite também geram benefícios para a mãe, uma vez que afetam o corpo de forma positiva. Entre esses benefícios, estão a diminuição das chances de desenvolvimento de câncer de útero e câncer de mama, a redução do sangramento uterino pós-parto e a retomada do peso pré-gestação. Além disso, a doação ajuda no conforto mamário e na prevenção da mastite.

Em todos os bancos de leite é possível fazer extração diretamente no local ou em casa. O procedimento dura, em média, 15 minutos. Tanto no Banco de Leite quanto na própria residência da doadora, uma equipe especializada oferece orientações sobre higiene, extração do leite e armazenamento.

Nesta semana, a frente fria enfraqueceu e as temperaturas voltaram a subir, o que resultou na melhora dos estoques no Hospital Universitário. Atualmente, dez bebês recebem leite humano no banco de leite do Humap.

Mães que quiserem doar podem ligar nos telefones:

  • Hospital Universitário de Campo Grande – (67) 3345-3027
  • Hospital Regional – (67) 3378-2715
  • Santa Casa de Campo Grande – (67) 3322-4174
  • Maternidade Cândido Mariano – (67) 3041-4735
  • Hospital Universitário de Dourados – (67) 3410-3002

💬 Receba notícias antes de todo mundo

Seja o primeiro a saber de tudo o que acontece nas cidades de Mato Grosso do Sul. São notícias em tempo real com informações detalhadas dos casos policiais, tempo em MS, trânsito, vagas de emprego e concursos, direitos do consumidor. Além disso, você fica por dentro das últimas novidades sobre política, transparência e escândalos.
📢 Participe da nossa comunidade no WhatsApp e acompanhe a cobertura jornalística mais completa e mais rápida de Mato Grosso do Sul.