Por anos, foi conhecida como cidade onde as famílias fazendeiras faziam morada para fugir da área rural e se aproximar da modernidade. Com isso, na região central da cidade, várias mansões começaram a surgir.

Só que a cidade cresceu. Campo Grande, que celebra aniversário de 124 anos no próximo sábado (26), tornou-se até capital. Essa parte da história a gente já sabe: com o desenvolvimento e a infraestrutura robusta do Centro, o metro quadrado fica caríssimo e acaba por interferir na existência das grandes mansões.

Tanto é que os casarões foram desaparecendo, dando espaço a enormes torres, restaurantes e até lojas de grande porte, como se vê ao longo da Afonso Pena. E quem morava ali acabou migrando para condomínios de luxo – que existem aos montes em Campo Grande, praticamente todos concentrados na mesma região.

As casas que restaram, portanto, despertam a curiosidade de milhares que, todos os dias, atravessam a cidade para trabalhar. Sejam as mansões luxuosas ou os apartamentos milionários que só se vê de “fora”, quem nunca quis saber como vivem as pessoas que pagam milhões por esses imóveis?

Neste aniversário de 124 anos de Campo Grande, o Jornal Midiamax foi em busca de satisfazer esse desejo comum dos campo-grandenses e visitou algumas “casas de milhões”, explicando os detalhes refinados que se transformam em cifrões na venda.

Casas de milhões

Para a corretora Andrea Accorsi, que está no ramo há 13 anos, o que faz um imóvel de luxo é a assinatura dos responsáveis pela construção. No bairro Itanhangá Park, ela mostra uma ‘casa exemplo' em que as atuais famílias ricas preferem o minimalismo. O sobrado tem cerca de 600 m² de área total e 374 m² construídos.

Há uma cascata com queda na piscina, inclusive, o acesso pela “passarela” é por quadrados com parte marmorizada pela piscina. A arquitetura presou por vidros em todas as paredes para favorecer a iluminação do dia. O gazebo na área externa contém um balanço e um sofá para ver o pôr do sol. O imóvel está à venda por R$ 4,7 milhões.

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Casa de luxo assinada pelo arquiteto Gil de Camillo (Henrique Arakaki, Midiamax)

“O cliente desse padrão é sempre exigente, presam pela localidade, pela assinatura do arquiteto, do engenheiro, o imóvel ainda é mais valorizado se tiver peculiaridades, como escultura, uma cascata, um gazebo. Sempre digo que não é o metro quadrado que faz uma casa milionária, mas o que foi investido nela. Por exemplo, se tenho uma casa avaliada em R$ 1,5 milhão, o cliente deve ter, no mínimo, uns R$ 35 mil de Pro-labore”.

A família participa de causas animais e adoção, por isso, há um canil aos fundos, aproveitando a limitação triangular. Apesar de pequena para grandes árvores, há aproveito no paisagismo com plantas e coqueiro espalhados pela varanda.

Gazebo próximo à área gourmet (Henrique Arakaki, Midiamax)

Termo “mansão” ficou no passado?

Há quatro anos atuando na venda de imóveis luxuosos, Luana Salomão explica que o que faz uma casa de luxo, além das peculiaridades da estrutura, é a localização. Aliás, o termo mansão, pouco é usado por corretores, o vocábulo foi substituído por “casas de alto padrão”.

“Temos em Campo Grande alguns bairros conhecidos por ter imóveis de luxo, como o Itanhangá, dos Estados, Chácara Cachoeira… Quando você considera um imóvel na região periférica e um em frente ao Parque das Nações Indígenas há uma grande diferença de valores, começando pelo valor do metro quadrado do terreno, que atualmente é mais valorizado”.

Sacada de apartamento de luxo
Sacada de apartamento de luxo (Nathalia Alcântara, Midiamax)

Outros pontos que definem os cifrões ao bolso são as finalizações de fino acabamento, a arquitetura, o planejamento de imóveis e decorações funcionais. No exemplo de apartamento de luxo escolhido, o bairro Royal Park, o porcelanato indica. O apê tem 346,00 m² orçados em R$ 5,9 milhões.

“Temos uma região muito rica, o agronegócio puxa a economia do Estado, o que colabora para o perfil que procura imóvel de alto padrão. O imóvel de luxo tem um padrão construtivo diferenciado, o porcelanato, bancadas, não só estética, mas o fino acabamento”, detalha.

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Mansão vendida por R$ 6,3 milhões têm quadra de (Infoimóveis)

Por que estão desaparecendo?

Quem nunca passou em frente a uma casa luxuosa e esboçou um “uau”? Com a expansão nos bairros, a classe com maior poder aquisitivo tem migrado para condomínio do padrão. O professor de história Eronildo Barbosa explica três motivos do fenômeno: segurança, novas gerações e moderação do poder.

“Pela história do Brasil, Campo Grande já nasceu uma cidade rica, onde passava o trem, com forte participação de pecuaristas e comerciantes. Eles escolhiam a cidade para morar. Desde essa época, cerca de 20 famílias mandavam e ainda mandam na cidade. Até a década de 70, todos que tinham ou não dinheiro, uma forma de mostrar poder era mostrar a imponência da casa, construir casarão para toda família. O que acontece é que houve uma reprodução material e intelectual das famílias, elas se misturaram e cresceram”.

Diferente do antigo, o professor pondera que os novos dispensavam a necessidade de mostrar o poder aquisitivo pela casa ou carro, se disseminando para status de poder na política, polícia, profissões de serviços e até no mundo do crime.

“Com a evolução do moralismo, as pessoas foram percebendo que era um erro mostrar demais, não é uma questão de perda de aquisição, mas mudança de hábito. Hoje, o rico também percebe que custa muito manter uma casa com 10 quartos. Antigamente, os ricos construíam casas grandes pensando que os filhos iriam fazer morada, mas nora quer morar com a sogra? Família agora só se reúne para festas de fim de ano”, brinca.

Apesar da mudança, o elitismo permanece entre os moradores do padrão. Eronildo enfatiza que a nova geração prefere o convívio com outros do mesmo patamar aquisitivo. A migração para os condomínios de luxo indica a busca por segurança.

“A nova geração mostra seu poder com festas, reunindo pessoas do seu convívio. Alguns não deixaram de ser ricos, mas perceberam que a casa antiga era cafona, preferiram modernizar a arquitetura também, no máximo um sobrado. Atualmente, os valores são outros, um terreno não custa o mesmo que o avô pagou. Aliás, conforme a expansão da cidade, eles preferiram morar em condomínios de maior segurança”.

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Imóvel de luxo (Nathalia Alcântara, Midiamax)

O que aconteceu com as mansões?

Uma forma de aproveitamento das mansões de herança foi aderir a alternativas como adaptação de mansões em imóveis comerciais, como no Jardim dos Estados e Chácara Cachoeira. “Uma casa grande requer manutenção, abandonar sairia caro para essas famílias, muitas foram dando espaço ao coworking [local de trabalho], aos escritórios, os quartos sendo salas de atendimento em áreas nobres”, diz a corretora Andréa.

Luana reforça que o público migra para condomínios diante da “exclusividade” de situações mais cômodas, por exemplo, de menos trânsito registrados em áreas residenciais. Nesses endereços, o público presa por áreas gourmet de amplo espaço, opções de área de lazer, espaço para descanso e imóveis funcionais, como piscina aquecida.

“Um supermercado, uma escola, um comércio, tudo isso traz um trânsito mais intenso. Os bairros estão ficando mais comerciais, morei em duas casas na Rua Rual Pires Barbosa, no Chácara Cachoeira, atualmente não se estaciona com facilidade. Também mudou para movimento até meia-noite. Mesmo sendo um bairro residencial, o número pessoas circulando na rua aumentou. A qualidade de vida de quem prefere condomínio é diferente”.

IPTU de R$ 33 mil, casa de R$ 10 milhões

No perímetro central, há várias casas de luxo à venda. No Infoimóveis, principal site de corretagem, aluguel e venda de imóveis em Mato Grosso do Sul, há dezenas de opções com precinho “camarada”, acima dos milhões. O que os futuros compradores vão fazer com os imóveis quando forem adquiridos, porém, é uma incógnita.

Avaliada em R$ 10 milhões, uma mansão no bairro Itanhangá Park faz menção ao que se esperar de uma casa de milionário. Para se ter uma ideia, só o é orçado em R$ 33 mil. São 9 suítes, 16 vagas de garagem, sala de estar “quilométrica”, banheiras de hidromassagem e até academia com aparelhos dentro do imóvel.

O piso é amadeirando, reforçando aquele aspecto antigo que as casas tradicionais da época tinham. O sobrado tem escadaria de madeira projetada em dois andares. A família que vende o imóvel estampa decoração com móveis antigos, porcelanas, esculturas e um lustre que são um show à parte.

Casa
Casa vendida a R$ 10 milhões (Infoimóveis, Reprodução)

Já na área externa, degraus percorrem um longo caminho até a entrada, o que mostra o tamanho da casa que possui 2.858,00 m². O verde toma conta e impera a jardinagem impecável. Toda a estrutura da casa fica visível, dá para notar os pilares, o teclado milimetricamente alinhado e as vagas para garagem, inclusive com carregador para carro elétrico. A piscina é grande e ainda conta com uma cascata.

Parece hotel

Com a descrição de “mansão no Parque dos Poderes“, o anúncio mais se parece com um hotel, o imóvel de 3.336,41 m² tem duas varandas, três salas de estar, cinco suítes, escritório, depósito e guarita.

Na área externa, além da área de lazer com piscina aquecida e churrasqueira, há uma gazebo cercado por um gramado de perder de vista. São 586,00 m² de área construída, que pode ser sua no precinho: R$ 6,3 milhões.

O muro alto esconde um verdadeiro tesouro de casa, com três salas de estar, duas varandas, 14 vagas na garagem, cinco suítes, três banheiros, adega, piscina aquecida, quadra de areia, aquecedor solar e gazebo.

A área externa alia visagismo com móveis planejados, como o deck amadeirado próximo dos coqueiros. Uma quadra de vôlei, apesar de não ter a descrição do tamanho, é nitidamente ampla só pela foto.

Mansão tem quadra de areia (Infoimóveis)

Piso amadeirado, jacuzzi, campo de futebol

O Itanhangá Park abriga diversas casas do tipo, a maioria de famílias tradicionais. Por R$ 5,5 milhões, um casarão de 2.573,16 m² está à venda, ofertando oito vagas de garagem, uma varanda, cinco suítes, duas salas com televisão, duas salas de estar, duas salas de jantar, escritório, cozinha planejada e hidromassagem.

Também típico na arquitetura mais oitentista, o piso é amadeirado. Os closets dos quartos aproveitam a continuidade da madeira. Parecendo de cinema, um dos quartos ainda tem um sofá embutido em formato arredondado próximo a uma janela. Na área de lazer, tem espaço gourmet coberto, piscina, jacuzzi e campo de futebol.

“Apenas” R$ 9 milhões

No Jardim São Bento, um casarão à venda por R$ 9 milhões aflora o desejo de quem sonha. Até quadra de esportes, piscina enorme e vários pavimentos o local tem. São quatro salas amplas, três quartos e uma suíte. Na área externa, há um bar e churrasqueira.

São 850,00 m² de área construída em um espaço de 2.200,00 m². Na parte externa, há uma cozinha próximo à piscina e quadra de esporte. A imobiliária descreve: “Com um design impecável e acabamentos de altíssimo padrão, cada detalhe dessa residência foi pensado para proporcionar conforto, requinte e elegância aos seus moradores”.