O rompimento da barragem de Brumadinho, em Minas Gerais, completa quatro anos nesta quarta-feira (25). Nessa terça-feira (24), a juíza Raquel Vasconcelos Alves de Lima, da 2ª Vara Criminal Federal, aceitou a denúncia do MPF (Ministério Público Federal) que tornou 16 pessoas ligadas à mineradora Vale e à consultoria alemã Tuv Sud rés no processo. Em Mato Grosso do Sul, os cães do Corpo de Bombeiros Cindy e Duke, junto aos seus militares condutores, ajudaram a identificar pelo menos três vítimas. Atualmente, os dois cães estão aposentados.

Após o rompimento da barragem, no dia 25 de janeiro de 2019, três militares e dois cães foram enviados a Brumadinho, no mês de setembro do mesmo ano. O responsável pelo canil do CBMMS em Campo Grande, sargento Thiago Kalunga, explica que existe um Conselho dos Corpos de Bombeiros do Brasil todo, que são representados pelos comandantes gerais, e dentro deles comitês específicos.

“Um dos comitês é o de busca, resgate e salvamento com cães, onde estão os bombeiros especialistas em buscas que mantém os cães dentro de um padrão de certificação e treinamento. Quando têm tragédias como essa que ocorreu em Brumadinho, esse comitê é acionado e eles já sabem em quais estados existem cães para ajudar”, explica Kalunga.

Ainda segundo o sargento, dependendo do alto nível de complexidade da ocorrência, como foi em Brumadinho, após certo tempo o trabalho de resgate é apenas de corpos, já que não há mais chance de que as vítimas sejam encontradas com vida. “Com auxílio de cães, esse trabalho é feito muito mais rápido”, detalha.

Corpos de Bombeiros de estados que possuíam cães de resgate foram acionados para missão. (Foto: Arquivo Pessoal)

De Mato Grosso do Sul partiram três militares e dois cães, que atuaram no período total de 30 dias em Brumadinho, divididos em um período de 15 dias, intervalo do mesmo período, e buscas de mais 15 dias. Um deles foi o binômio – como é chamada a dupla bombeiro e cão – do 2º sargento Luciclei da Silva Lima e da cadela Cindy. Além dele, o tenente coronel Fábio Pereira de Lima atuou junto ao cão Duke. A equipe também era formada pelo sargento Wilson Rogério de Souza Monteiro. Todos iniciaram a missão no dia 27 de setembro de 2019.

70% das vítimas eram encontradas por indicação dos cães

O sargento Luciclei explica que, no primeiro momento, o Corpo de Bombeiros de Minas Gerais organizou as equipes disponíveis no Brasil e as separou em datas, uma vez que não era possível as cidades ao entorno de Brumadinho receberam tantos militares de uma só vez. A equipe de MS ficou com o período dos meses de setembro e outubro.

“Semanas depois do início das buscas, perceberam que 70% dos corpos que eram encontrados eram por indicação canina. Mas chega um tempo em que o trabalho é bem árduo para os condutores e para os cães, então Minas organizou uma escala com os cães que tinham certificação a nível de Brasil”, explica o sargento.

Apesar da certificação e dos treinamentos para atuação em situações reais, o sargento lembra da diferença entre o ambiente e clima da região, para MS. “O ambiente era novo para eles [cães], tinha muita lama, tinham contato com metais pesados, então eles tinham que fazer uma adaptação, por isso as buscas foram divididas em duas etapas”, relata.

Cindy (e Duke) realizavam banho de descontaminação ao término de todos os dias de busca. (Foto: Arquivo Pessoal)

Entre as diferenças também está o clima de Minas Gerais, já que, para os cães, a identificação é feita pelo odor. “Treinamos para trabalhar na nossa realidade do cerrado, mas lá [em Brumadinho] o clima é seco, quente, e o ambiente é extremamente úmido. E aqui em MS não estamos acostumados com situações de ocorrências envolvendo escombros e lama”, afirma o sargento.

Após uma semana, Cindy e Duke já haviam se acostumado com o ambiente. Assim, fizeram a indicação de três locais onde foram encontrados corpos e pelo menos outros 10 que seriam escavados com ajuda de maquinários. Entretanto, o sargento explica que no dia 5 de maio de 2022, Cindy se aposentou.

Militares de todo o Brasil foram divididos em escalas para atuarem nas buscas. (Foto: Arquivo Pessoal)

“Quando a Cindy fez 10 anos, em 2022, ela se aposentou. Geralmente os cães de resgate trabalham até oito anos, até 10, caso estejam saudáveis, mas quando ela chegou aos oito, apesar de estar bem, preferi não levar mais em buscas. Para ela tudo é uma brincadeira, então ela continua treinando e fazendo atividades sociais, como visita a hospitais”, explica o sargento.

O tenente coronel Fábio Pereira de Lima explica que a indicação dos locais é feita com os cães, mas é necessário fazer a escavação pelas outras equipes. “Tanto a cadela Cindy como o cão Duke indicaram uma possível localização de vítima na região do Remanso 4, rasquearam e latiram. Em seguida, veio a máquina retroescavadeira, retirou os rejeitos de minério que estavam amontoados, e cerca de 3 a 5 metros de profundidade conseguiram localizar uma vítima com corpo inteiro”, relembra.

O tenente coronel ainda explica que diversas indicações eram feitas pelos cães em locais onde parte dos corpos eram encontrados, já que a maioria das vítimas não estava intacta. Em seguida, a perícia do IML (Instituto Médico Legal) fazia a identificação do corpo, e se era de uma pessoa que já estava no banco de DNA coletado de outro fragmento anteriormente.

Recentemente, no ano passado, o sargento Luciclei afirma ter recebido a confirmação de que mais uma das vítimas encontradas havia sido em um local que Cindy tinha indicado. “Fiz contato com o Corpo de Bombeiros de Minas e pedi indicação geográfica de onde o corpo havia sido encontrado. E era realmente um dos locais onde ela [Cindy] estava insistindo na indicação”, lembra.

Uma das vítimas foi encontrada a cerca de 5 metros de profundidade nos escombros. (Foto: Arquivo Pessoal)

Assim como Cindy, Duke também se aposentou no ano passado, com 10 anos de idade. “O Duke deu sua contribuição nas buscas de Brumadinho e cumpriu sua missão. Agora, está descansando em casa e mora comido. Ele está muito bem de saúde, vivendo como um pet normal em casa”, afirma o tenente coronel.

Por fim, o tenente coronel Fábio afirma que, apesar de ser um trabalho intenso, os militares se emocionam por ter encontrado as vítimas nos escombros. “Para nós o sentimento é de que conseguimos contribuir para amenizar o sofrimento de algumas famílias dessa tragédia que emocionou não só o Brasil como o mundo”, finaliza.