Mulheres cuidam de túmulos o ano todo e há quem durma em cemitério na véspera de Finados
Dupla atende cerca de 35 clientes há mais de 25 anos no Cemitério Santo Antônio
Karina Campos –
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Renda extra nos dias que antecedem Finados, celebrado na próxima quarta-feira (2), é realidade para vendedores ambulantes e até para quem faz bicos de limpeza em túmulos e deixa tudo arrumado para a celebração. Mas você sabia que em Campo Grande há mulheres contratadas de forma fixa para cuidar de túmulos nos 12 meses do ano? O Jornal Midiamax conversou com elas e encontrou até quem, sem nenhum medo de espíritos ou fantasmas, já dormiu no cemitério após horas intensas de trabalho.
A reportagem foi no Cemitério Santo Antônio, em Campo Grande, em um dos dias mais quentes do mês, fazia em torno de 34°C, sem nenhuma nuvem no céu que amenizasse ou ajudasse com uma ligeira sombra.
Foi ali, com um carrinho de mão, baldes, vassoura e produtos de limpeza, que encontramos Luzinete Freira de Oliveira, de 53 anos, equipada com um chapéu de crochê, duas camisetas de manga longa e protetor solar.
Renda fixa
Ela trabalha com limpeza de túmulos e capelas há 25 anos. Atualmente atende 35 jazigos, dependendo do tamanho, os pequenos de R$ 30 a R$ 60 e os maiores de R$ 80 a R$ 100 por mês e por cada túmulo. O serviço é diário, ela conta que não para até ver o brilho do mármore.
“Todos os dias limpo as lápides, deixo bonitinho, cuido. Hoje tem esse de uma filha que está em Brasília, pediu para ver como estava hoje. A família se muda, mas não deixa de cuidar, já que não pode visitar sempre, mantém limpo e cuidado, é um zelo à distância”.
Luzinete coleciona histórias desses anos que apenas um local inusitado resulta. Outro ponto notado é que nem mesmo um calor escaldante a desanima de parar minutos para contar parte dessas experiências.
O trabalho é tanto que ela já dormiu no cemitério
“Teve uma época que trazia meus filhos para me ajudar, hoje não pode mais. Ele me trazia balde com água, agiliza e ia mais rápido. Teve tempo que vândalos começaram a matar os cachorros envenenados aqui, porque eles latiam quando alguém pulava o muro para furtar”.
Questionada se já viu coisa ou se tem medo de estar um lugar misticamente tenebroso, ela diz que até dormir no local já teve de tanto trabalho diário. Em outros dias que passa do horário, tem que ser ‘expulsa’ pelos coveiros e a administração.
“Teve dia que tinha tanto, mais tanto serviço que eu dormi aqui, o pessoal da administração, que já conhece a gente, tem que falar ‘mulher, vai para casa’. Porque eu sou assim, gosto de terminar o máximo de limpeza que der no dia. Medo a gente tem de quem está vivo e faz maldade, medo de ficar sem dinheiro, sem ter o que comer”.
Mais de 25 anos de trabalho no cemitério
Sobre os extras que movimentam essa semana, Luzinete parou, prefere descansar e trabalhar no limite que o corpo fala. Pode até pegar um ou dois novos clientes, mas não se desgasta como já fez há alguns anos.
“Hoje eu estou com 53 anos, não tenho mais idade para pegar serviço forte, a coluna não aguenta. Fico só com os clientes fixos, não pego mais extra como fazia em dia de finados. Eu tenho muito orgulho do que faço, com o dinheiro de limpar aqui eu criei meu filho, que hoje está um ‘homão’ forte e saudável”.
Já quando notamos Claudia Medeiros de Lima, a primeira expressão era de braveza, limpava uma lápide de mármore grande. Se aproximando, ela já descarregou: “Hoje estamos trabalhando dobrado, o pessoal da prefeitura está limpando deixam tudo para última hora”.
Dia de Finados
De fato, uma grande equipe municipal fazia os reparos para Dia dos Finados, cortando grama e limpando os muros. Nisso, a poeira levantava e sujava as lápides que acabavam de ser limpas por Cláudia. Mas, segundos depois, a figura brava se desarma e ela abre um sorriso.
“A gente tem que limpar de novo, porque se a família vem visitar e encontra sujo vai falar muito e ficamos com fama de descuidada. Tenho uns 35 clientes fixos, pego os extra nesse período, aumenta muito. No mês pego uns R$ 1,5 a R$ 2 mil nesse mês”.
Claudia diz que, embora comum, não há concorrência por limpar jazigos, levando em conta o número de pessoas conhecidas que já trabalham lá e a quantidade de túmulos. “Eu estou aqui desde 2005, comprei minha casa com o meu trabalho aqui”, relembra.
O serviço de limpar lápides é antigo, crianças costumavam ir vender flores e fazer uma renda, o que é atualmente proibido por lei, inclusive, rende fiscalização contra o trabalho infantil.
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