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Não, a frase acima não é um erro de digitação. É exatamente esta frase com as letras embaralhadas. Uma forma simples de tentar colocar você, pessoa alfabetizada, no lugar daquelas que não sabem ler, nem escrever. Em 1967, a Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) estabeleceu a data 8 de setembro como Dia Mundial da Alfabetização. Cinco décadas depois, ainda há pessoas no Brasil incapazes de escrever o próprio nome.

A PNA (Política Nacional de Alfabetização), publicada pelo em 2019, define alfabetização, com base na ciência cognitiva da leitura, como o ensino das habilidades de leitura e de escrita em um sistema alfabético, que é aquele que representa com os caracteres do alfabeto (letras) os sons da fala.

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Plano Nacional de Educação pretende zerar a taxa de analfabetismo até 2024. Foto: Marcello Casal Jr./Agência Brasil

Em Mato Grosso do Sul, 106 mil pessoas acima de 15 anos são analfabetas, de acordo com a mais recente divulgação da Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua), de 2019. Há debates sobre qual seria a idade ideal para a alfabetização e por quais métodos a codificação e interpretação deveriam ser ensinadas. As pessoas que têm oportunidade de acesso à educação são apresentadas a esse processo logo nos primeiros anos de escola.

Com a pandemia de Covid-19, que forçou a sociedade a se adaptar a novas rotinas, as crianças que estavam sendo alfabetizadas em sala de aula precisaram continuar o aprendizado em casa, trocando o auxílio de educadores pelo suporte dos responsáveis. Esse movimento ergueu barreiras no ensino e as consequências ainda estão sendo mensuradas.

De acordo com um estudo, encomendado ao Datafolha pela Fundação Lemann, o Itaú Social e o BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), no Brasil, 88% dos estudantes matriculados no 1º, 2º e 3º ano do ensino fundamental estão em processo de alfabetização. Desse total, 51% das crianças ficaram no mesmo estágio de aprendizado, ou seja, não aprenderam nada de novo (29%), ou desaprenderam o que já sabiam (22%).

Em Campo Grande

A pedagoga de Campo Grande Vanessa Jamile, especializada em Educação Infantil, ressalta que a alfabetização é um processo lento e individual, mas que precisa de interatividade. “A criança necessita de interação para que a alfabetização aconteça de forma contínua e determinante”, afirma. Ela conta que durante a pandemia conhecidos a procuraram para pedir ajuda com os filhos, pois estavam com dificuldades de auxiliar no aprendizado.

É o caso da manicure Jaqueline Mendes Viegas Bezerra, mãe de uma menina de 8 anos que atualmente está no 2ª ano do ensino fundamental em uma escola da Reme (Rede Municipal de Ensino), no bairro Mata do Jacinto. Ela relata que antes da pandemia, sua filha conseguia escrever o próprio nome, mas não dominava a escrita, nem a leitura. “Ano passado foi bem complicado porque, apesar de ter a pandemia, eu continuei trabalhando. A escola passava as atividades, tinha vídeo das aulas, mas era bem difícil a gente conseguir fazer todas essas aulas, todos os dias, como se estivesse na escola”, conta.

Por conta dessa dificuldade, ela e o esposo, o analista de sistemas Carlos Cezar Bezerra, contrataram a pedagoga Vanessa Jamile para aulas semanais. Posteriormente, eles também procuraram suporte com uma psicopedagoga. “A gente recorreu a essa ajuda para ela poder aprender porque estava ficando muito difícil. A gente não tem experiência nessa parte, então foi o que levou a gente a levar ela para o reforço [com a pedagoga] e depois para a psicopedagoga. Ela é bem esforçada também, ela queria aprender”, relata Jaqueline.

Após cerca de nove meses de aulas com as profissionais, a filha de Jaqueline e Carlos voltou, em julho deste ano, a frequentar aulas presenciais de sua escola, de forma escalonada. “Hoje, ela está na 2ª série, já sabe ler, escrever, está fazendo letra cursiva já. Na escola, eles estão passando as atividades e, na verdade, eu não sei como estão as outras crianças, mas a minha eu sei que ela já consegue ler bem, sabe escrever, então para ela essa ajuda foi muito boa”, afirma a manicure. Agora, a família está na expectativa do retorno das aulas sem escalonamento. “Se pudesse voltar ao normal, todos os dias, para a gente seria muito bom”, completa.

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Imagem ilustrativa. Foto: Arquivo/AgênciaBrasil

Se a filha de 8 anos da manicure já sabia escrever algumas palavras antes da pandemia, o filho da servidora pública estadual Jacqueline Romero ainda estava sendo apresentado às letras e aos números. O garoto, de 4 anos, estuda em um CEI (Centro de Educação Infantil) no Parque dos Poderes e também passou a assistir às aulas em casa. 

No entanto, devido à pouca idade, a mãe encontrava dificuldades em manter a atenção do filho caçula nos conteúdos escolares. “Ele ficou 1 ano e 5 meses fora da sala, retornou agora em agosto. As professoras gravavam vídeos e jogavam no grupo de whats. Os pais colocavam para o filho assistir e fazer o caderno de atividades que a escola fornecia junto com lápis, massinha e giz. Era muito difícil prender a atenção dele, então eu exigia bem pouco pra ele não estressar”, conta a servidora pública.

De acordo com a mãe, o afastamento da escola afetou o aprendizado do garoto. “É inevitável a comparação com o meu filho mais velho que, na idade dele, já lia e escrevia muita coisa. Ele ainda não lê nada e escreve muito pouco. A minha maior dificuldade era conciliar o meu trabalho e ajudar no aprendizado deles que ficavam em casa. Além de não ter a dinâmica e o domínio de um professor, faltava paciência pra dar conta de tudo”, detalha Jacqueline. 

Mesmo com um mês de retorno presencial ao CEI, ela já consegue enxergar não só uma evolução na alfabetização do filho, mas também uma melhora no humor. “Ele já aprendeu a escrever palavras novas, já reconhece o alfabeto todo, aprendeu a contar além do 20. Está menos ansioso e menos irritado”, conta.

Defasagem

A pedagoga Vanessa Jamile afirma que os educadores fizeram o que estava ao alcance para auxiliar os alunos durante a pandemia, mas que consequências negativas desse período são visíveis. “Foi feito tudo que foi possível, porém vamos colher alguns frutos amargos. A defasagem será real e visível durante alguns anos, mas como pedagoga teremos que lutar para que seja sanada nos próximos anos”, pontua.

A defasagem citada pela pedagoga é percebida diariamente por pais, responsáveis e educadores, mas dados concretos do efeito da pandemia de Covid-19 na alfabetização, não só na infância, mas na vida adulta, serão evidenciados nos próximos estudos e pesquisas que abordarem a temática.