Aldeias urbanas: a difícil missão de viver na Capital e manter a cultura
A vinda dos indígenas para Campo Grande tem se intensificado cada vez mais nos últimos. À procura de emprego e educação, os indígenas formam comunidades na periferia da cidade, muitas vezes ao ocupar terrenos públicos. Atualmente, já existem quase 12 mil indígenas na Capital, de sete etnias diferentes.
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A vinda dos indígenas para Campo Grande tem se intensificado cada vez mais nos últimos. À procura de emprego e educação, os indígenas formam comunidades na periferia da cidade, muitas vezes ao ocupar terrenos públicos. Atualmente, já existem quase 12 mil indígenas na Capital, de sete etnias diferentes.
Na década de 90 surgiu o que ficou conhecida como a primeira aldeia urbana do Brasil, a Marçal de Souza. Desde então, comunidades indígenas se espalharam pela Capital e já formam nove aldeias urbanas. O membro da Coordenadoria Regional da Funai (Fundação Nacional do Índio) em Campo Grande, Jorge Neves, explica que agrupamentos de indígenas em aldeias facilita a convivência na área urbana. “Juntos é mais fácil dividir uma inserção tão complicada para eles, que é viver na cidade. A maioria morava de aluguel e, sem condições para pagar, eles entram em uma área pública”.
Um dos fundadores da Marçal de Souza, Alcides de Souza tem 66 anos e conta que participou da ocupação da comunidade, há quase 23 anos. A vinda da Aldeinha, em Anastácio – a 134 km da Capital – foi motivada pela procura de emprego, mas a desunião entre a comunidade veio como consequência. “Na aldeia nossa é diferente, o povo é unido. Aqui, fica um de cada partido e ninguém se entende. Desse jeito a gente não consegue nada”.
A busca pelo emprego e estudo é a principal justificativa entre os moradores, mas a expectativa nem sempre corresponde à realidade. Cleisi Victor mora na Marçal de Souza e veio para a Capital há seis anos, mas logo conheceu o marido e teve dois filhos. Para ela, a vida na cidade não é fácil e sonha conseguir voltar para a aldeia Cachoeirinha, em Miranda – a 204 km de Campo Grande. “Lá é um paraíso, não tem a correria que é aqui. Aqui a gente tem que pagar água, luz, não pode nem pegar uma laranja do pé, tudo tem que comprar”. Diferente de Cleisi, a sobrinha Elimara Sebastião realizou o sonho de ingressar no curso técnico de Enfermagem. Ela conta que os pais conseguem pagar a mensalidade com dificuldades e que assim que terminar, também pretende para sua aldeia em Miranda.
A indigenista Rebecca Albino, da Coordenadoria Regional da Funai, explica que as condições de vida na Marçal de Souza são melhores do que as outras aldeias porque foi a única ocupação institucionalizada, que teve apoio para a construção das casas. Segundo Rebecca, as ocupações têm tido êxito de permanecer nos locais ocupados porque o município não consegue suprir o crescimento da cidade e o êxodo rural. “Eles conseguem ficar no local, mas vivem em condições precárias. Assim como outros brasileiros de baixa renda, eles saem da aldeia sem completar o ensino médio ou até o fundamental”.
Donaldo Fernandes, de 43 anos, é cacique da Vila Romana, a aldeia urbana mais recente na Capital. Guarani, ele lidera uma comunidade formada majoritariamente por terenas e se emociona ao contar das dificuldades para manter sua cultura viva. “Nossos antepassados já morreram, mas a história tem que ficar. Muitos já nem tem mais a nossa cultura, mas vamos fazer o possível para nos mantermos unidos”. Na Vila Romana, a maioria da comunidade trabalha em um frigorífico próximo e ganha um salário mínimo, fato que orgulha o cacique. “Aqui todo mundo trabalha, graças a deus a tendência é melhorar. Temos fossa, temos banheiro e até um ponto de ônibus aqui”. Próximo dali, na aldeia Santa Mônica, os moradores também trabalham em fábricas, como o frigorífico e uma fábrica de refrigerantes. Hilário Jorge, vice-cacique da aldeia, considera que a vida na cidade trouxe progresso pois muitos filhos de moradores conseguiram ingressar na faculdade.
Para o cacique da Vila Romana reclama que, por estar na cidade, muitas vezes não é mais considerado indígena. Sem conseguir atendimento em órgãos específicos, ele enfrenta problemas no atendimento médico. Donaldo calcula que precisa percorrer quase 7 km para encontrar um pediatra para seus três filhos. Segundo a indigenista Rebecca, a urbanização traz um conflito de identidade. “Ele vem para a cidade e não deixa de ser indígena, mas a partir do momento que ele sai da aldeia, ele perde o atendimento de responsabilidade federal e se torna um cidadão do município”, explica.
O Jornal Midiamax visitou quatro aldeias urbanas da Capital e constatou a disparidade de opiniões entre os indígenas. Enquanto alguns se declaram felizes com o emprego conquistado, outros se frustram com a falta de oportunidade para realizar o sonho da formação acadêmica e a desunião entre os povos. “Eu só não volto porque não tenho casa lá na aldeia, é da minha mãe”, diz Cleisi. O terena Rodson Mariano, de 27 anos, mora na Vila Bordon e se frustra por estar há 3 meses desempregado, mas acredita que voltar para a aldeia rural não é uma solução. “É muito difícil como indígena arranjar trabalho, mas é só aqui que tem serviço”, lamenta.
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